Como se afunda um iate "inafundável"? Da ancoragem ao verylight: cinco questões sem resposta

29 ago, 22:07
Naufrágio do veleiro Bayesian, do bilionário Mike Lynch (Photo by Jonathan Brady/PA Images via Getty Images)

A bordo do iate de luxo seguiam 22 pessoas, dez dos quais tripulantes. Entre os passageiros encontrava-se o magnata britânico especialista em segurança cibernética e com ligações estreitas a metade dos serviços secretos do planeta, Myke Lynch. A sua morte em circunstâncias suspeitas está a levantar várias questões sobre o que aconteceu naquela noite de temporal repentino

Na noite de 19 de agosto, os relâmpagos, o vento forte e a ondulação abrupta levaram os pescadores de Porticello, na Sicília, Itália, a não sair para o mar. O Bayesian estava ancorado na baía e por lá ficou até ao naufrágio que matou o magnata britânico Mike Lynch e outras seis pessoas. “O veleiro chegou antes do anoitecer e atracou a cerca de 300 metros da entrada da marina”, explicou um pescador que estava no local. E isto leva-nos à primeira de cinco dúvidas sobre o que aconteceu naquela noite.

A primeira questão: o local de ancoragem

O jornal espanhol El Mundo, que ordenou cronologicamente as dúvidas que pairam sobre o caso, diz que a primeira questão prende-se precisamente com a ancoragem: por que motivo o capitão James Cutfield não procurou um local mais seguro para ancorar perante a intempérie que se aproximava?

Em declarações após o naufrágio, Cutfield disse que o temporal “não estava previsto", tal como corroborou Raffaele Macauda, ​​comandante da Guarda Costeira italiana, que garantiu que “não tinha havido nenhum tipo de alerta”. Contudo, Dudi Coletti, um comandante veterano, disse que “há vários dias que os capitães locais comunicavam entre si para que estivessem atentos a fenómenos meteorológicos violentos e repentinos”.

E foi o que acabou por acontecer. O sistema de rastreamento marítimo AIS - responsável pela ligação dos instrumentos a bordo das embarcações com as estações costeiras - calculou que passaram apenas 16 minutos entre a chegada da tromba de água e o momento em que o iate desapareceu na água. 

A segunda questão: porque não houve nenhum alarme?

A segunda dúvida prende-se com o francês Matthew Griffiths, de 22 anos, o tripulante que alegadamente estava de plantão: porque não fez soar o alarme nem acordou os passageiros do iate?

Quinze passageiros sobreviveram, mas sete morreram - o magnata britânico Mike Lynch e a filha Hannah; o presidente da Morgan Stanley International, Jonatthan Bloomer, e a sua mulher, Elizabeth Judith; o advogado norte-americano Chris Morvillo e a companheira Neda, designer de joias; e ainda Recaldo Thomas, o chef de cozinha. O iate de luxo estava registado em nome da mulher de Lynch, Angela Maria Bacares, mas é o magnata quem está no centro da tese de sabotagem.

Lynch foi conselheiro de Ciência e Tecnologia do primeiro-ministro David Cameron e era considerado o Bill Gates britânico. Era especialista em defesa cibernética e tinha várias relações de proximidade com serviços de inteligência de quase todo o mundo. Assemelhando-se a um enredo de um filme de ação, houve prontamente a teoria de que haveria alguém por detrás do naufrágio. Ainda assim, os investigadores acreditam que não.

A terceira questão: porque só há um membro da tripulação entre as vítimas mortais?

Outro dos factos vistos com estranheza foi que os membros da tripulação - dez, no total -, à exceção do chef de cozinha, escaparam praticamente ilesos. Eram “jovens, preparados e ágeis”, alega a defesa.

No entanto Hannah, filha de Lynch, também era jovem, tinha apenas 18 anos e foi uma das vítimas mortais. Os investigadores entendem que “talvez” a defesa possa ter razão, mas deixam a dúvida no ar.

A quarta questão: como entrou a água no iate considerado "inafundável"?

Em 2018, o construtor deste iate de luxo, Perini Navi, classificou-o como “inafundável”. Os especialistas ouvidos entendem que realmente seria inafundável “se tudo estivesse fechado e não houvesse qualquer fissura ou rasgo na estrutura”. Stephen Edwards, comandante do Bayesian antes de Cutfield, explica que “é preciso ter em conta o ângulo de alagamento”, querendo com isto dizer “o grau de inclinação a partir do qual a água pode começar a entrar e colocar em risco a estabilidade do iate”.

No caso deste iate de luxo, esse ângulo estará entre os 40 e os 45 graus, o que não é muito, de acordo com Edwards. “Nesse ângulo, se as entradas de ar não estiverem fechadas (o que não é desejável), a água começará a entrar, geralmente pela casa das máquinas”, descreve o ex-comandante do Bayesian, que considera que o iate não luxo “não era tão inanfundável”.

A quinta questão: porque demorou o disparo do verylight de emergência?

A última dúvida prende-se com a sinalização de pedido de auxílio: porque foi o verylight de emergência disparado somente às 04:16, quando a embarcação já se havia afundado na totalidade?

Mario Scopesi, advogado do engenheiro-chefe da tripulação, Parker Eaton, também não tem resposta: “Serão necessárias investigações técnicas significativas para reconstruir este complexo naufrágio.”

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