Encontro resulta de um grande esforço diplomático. Vai decorrer sob a ameaça de um ataque do Irão
Negociações de alto risco regressam esta semana. Eis principais obstáculos para um cessar-fogo em Gaza
por Nic Robertson, Becky Anderson e Mostafa Salem, CNN (Abbas Al Lawati também contribuiu para este artigo)
Os mediadores nas negociações para um acordo de cessar-fogo entre o Hamas e Israel estão a fazer um último esforço para reativar as conversações enquanto o Médio Oriente se prepara para um ataque iraniano contra Israel.
A reunião de alto risco marcada para esta quinta-feira terá o Catar, o Egito e os Estados Unidos a apresentar um plano para implementar um acordo de cessar-fogo e libertação de reféns. O acordo foi proposto pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, em maio - mas diferenças não resolvidas sobre as exigências de última hora do primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu e uma escalada militar iminente ameaçam descarrilar todo o processo.
Israel vai enviar uma delegação para estas negociações e o Hamas indicou que ainda está interessado em alcançar um acordo, no entanto, esta terça-feira o grupo alertou que não tenciona participar mais nas negociações: “A nossa posição era clara... não iremos para novas rondas de negociação. Iremos apenas implementar o que foi acordado”, disse Basem Naim, um membro do comité político do Hamas à CNN.
Aqui está o que sabemos até agora sobre o ponto em que estão estas negociações.
Em que consiste a proposta de Joe Biden?
Em maio, Joe Biden anunciou uma proposta de três fases que, segundo o governo norte-americano, foi apresentada por Israel. Esta proposta combinaria a libertação de reféns de Gaza com um "cessar-fogo total e completo" e a libertação de prisioneiros palestinianos que se encontram em Israel.
A primeira fase duraria seis semanas e incluiria a “retirada das forças israelitas de todas as áreas povoadas de Gaza” e a “libertação de vários reféns, incluindo mulheres, idosos e feridos em troca da libertação de centenas de prisioneiros palestinianos” e a implementação de uma trégua temporária.
A segunda fase permitiria a “troca pela libertação de todos os restantes reféns vivos, incluindo soldados do sexo masculino” e o fim permanente dos combates.
Já a terceira e última fase baseia-se num “grande plano de reconstrução para Gaza” e implicaria que “quaisquer restos mortais dos reféns que foram mortos seriam devolvidos às suas famílias”, como disse o presidente norte-americano.
Não está claro, porém, quantos dos reféns seriam libertados ainda com vida.
Quais são os principais pontos de discórdia na proposta de Biden?
Apesar da reação positiva inicial do Hamas e de Israel, ambos os lados não conseguiram chegar a um acordo sobre a implementação dos detalhes mais subtis desta proposta, incluindo a sequência da troca de reféns e prisioneiros, o número de prisioneiros palestinianos a serem libertados e até onde as forças israelitas se deveriam retirar de Gaza.
Benjamin Netanyahu foi acusado de minar o acordo, já que os membros de extrema-direita da sua coligação governante ameaçam derrubar o governo, apesar da pressão dos EUA e das famílias dos reféns para que haja uma libertação.
Antes de uma reunião em Roma, que decorreu no mês passado, uma fonte familiarizada com as negociações disse que o primeiro-ministro israelita apresentaria exigências de última hora, pedindo um mecanismo para impedir que homens armados entrem no norte de Gaza pela zona sul do enclave, e o controlo israelita contínuo do Corredor Philadelphi, uma faixa de território na fronteira entre Gaza e Egito.
Um funcionário do governo dos EUA, em declarações aos jornalistas esta semana, disse que "a maior parte do trabalho" foi feito para se conseguir delinear este acordo, mas é improvável que seja assinado na reunião desta quinta-feira, já que ambos os lados ainda têm posições díspares sobre "quatro ou cinco questões".
