Os "quatro ou cinco" riscos da reunião sensível desta quinta-feira para tentar um cessar-fogo em Gaza

CNN , Nic Robertson, Becky Anderson e Mostafa Salem
14 ago, 14:16
Militante do Hamas junto de uma fotografia de Ismail Haniyeh

Encontro resulta de um grande esforço diplomático. Vai decorrer sob a ameaça de um ataque do Irão

Negociações de alto risco regressam esta semana. Eis principais obstáculos para um cessar-fogo em Gaza

por Nic Robertson, Becky Anderson e Mostafa Salem, CNN (Abbas Al Lawati também contribuiu para este artigo)


Os mediadores nas negociações para um acordo de cessar-fogo entre o Hamas e Israel estão a fazer um último esforço para reativar as conversações enquanto o Médio Oriente se prepara para um ataque iraniano contra Israel.

A reunião de alto risco marcada para esta quinta-feira terá o Catar, o Egito e os Estados Unidos a apresentar um plano para implementar um acordo de cessar-fogo e libertação de reféns. O acordo foi proposto pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, em maio - mas diferenças não resolvidas sobre as exigências de última hora do primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu e uma escalada militar iminente ameaçam descarrilar todo o processo.

Israel vai enviar uma delegação para estas negociações e o Hamas indicou que ainda está interessado em alcançar um acordo, no entanto, esta terça-feira o grupo alertou que não tenciona participar mais nas negociações: “A nossa posição era clara... não iremos para novas rondas de negociação. Iremos apenas implementar o que foi acordado”, disse Basem Naim, um membro do comité político do Hamas à CNN.

Aqui está o que sabemos até agora sobre o ponto em que estão estas negociações.

Em que consiste a proposta de Joe Biden?

Em maio, Joe Biden anunciou uma proposta de três fases que, segundo o governo norte-americano, foi apresentada por Israel. Esta proposta combinaria a libertação de reféns de Gaza com um "cessar-fogo total e completo" e a libertação de prisioneiros palestinianos que se encontram em Israel.

A primeira fase duraria seis semanas e incluiria a “retirada das forças israelitas de todas as áreas povoadas de Gaza” e a “libertação de vários reféns, incluindo mulheres, idosos e feridos em troca da libertação de centenas de prisioneiros palestinianos” e a implementação de uma trégua temporária.

A segunda fase permitiria a “troca pela libertação de todos os restantes reféns vivos, incluindo soldados do sexo masculino” e o fim permanente dos combates.

Já a terceira e última fase baseia-se num “grande plano de reconstrução para Gaza” e implicaria que “quaisquer restos mortais dos reféns que foram mortos seriam devolvidos às suas famílias”, como disse o presidente norte-americano.

Não está claro, porém, quantos dos reféns seriam libertados ainda com vida.

Quais são os principais pontos de discórdia na proposta de Biden?

Apesar da reação positiva inicial do Hamas e de Israel, ambos os lados não conseguiram chegar a um acordo sobre a implementação dos detalhes mais subtis desta proposta, incluindo a sequência da troca de reféns e prisioneiros, o número de prisioneiros palestinianos a serem libertados e até onde as forças israelitas se deveriam retirar de Gaza.

Benjamin Netanyahu foi acusado de minar o acordo, já que os membros de extrema-direita da sua coligação governante ameaçam derrubar o governo, apesar da pressão dos EUA e das famílias dos reféns para que haja uma libertação.

Antes de uma reunião em Roma, que decorreu no mês passado, uma fonte familiarizada com as negociações disse que o primeiro-ministro israelita apresentaria exigências de última hora, pedindo um mecanismo para impedir que homens armados entrem no norte de Gaza pela zona sul do enclave, e o controlo israelita contínuo do Corredor Philadelphi, uma faixa de território na fronteira entre Gaza e Egito.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou em maio uma proposta de cessar-fogo em Gaza entre Israel e o Hamas (Associated Press)

Um funcionário do governo dos EUA, em declarações aos jornalistas esta semana, disse que "a maior parte do trabalho" foi feito para se conseguir delinear este acordo, mas é improvável que seja assinado na reunião desta quinta-feira, já que ambos os lados ainda têm posições díspares sobre "quatro ou cinco questões".

