O Ano Novo Lunar é a maior festividade da China. Pelo terceiro ano consecutivo, a maior migração anual de humanos no planeta será adiada

CNN , Nectar Gan e Steve George
29 jan 2022, 16:00
As autoridades locais chinesas impõem rigorosas restrições para evitar as punições no caso de não conseguirem conter o número de casos. Foto: VCG/VCG via Getty Images

O Ano Novo Lunar, que acontece a 1 de fevereiro este ano, é a época mais importante para as famílias chinesas se reunirem. Centenas de milhões de pessoas costumam viajar nesta altura, sendo a maior migração anual de seres humanos do planeta

Mais de dois anos passaram desde que a China isolou uma cidade inteira com mais de 11 milhões de habitantes para controlar o primeiro surto mundial de covid-19.

Mas em muitas zonas do país, duras restrições devido ao coronavírus continuam a dificultar as viagens das pessoas, a poucos dias da maior festividade do ano.

Domingo fez dois anos que Wuhan iniciou o primeiro confinamento, uma medida drástica que atordoou o país dois dias antes do Ano Novo Lunar.

Um centro comercial em Wuhan decorado para celebrar a chegada do Ano do Tigre. Foto: Getty Images

Desde então, a China recuperou da inicial devastação provocada pela pandemia, enquanto a política irredutível de zero covid em Pequim, que se baseia na testagem maciça, em quarentenas alargadas e confinamentos súbitos, tem colhido um amplo apoio da opinião pública.

Mas com a perspetiva de mais um Ano Novo Lunar com viagens canceladas, cresce a frustração entre as pessoas.

Conhecido como Festival da Primavera na China, o Ano Novo Lunar, que acontece a 1 de fevereiro este ano, é a época mais importante para as famílias se reunirem, comparada por alguns ao Natal, ao Dia de Ação de Graças e ao Ano Novo juntos.

Todos os anos, centenas de milhões de pessoas, que deixaram as suas cidades de origem em busca de uma vida melhor para as cidades de crescimento rápido, entram em comboios, autocarros e aviões para visitar a família, uma viagem de semanas, conhecida por ser a maior migração anual de seres humanos do planeta.

Este ano, o Ministério dos Transportes chinês espera que sejam efetuadas 1,18 mil milhões de viagens durante a época de viagens do Ano Novo Lunar, um aumento de 35% em relação ao ano passado, mas que continua muito abaixo dos três mil milhões de viagens efetuadas em 2019, antes da pandemia.

E por toda a China, uma crescente lista de autoridades locais está a desaconselhar os habitantes a viajarem para controlar a disseminação do coronavírus, especialmente da variante Ómicron, muito contagiosa.

Centenas de milhões de pessoas costumam viajar na China durante esta altura do ano. Foto: Stringer/Anadolu Agency via Getty Images

Protestos devido a restrições locais

Na semana passada, um funcionário da província central de Henan provocou protestos ao ameaçar deter viajantes de regresso.

Num vídeo viral, Dong Hong, chefe da região de Dancheng, foi ouvido a declarar numa reunião que "qualquer pessoa que regresse de áreas de risco médio ou elevado fará quarentena e depois será detida."

Entre uma chuva de críticas, Dong disse posteriormente que se referia apenas a pessoas que não obedeçam às políticas de prevenção locais e que "de forma maliciosa regressem a casa." Mas muitos questionaram como poderia o desejo de reunião com os familiares ser considerado um ato malicioso.

"É errado um trabalhador migrante, que trabalha dia e noite, que vive longe de casa, regressar à sua cidade e reunir-se com a família durante os únicos poucos dias que tem para a festividade anual?" Perguntava uma publicação muito divulgada no Weibo, a plataforma equivalente ao Twitter-da China. "Todos podemos entender a gravidade da (covid) situação, e podemos cumprir as regras de prevenção e controlo, mas devíamos também poder realizar os nossos desejos de ir a casa no Ano Novo Lunar."

À medida que os protestos subiam de tom, até os meios de comunicação estatais intervieram. "É da natureza humana desejar regressar a casa para se reunir com a família durante o Festival da Primavera, portanto, onde está a malícia?" O porta-voz oficial do Partido Comunista, o People's Daily, declarou numa publicação numa rede social no sábado.

