Novos riscos de medicamentos para alívio da congestão nasal levam a revisão europeia. Notificadas 86 reações adversas em Portugal

20 mar 2023, 09:00
Descongestionantes (Pexels)

O Comité de Avaliação de Riscos de Farmacovigilância (PRAC) da Agência Europeia do Medicamento (EMA) deu início a uma revisão de medicamentos que contêm pseudoefedrina. Por cá, diz o Infarmed, foram notificadas 86 reações adversas, mas nenhuma delas ligada aos novos riscos que levaram à revisão europeia

Um conjunto de medicamentos com pseudoefedrina, composto destinado ao alívio da congestão nasal em casos de gripe, alergia, rinite ou sinusite, está a ser revisto pela Agência Europeia do Medicamento (EMA) devido a “preocupações sobre o risco de síndrome de encefalopatia reversível posterior (PRES) e síndrome de vasoconstrição cerebral reversível (RCVS)”.

Na lista, há fármacos à venda em Portugal e o Infarmed revela a notificação de 86 reações adversas, mas nenhuma delas destes eventos isquémicos que levaram o Comité de Avaliação de Riscos de Farmacovigilância (PRAC) da EMA a dar início a uma revisão dos medicamentos.

Entretanto, a Agência Reguladora de Medicamentos e Produtos de Saúde do Reino Unido, que já não está sob a tutela da EMA, emitiu um comunicado a informar que está a rever “as evidências relacionadas com o risco muito raro” destas duas condições cardiovasculares e cerebrovasculares “associado a medicamentos contendo pseudoefedrina”.

A CNN Portugal sabe que o Infarmed está a aguardar o parecer do regulador europeu, antes de tomar qualquer decisão. “Todos os medicamentos contendo pseudoefedrina estão a ser alvo de avaliação na Agência Europeia de Medicamentos através deste procedimento de arbitragem. Nesse sentido, e porque a colaboração é uma constante entre as autoridades europeias do medicamento, o INFARMED, como Estado Membro participante na EMA, é parte desta arbitragem cujos resultados aguarda para promover a respetiva implementação”, diz a Autoridade Nacional do Medicamento numa resposta por escrito.

De acordo com a EMA, as recomendações do PRAC após esta revisão serão então enviadas ao Comité dos Medicamentos para Uso Humano (CHMP), que emitirá um parecer. Depois disso, cabe à Comissão Europeia tomar uma decisão jurídica vinculativa aplicável em todos os Estados-Membros da União Europeia sobre o uso dos medicamentos em causa.

Se o regulador europeu emitir um alerta sobre os riscos, podem acontecer “vários níveis de intervenção” por parte do Infarmed, explica José Aranda Silva, antigo bastonário da Ordem dos Farmacêuticos e atualmente vice-presidente do Conselho Geral da Universidade de Évora.

Embora acredite que o regulador português “irá aguardar” por uma decisão da agência europeia, um dos cenários em cima da mesa é “alterar o folheto informativo para alertar para os efeitos, fazer um alerta público”, mas o Infarmed pode também “limitar a utilização” dos fármacos em causa, explica o antigo bastonário. O passo mais drástico, mas que José Aranda Silva não crê que vá acontecer, é “retirar do mercado” os medicamentos.

86 reações adversas notificadas 

A pseudoefedrina, que pode ser usada de forma isolada ou combinada com outras substâncias ativas, funciona como estímulo para as terminações nervosas para que seja libertada a noradrenalina química, que faz com que os vasos sanguíneos se contraiam. É normalmente usada em descongestionantes nasais ou fármacos para aliviar sintomas de gripe, alergias e rinite, quando há congestão nasal.

O INFARMED recebeu a notificação de “86 casos de suspeita de reações adversas a medicamentos (RAM) associada a medicamentos contendo pseudoefedrina”. José Aranda Silva diz que não é de agora que “há muitas reservas na sua utilização”.

Diz o organismo que as dez reações adversas a medicamentos “mais notificadas” no Portal RAM relativamente ao uso de fármacos com pseudoefedrina “são de prurido, rash [irritação da pele], sonolência, vómitos, vertigens, eritema, rash máculo-papular [exantema maculopapular], dor abdominal superior, mau estar e dor de cabeça”. Numa resposta enviada por escrito à CNN Portugal, o organismo diz que, no entanto, “estas reações são já conhecidas para os medicamentos contendo pseudoefedrina”.

A decisão do regulador europeu deve-se a “preocupações sobre o risco de síndrome de encefalopatia reversível posterior (PRES) e síndrome de vasoconstrição cerebral reversível (RCVS)” que foram associadas à toma de medicamentos para o congestionamento nasal com este composto. “Condições que afetam os vasos sanguíneos no cérebro”, lê-se no site do organismo.

“Medicamentos que contêm pseudoefedrina têm um risco conhecido de eventos isquémicos cardiovasculares e cerebrovasculares”, incluindo acidente vascular cerebral e ataque cardíaco, devido à suspensão da circulação de sangue para o cérebro, diz a EMA, que assegura que “restrições e advertências já estão incluídas nas informações do produto dos medicamentos para reduzir esses riscos”.

Um recente estudo, apresentado no ano passado na conferência de Primavera da Faculdade Americana de Cardiologia e da Sociedade Coreana de Cardiologia em Gyeongju, indicou que os anti-histamínicos constringem o fluxo sanguíneo, tal como outros medicamentos para alergias de venda livre, como os que contêm pseudoefedrina”. “Esses fármacos contraem os vasos sanguíneos não só no nariz, mas também no resto do corpo, o que pode levar a uma tensão arterial elevada e a um aumento do ritmo cardíaco”, explicou Raj Dasgupta, professor assistente de Medicina Clínica na Keck School of Medicine da Universidade do Sul da Califórnia e um dos autores do estudo.

Já no ano passado, a Ordem dos Farmacêuticos alertou que os descongestionantes nasais pseudoefedrina “administrados por via oral, fenilefrina e pseudoefedrina, têm um início de ação mais lento e apresentam um maior risco de efeitos adversos sistémicos”. Dor de cabeça, náusea e convulsões são os sintomas comuns e que devem servir de alerta após a toma destes fármacos descongestionantes, comercializados sob a forma de xarope, granulado ou comprimido.

EMA coloca na lista 13 fármacos à venda em Portugal

Apesar de ter sido notificado “um pequeno número de casos” destas condições após o uso destes fármacos descongestionantes, a EMA emitiu ainda uma notificação com 50 páginas onde detalha quais os medicamentos com pseudoefedrina que estão agora sob revisão. 

A lista inclui 13 que se comercializam em Portugal, sendo que três deles já não se encontram à venda no país, segundo a base de dados InfoMed, do INFARMED. São eles:

Nos medicamentos da lista acima, nenhum é sob a forma de spray nasal descongestionante e a pseudoefedrina nunca é o único composto do fármaco, está associada, por exemplo, a ácido acetilsalicílico, loratadina e triprolidina (ambos da família de anti-histamínicos antagonizando os receptores H₁), ibuprofeno (anti-inflamatório não esteróide), paracetamol (analgésico e antipirético).

Na lista emitida pela EMA há dois de uma farmacêutica portuguesa, a Hikma Farmacêutica, que vende na Eslováquia os xaropes Trifed e Trifed Expectorant.

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