Um diplomata familiarizado com as negociações disse à CNN que os pontos de discórdia que ainda existem para o Hamas são as restrições de Israel à movimentação de pessoas do norte para o sul de Gaza, a sua exigência de veto sobre a libertação de prisioneiros palestinianos, bem como a sua presença contínua no Corredor Philadelphie na passagem da fronteira de Rafah com o Egito.

O diplomata falou sob condição de anonimato devido à sensibilidade do assunto.

O gabinete de Netanyahu rejeitou, esta terça-feira, as alegações de que o primeiro-ministro israelita tinha mudado de posição, vincando que a sua postura mais recente "não introduz condições extras e certamente não contradiz ou enfraquece" a sua proposta de maio. O gabinete de Netanyahu acusou o Hamas de adicionar exigências irrealistas à sua posição.

Porque é que as negociações estagnaram?

As autoridades norte-americanas envolvidas neste processo dizem que as negociações atingiram uma fase avançada até que o líder político do Hamas, Ismail Haniyeh, foi assassinado em Teerão, no final de julho, numa explosão que o Irão atribuiu a Israel. Israel não confirmou nem negou a responsabilidade, mas o Irão jurou vingança.

À conta disso, surgem preocupações de que o assassinato possa atrapalhar as negociações entre Israel e o Hamas. O grupo militante substituiu Haniyeh por Yahya Sinwar, o líder de uma ala mais dura do Hamas, que é um dos homens mais procurados por Israel. Enquanto Haniyeh, visto como algo moderado, vivia no Catar e era suscetível à pressão do seu país anfitrião, acredita-se que Sinwar esteja no subsolo, num túnel em Gaza, e seja difícil de alcançar.

“Haniyeh foi útil ao falar com aqueles que estão em Gaza. Ele tinha o respeito daqueles [que estão] no local”, revelou outra fonte diplomática à CNN. “O argumento do Hamas continua a ser que Benjamin Netanyahu quer que esta guerra continue. Ele não está interessado nem num cessar-fogo, nem na retirada total das tropas [de Gaza]”.

Porque é que as conversas desta quinta-feira são tão importantes?

As negociações de cessar-fogo desta quinta-feira são o resultado de um grande esforço diplomático dos mediadores Catar, Egito e EUA para pressionar uma última tentativa para acabar com a guerra e libertar os reféns, ao mesmo tempo que o Irão se prepara para atacar Israel.

A urgência das negociações foi destacada pelos três mediadores, que emitiram uma rara declaração conjunta na semana passada, convocando as partes em guerra a retornarem às conversações e a ofereceram o que chamaram de “proposta de ponte final” para superar os pontos de atrito que ainda existem. Os detalhes dessa proposta não foram tornados públicos.

Uma escola em al-Zahra, usada como refúgio por dezenas de palestinianos, foi atacada este fim de semana. Mais de 90 pessoas perderam a vida (Associated Press)

Paralelamente, diplomatas dos EUA e do Médio Oriente mobilizam-se para dissuadir o Irão de lançar um ataque a Israel, ataque que poderia levar a uma guerra regional mais ampla. Tanto o Irão quanto os EUA disseram que as linhas de comunicação entre ambos estão abertas por meio de intermediários.

Houve algumas indicações de que o Irão pode abandonar os planos de atacar Israel se um acordo de cessar-fogo for alcançado. Mas a missão do país nas Nações Unidas disse, no sábado, que a retaliação de Teerão é "totalmente alheia ao cessar-fogo de Gaza".

A segunda fonte que falou com a CNN lançou também dúvidas sobre as conversas de quinta-feira terem algum impacto na decisão do Irão. “As conversas de cessar-fogo não vão impedir o Irão de retaliar pela morte de Haniyeh”.

A primeira fonte ecoou esse mesmo sentimento, dizendo à CNN que há preocupação na região de que o Irão não hesite em atacar Israel, já que acredita que o governo Biden não está a fazer pressão suficiente sobre Netanyahu para Israel chegar a um acordo.

A falta de clareza sobre se o primeiro-ministro israelita vai aderir à proposta de Biden feita em maio, acrescentou a fonte, sugere que o tempo está a esgotar-se para se chegar a um acordo antes de um ataque iraniano. O Catar e o Egito, disse a fonte, podem não ter influência suficiente para pressionar o Hamas a chegar a um acordo.

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