Miguel Sousa Tavares criticou a postura adotada por José Sócrates no primeiro dia de julgamento da Operação Marquês, defendendo que "arrastou ainda mais gente contra si"
No dia em que começou o julgamento da Operação Marquês, 11 anos após a detenção de José Sócrates, Miguel Sousa Tavares não poupou críticas à forma como o antigo primeiro-ministro se apresentou em tribunal e fora dele. Em declarações no Jornal Nacional da TVI (do mesmo grupo da CNN Portugal), o comentador considerou a postura do arguido “um erro estratégico absoluto”.
“O animal feroz entrou a pés juntos e é o mínimo que se pode dizer. Não é normal ver um arguido, no primeiro dia, falar três vezes aos jornalistas. Fala mais que o próprio advogado”, afirmou Sousa Tavares. “Não sei se isso não complica a defesa. Para mim, só prejudica, porque indispõe o tribunal e a opinião pública contra ele.”
O antigo chefe de governo apresentou incidentes de recusa contra a juíza e o procurador do Ministério Público, gesto que o comentador diz nunca ter visto antes. “Atirou-se a toda a gente. Disse que a juíza era parcial, que era autoritária. Agora vai ser julgado. A hora é do tribunal e aquilo que há a fazer é dentro da sala, não cá fora.”
Para Miguel Sousa Tavares, a atuação de Sócrates acaba por isolar ainda mais o antigo governante num julgamento que considera estar “muito baseado na opinião pública, que está largamente contra ele”. E acrescenta: “Hoje ainda arrastou mais gente contra si. Sinceramente, não percebo esta estratégia. Não faz sentido.”
Apesar das duras palavras dirigidas a José Sócrates, Sousa Tavares não deixa de apontar fragilidades ao Ministério Público. O comentador refere que leu “as milhares de páginas do processo” e sublinha que “o grande problema do Ministério Público é que não tem uma única prova de corrupção”. “Não há um documento, uma escuta telefónica, um testemunho direto. Só presunções e suposições”, afirma.
No espaço de comentário 5.ª Coluna citou mesmo uma frase retirada de um acórdão da Relação: "Quem cabritos vende e cabras não tem, de algum lado lhe vem”. Isto para ilustrar o raciocínio do Ministério Público. “Há vários problemas neste juízo de valor. O primeiro é este: quem cabritos vende. Ou seja, assumem que o dinheiro é de Sócrates. Mas essa é a primeira presunção que está por provar.”
Ainda assim, Miguel Sousa Tavares considera frágeis as justificações apresentadas pelo antigo primeiro-ministro para o seu nível de vida. “As explicações que dá, do avô, da mãe, do dinheiro debaixo do colchão, são ridículas e patéticas.”
Na sua leitura, o Ministério Público optou desde o início por uma única via: “Sócrates é corrupto, o dinheiro na Suíça é dele.” Mas, acrescenta, “talvez tivesse feito sentido investigar por que razão o amigo lhe emprestava tanto dinheiro. O que é que Sócrates tinha sobre ele? Seria só amizade? Se tivessem seguido essa lógica, talvez hoje estivéssemos noutro ponto.”