O Ano Novo Lunar é a maior festividade chinesa, comparando-se ao Natal no Ocidente. Foto: Jiang Keqing/VCG via Getty Images

Num comentário na sexta-feira, o canal de televisão estatal CCTV acusou as autoridades locais de "deliberadamente criarem obstáculos e dificuldades às pessoas que queiram regressar a casa," acrescentado que muitas estavam "a ignorar os requisitos da prevenção científica e controlo da pandemia e a adotar uma abordagem genérica."

Para poderem entrar em comboios, voos, autocarros e passar em postos da autoestrada, os viajantes na China têm de ser portadores de um código de saúde verde no telemóvel a indicar que não estiverem recentemente em zonas com infeções por covid. Mas as autoridades locais, muitas vezes, impõem os seus próprios requisitos, impedindo as pessoas de regressarem ou submetendo-as a quarentenas longas, mesmo que o código de saúde esteja verde.

Na semana passada, uma trabalhadora da metrópole do sul Shenzhen viajou num comboio que a levaria a casa na província Guangxi quando as autoridades locais da sua cidade lhe disseram à chegada que teria de passar uma semana num hotel em quarentena, seguida de uma semana de isolamento em casa, segundo a imprensa estatal chinesa.

Não desejando passar as festividades em isolamento com o custo de 2100 yuan (cerca de 330 dólares) pela quarentena no hotel, a mulher saiu do comboio e comprou um bilhete no comboio seguinte de volta a Shenzhen.

 
Viajantes com máscara esperam na sala principal da estação ferroviária de Hongqiao em Xangai antes do dia de Ano Novo Lunar, a 23 de janeiro de 2022.

Os surtos de covid na China

As rigorosas restrições locais advêm em parte das tremendas pressões políticas às autoridades locais para evitar surtos de covid, muitas vezes sob a ameaça de duras punições se falharem. Com o Ano Novo Lunar e os Jogos Olímpicos de Inverno à porta, essa pressão intensificou-se.

Mesa de acreditação no aeroporto de Pequim para os Jogos Olímpicos de Inverno, que começam no dia 4 de fevereiro. Foto: Jae C. Hong/AP

Nas últimas semanas, a China tem-se debatido com uma torrente de surtos de covid, desde um surto da variante Delta na cidade de Xi'na, no noroeste, a um surto da variante Ómicron na cidade portuária de Tianjin, no nordeste. A dada altura, mais de 20 milhões de habitantes em três cidades chinesas estavam em confinamento total, impedidos de sair de casa.

Na segunda-feira, as autoridades de Xi'an anunciaram que a cidade começa a suavizar o isolamento, que confinou os seus 13 milhões de habitantes nas suas casas durante um mês. As rigorosas medidas provocaram falta de alimentos e recusa de cuidados médicos a doentes em estado crítico, provocando a revolta generalizada entre os habitantes.

Pequim, que deverá receber os Jogos Olímpicos de Inverno de 2022 a partir de 4 de fevereiro, reportou 43 casos de covid desde 15 de janeiro. Incluem seis infeções por Ómicron, que as autoridades atribuíram a correio do Canadá, e alguns casos de infeção pela variante Delta na zona sudoeste de Fengtai, que se espalharam para duas províncias vizinhas.

No domingo, Fengtai lançou uma campanha maciça de testagem, com o objetivo de recolher amostras dos seus dois milhões de habitantes num dia.

A capital chinesa aconselhou os residentes a não viajarem para casa para as festas, tal como Xangai e outras grandes cidades, onde grande parte da população vem do campo ou de cidades mais pequenas.

Militares chineses numa acção para decorar as ruas de Jiunquan, na província chinesa de Gansu. Foto: Hou Chonghui/VCG via Getty Images

Em Dongguan, um polo industrial do sul que alberga quase sete milhões de trabalhadores migrantes, o governo declarou que daria 500 milhões de yuan (cerca de 80 milhões de dólares) a empregados não autóctones que ficassem na cidade no Ano Novo Lunar, recebendo cada pessoa um vale digital de 500 yuan, segundo anunciou a imprensa estatal local.

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