"Precisamos de mais formação para tratar os doentes mais graves": médicos alertam para riscos na saúde oral dos portugueses

8 dez 2024, 11:31

Jovens médicos e internos de Estomatologia querem mais um ano de formação especializada

As faculdades de Medicina não estão a dar a formação necessária para responder às necessidades dos doentes com cancro e outras doenças graves da boca. O alerta é dos próprios médicos em formação e graduados em estomatologia nos últimos anos. “O programa de internato em Estomatologia remonta a 1997. É mais velho do que eu e do que as doenças cada vez mais complexas que temos de tratar agora”, queixa-se Francisco Gouveia, interno da especialidade.

A Ordem dos Médicos remeteu ao Ministério da Saúde, em setembro, a proposta de um novo programa de formação para a Estomatologia, depois de vários anos de discussão interna, que envolveu dezenas de especialistas. As grandes novidades são a extensão do período de formação especializada para cinco anos e o reforço da preparação médica e cirúrgica dos internos. “Nós entendemos que os atuais quatro anos não são suficientes para suprir uma área tão vasta de conhecimentos e de práticas que precisamos adquirir para depois sermos bons especialistas”, defende José Ferreira, assistente hospitalar há quatro anos.

A saúde oral e dentária é apenas um dos ramos da Estomatologia. A especialidade deve responder, nos hospitais públicos, a uma gama extensa de patologias, algumas delas de complexidade extrema: cancro oral, sexto mais prevalente em todo o mundo; malformações dos dentes, face e maxilares; doenças das glândulas salivares; traumas em toda essa região resultantes de acidentes. “Nós abordamos tudo o que seja patologia do pescoço para cima e do nariz para baixo, digamos assim”, simplifica Francisco Gouveia.

Um plano seis anos em bolandas

A Administração Central do Sistema de Saúde informa que aguarda o parecer do Conselho Nacional do Internato Médico (CNIM) para tomar uma decisão, mas já sabe que há pedras na engrenagem. “O CNIM já procedeu à análise dessa proposta, em finais de novembro, estando nesta altura a preparar a emissão do respetivo parecer. De acordo com a informação de que dispomos, a proposta de programa suscitou algumas questões que deverão ser clarificadas pela Ordem dos Médicos”, esclarece André Trindade, presidente da ACSS, em resposta escrita à CNN Portugal.

O sonho dos jovens médicos é que a reforma entre em vigor a tempo do próximo internato, que arranca em janeiro. Por isso, desesperam com a perspetiva de mais um ano de atraso na reforma do plano de estudos. “Neste momento estamos neste entrave entre instituições. O que pedimos é que o processo não seja moroso, para garantir que os cuidados saúde aos portugueses não são prejudicados”, apela Gonçalo Coutinho, presidente da Associação dos Médicos Estomatologistas Portugueses.

Os internos e jovens médicos relataram à nossa reportagem que chegam a fazer estágios de formação no estrangeiro, a expensas próprias, para suprir as lacunas do plano de internato da especialidade. “Um plano de formação com 27 anos acaba sempre por ser limitativo. Aumenta muito as dificuldades dos internos e os próprios centros formadores se queixam disso”, descreve José Coutinho, vogas do Colégio da Especialidade Estomatologia da Ordem dos Médicos. Para ele, o atraso na resolução do problema “transparece um desinvestimento na saúde oral hospitalar dos portugueses”.

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