Fenómeno está diretamente relacionado com a passagem de superfícies frontais frias e com a ascensão de massas de ar muito húmido
Portugal registou mais de 47 mil raios nas últimas 24 horas - um total que inclui o número de raios que atingiram o mar e parte de Espanha. O fenómeno surpreendeu por tratar-se de um evento “com algum grau de excepcionalidade em termos de atividade elétrica”, explica à CNN Portugal Pedro Sousa, meteorologista do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA).
“Estamos a falar de dezenas de milhares de descargas [elétricas] em menos de 24 horas, ou seja, um valor muito elevado”, sublinha.
Por raios entende-se todo o tipo de descargas elétricas - positivas ou negativas - entre nuvens, dentro de uma só nuvem (intranuvem) ou entre a nuvem e o solo, esclarece o especialista. “No fundo, é uma corrente elétrica e pode ser dividida em descargas do tipo positivo ou negativo, conforme a polarização que há entre esta corrente elétrica.”
O que distingue ambas as descargas é precisamente o sentido da corrente elétrica, acrescenta o diretor do Departamento de Meteorologia e Geofísica do IPMA, Victor Prior. “Depende de se a terra está carregada negativamente e a nuvem positivamente ou vice-versa”, aponta. Perante uma carga positiva proveniente do solo e uma nuvem carregada negativamente, por exemplo, o resultado será “uma descarga negativa”.
Um raio forma-se dentro de nuvens de grande desenvolvimento vertical, que receberam o apelido de "cumulonimbus", indica o diretor. “Dentro dessas nuvens estão associados movimentos verticais muito intensos em que o ar se desloca na vertical, ocorrendo uma separação de cargas positivas e negativas”, continua. É no momento em que essas cargas se juntam que surge uma descarga elétrica. “No fundo é um ar incandescente que tem uma expansão rápida e que cria uma onda de choque formando o trovão”, conclui.
Segundo o instituto, o fenómeno está diretamente relacionado com a passagem de superfícies frontais frias e com a ascensão de massas de ar muito húmido, “resultante de movimentos convectivos que ocorrem por efeito orográfico ou que ocorrem sobre as superfícies terrestres aquecidas pela intensa radiação solar". Já o número elevado de descargas elétricas é fruto do movimento lento do sistema frontal, que, “se fosse mais rápido, não teria produzido este registo de raios”, acrescenta o diretor do departamento de Meteorologia e Geofísica.
A partir dos efeitos que cada descarga produz, também se podem estabelecer diferenças entre os raios. Pedro Sousa esclarece que “as descargas entre as nuvens são raios entre elas que causam bastante aparato visual, mas não têm impacto direto na superfície”, ao contrário das descargas nuvem-solo que podem atingir “estruturas, bens ou pessoas, com uma corrente elétrica que, obviamente, é mortal”.
Em relação ao risco de incêndio, o meteorologista garante que não é preocupante num evento como este, com muita precipitação, mas “se isto acontecesse em pleno verão, um número de descargas como este iria originar muitos incêndios”.
O mau tempo colocou 17 distritos em Portugal sob aviso laranja na madrugada de quarta-feira, excluindo Bragança que estava sob aviso amarelo.
De acordo com o oficial de operações da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC), José Costa, citado pela agência Lusa, registaram-se 784 ocorrências entre as 00:00 e as 12:00 desta quarta-feira relacionadas com a chuva e vento fortes.