Um diplomata familiarizado com as negociações disse à CNN que os pontos de discórdia que ainda existem para o Hamas são as restrições de Israel à movimentação de pessoas do norte para o sul de Gaza, a sua exigência de veto sobre a libertação de prisioneiros palestinianos, bem como a sua presença contínua no Corredor Philadelphie na passagem da fronteira de Rafah com o Egito.
O diplomata falou sob condição de anonimato devido à sensibilidade do assunto.
O gabinete de Netanyahu rejeitou, esta terça-feira, as alegações de que o primeiro-ministro israelita tinha mudado de posição, vincando que a sua postura mais recente "não introduz condições extras e certamente não contradiz ou enfraquece" a sua proposta de maio. O gabinete de Netanyahu acusou o Hamas de adicionar exigências irrealistas à sua posição.
Porque é que as negociações estagnaram?
As autoridades norte-americanas envolvidas neste processo dizem que as negociações atingiram uma fase avançada até que o líder político do Hamas, Ismail Haniyeh, foi assassinado em Teerão, no final de julho, numa explosão que o Irão atribuiu a Israel. Israel não confirmou nem negou a responsabilidade, mas o Irão jurou vingança.
À conta disso, surgem preocupações de que o assassinato possa atrapalhar as negociações entre Israel e o Hamas. O grupo militante substituiu Haniyeh por Yahya Sinwar, o líder de uma ala mais dura do Hamas, que é um dos homens mais procurados por Israel. Enquanto Haniyeh, visto como algo moderado, vivia no Catar e era suscetível à pressão do seu país anfitrião, acredita-se que Sinwar esteja no subsolo, num túnel em Gaza, e seja difícil de alcançar.
“Haniyeh foi útil ao falar com aqueles que estão em Gaza. Ele tinha o respeito daqueles [que estão] no local”, revelou outra fonte diplomática à CNN. “O argumento do Hamas continua a ser que Benjamin Netanyahu quer que esta guerra continue. Ele não está interessado nem num cessar-fogo, nem na retirada total das tropas [de Gaza]”.
Porque é que as conversas desta quinta-feira são tão importantes?
As negociações de cessar-fogo desta quinta-feira são o resultado de um grande esforço diplomático dos mediadores Catar, Egito e EUA para pressionar uma última tentativa para acabar com a guerra e libertar os reféns, ao mesmo tempo que o Irão se prepara para atacar Israel.
A urgência das negociações foi destacada pelos três mediadores, que emitiram uma rara declaração conjunta na semana passada, convocando as partes em guerra a retornarem às conversações e a ofereceram o que chamaram de “proposta de ponte final” para superar os pontos de atrito que ainda existem. Os detalhes dessa proposta não foram tornados públicos.
Paralelamente, diplomatas dos EUA e do Médio Oriente mobilizam-se para dissuadir o Irão de lançar um ataque a Israel, ataque que poderia levar a uma guerra regional mais ampla. Tanto o Irão quanto os EUA disseram que as linhas de comunicação entre ambos estão abertas por meio de intermediários.
Houve algumas indicações de que o Irão pode abandonar os planos de atacar Israel se um acordo de cessar-fogo for alcançado. Mas a missão do país nas Nações Unidas disse, no sábado, que a retaliação de Teerão é "totalmente alheia ao cessar-fogo de Gaza".
A segunda fonte que falou com a CNN lançou também dúvidas sobre as conversas de quinta-feira terem algum impacto na decisão do Irão. “As conversas de cessar-fogo não vão impedir o Irão de retaliar pela morte de Haniyeh”.
A primeira fonte ecoou esse mesmo sentimento, dizendo à CNN que há preocupação na região de que o Irão não hesite em atacar Israel, já que acredita que o governo Biden não está a fazer pressão suficiente sobre Netanyahu para Israel chegar a um acordo.
A falta de clareza sobre se o primeiro-ministro israelita vai aderir à proposta de Biden feita em maio, acrescentou a fonte, sugere que o tempo está a esgotar-se para se chegar a um acordo antes de um ataque iraniano. O Catar e o Egito, disse a fonte, podem não ter influência suficiente para pressionar o Hamas a chegar a um acordo.