Ficámos todos mais esquecidos durante a pandemia. Saiba como pode melhorar

CNN , Madeline Holcombe
12 fev 2022, 09:30
Esquecimento

Nos últimos dois anos tem tido dificuldade em lembrar-se das datas, dos detalhes e das tarefas? Não é só consigo, dizem os especialistas.

“Não é uma questão de preguiça ou de perder a acuidade. Como estamos a passar por uma fase pandémica nos últimos dois anos, isso faz com que se torne mais difícil para os nossos cérebros criar e relembrar memórias”, disse Amir-Homayoun Javadi, professor de Psicologia e Neurociências Cognitivas na Universidade Kent, Reino Unido.

"Temos tendência a habituarmo-nos às situações", disse Javadi, que é, igualmente, diretor executivo do sistema de gestão de aprendizagem “Active-Class”. "A situação que vivemos nos últimos dois anos levou-nos a não fazer muito, nem a planear.”

“Nesta fase, se nos acostumarmos demasiado a este estilo de vida, isso pode causar danos cognitivos, perturbações na memória e problemas em manter a atenção.”

“Ao contrário do que se possa imaginar, captar uma memória não é como tirar uma fotografia. Muitas vezes, esta pode ser influenciada pelo contexto da situação”, disse Michael Yassa, professor de Neurobiologia, ao correspondente médico da CNN Sanjay Gupta, no “podcast Chasing Life”.

“Viver numa fase pandémica torna mais difícil a criação de uma memória. Torna-se ainda pior quando precisamos dela e queremos relembrá-la”, disse Yassa, diretor do Centro de Neurobiologia da Aprendizagem e Memória da Universidade da Califórnia, Irvine.

Yassa disse: "Por vezes, somos demasiado exigentes connosco próprios. Pensamos: “Como pude esquecer-me? Deveria ser natural para mim memorizar isto.” “Afinal, verificou-se que aconteceu algo durante a codificação. Isso fez com que, de início, fosse quase impossível guardar essa lembrança.”

"Se não conseguimos dormir bem, se estamos enervados ou se pensamos em muitas coisas ao mesmo tempo, é mais provável que estejamos pouco atentos. Mais tarde, atribuímos essa desatenção a algum tipo de esquecimento.”

“Para as pessoas que tiveram covid-19 ou mesmo para as que não tiveram, viver numa fase pandémica pode inibir a memória. No entanto, essa situação pode ser alterada se se aplicar algumas mudanças em casa”, disse Rudy Tanzi, professor de Neurologia na Faculdade de Medicina, em Harvard e diretor da Unidade de Pesquisa em Genética e Envelhecimento do Hospital Geral de Massachusetts.

Um vírus pode tornar a sua memória mais lenta

“Mesmo sem a névoa mental que surge por ter apanhado o vírus, o facto de os dias serem parecidos, a falta de interação social e a diminuição do exercício físico podem dificultar a criação de memórias”, disse Javadi.

O confinamento ou o facto de não participar nas suas atividades pré-pandémicas faz com que cada dia pareça igual. Essa rotina tira-nos o suporte que nos ajuda a organizar as nossas memórias.

Javadi sugeriu uma ida ao cinema. “Se fizer planos para ir ver um filme no sábado que anseia ver, esse acontecimento quebrará a rotina dos seus dias. Vai lembrar-se que a reunião stressante aconteceu antes do filme ou recordará que a conversa engraçada que teve com seu irmão aconteceu depois disso.”

“Mas quando é mais difícil sair de casa – inclusive, há muitas pessoas que nem saem de casa para trabalhar - não há forma de diferenciar os dias da semana dos fins de semana. Assim, o cérebro tem menos acontecimentos que sirvam para orientar as memórias”, disse Javadi.

“Digamos que, depois de ter ido ao cinema no sábado, combinou almoçar com um amigo no dia seguinte. Esse encontro social de domingo dar-lhe-ia a oportunidade de falar sobre o filme e expressar a sua opinião e as suas reações acerca do filme. Falaria, de igual modo, de alguma situação da sua semana que o levou a isso. Essa repetição de informações é importante para ajudar o seu cérebro a consolidar esses acontecimentos”, afirma Javadi.

Ele acrescentou: “Infelizmente, a pandemia limitou a nossa capacidade de nos reunirmos, nos últimos anos, de forma segura, com os nossos entes queridos. Essa prática de partilha e de repetição tornou-se muito menos frequente.”

Como reparar a sua memória

Tanzi disse: “Se as interrupções da sua memória se devem ao vírus, à monotonia ou ao stresse, estas podem ser tratadas com algumas mudanças simples no seu estilo de vida.”

O professor de Neurologia resume como deve manter o seu cérebro saudável: dormir, lidar com o stresse, interagir socialmente, fazer exercício, aprender coisas novas e a alimentação.

“Dormir bem, fazer exercício durante pelo menos 20 minutos por dia, manter uma alimentação saudável e fazer a gestão do stresse com técnicas de relaxamento ou meditação são importantes para manter a circulação sanguínea e os níveis baixos de inflamação no cérebro”, disse Tanzi.

“Mesmo que não tenha tido covid, nem apresente névoa mental, se praticar estes conceitos, isso vai ajudar a diminuir a inflamação caso apanhe o vírus.”

Tanzi acrescenta: “Caso tenha névoa mental, pode ser útil deixar de consumir drogas recreativas e bebidas alcoólicas. Com estas medidas, pode reduzir a inflamação, que poderia piorar.”

“Pode ser tentador amenizar o stresse ou a rotina diária, mas é importante tentar manter as interações sociais e aprender coisas novas, tais como: ler um livro novo, aprender alguma coisa ou até mesmo andar apenas pelo seu bairro e reparar em algo a que nunca tinha prestado atenção”, disse Tanzi.

Javadi disse: “Embora isto sirva para manter o seu cérebro ocupado, também pode criar esses apoios de que a sua memória precisa.” Ele recomendou, igualmente, que deve programar coisas que anseia fazer e deve estabelecer limites entre o trabalho e o tempo de lazer, em especial para quem trabalha em casa.

Tanzi disse: “Para aqueles que lutam contra a névoa mental provocada pela covid-19, é normal que este sintoma persista por vários meses após a infecção. Contudo, se isto se mantiver após um ano, deve falar com um neurologista, de forma a perceber se se passa mais alguma coisa.”

“Perguntas sobre a forma como o vírus afetou o cérebro podem continuar a ser investigadas nas próximas décadas”, disse Tanzi.

Saúde Mental

Mais Saúde Mental

Patrocinados