A confirmar-se a dissolução do Parlamento, o segundo mandato de Marcelo Rebelo de Sousa fica marcado por três dissoluções. “Está a ser vítima de si próprio, da sua conduta passada”, assumem politólogos ouvidos pela CNN Portugal
Marcelo Rebelo de Sousa vai ficar conhecido como o “campeão das dissoluções” do Parlamento, uma vez que “não tem agora grande alternativa” senão “avançar para eleições”, pela terceira vez no mesmo mandato, segundo politólogos ouvidos pela CNN Portugal.
“É pena”, lamenta o politólogo André Azevedo Alves, que lembra como inicialmente Marcelo Rebelo de Sousa “apresentava a estabilidade como a sua prioridade”. Agora, o Presidente da República fica “marcado como o campeão das dissoluções e o campeão da instabilidade” no país, descreve o politólogo.
A confirmar-se este vaticínio, tendo em conta a rejeição da moção de confiança apresentada pelo Governo, o segundo mandato de Marcelo Rebelo de Sousa fica marcado por três dissoluções do Parlamento (e, consequentemente, três eleições legislativas) - a primeira em dezembro de 2021, na sequência do chumbo do Orçamento do Estado para 2022, então proposto pelo Governo de António Costa; e a segunda em novembro de 2023, quando aceitou o pedido de demissão de António Costa, na sequência da investigação judicial em curso no âmbito da Operação Influencer.
Nesta segunda ocasião, Marcelo Rebelo de Sousa adiantou que resolveu dissolver a Assembleia da República “por decisão própria”, depois de ter ouvido os partidos, que, garantiu foram “claramente favoráveis” à dissolução, e de ter convocado o Conselho de Estado, onde foi verificado um “empate” nesse sentido entre os conselheiros.
Na altura, o PS tinha maioria absoluta na Assembleia da República, o que terá motivado esse empate no Conselho de Estado, segundo o politólogo José Filipe Pinto. Desta vez, a AD tem uma “maioria muito relativa”, pelo que, “provavelmente”, o Conselho de Estado “vai pronunciar-se no sentido de haver dissolução da Assembleia da República e convocação de eleições antecipadas”, sugere José Filipe Pinto, admitindo que essa decisão possa não ser unânime.
“Face a isto, Marcelo Rebelo Sousa, que é um constitucionalista, não pode desautorizar sistematicamente o Conselho de Estado. Já sucedeu uma vez, não vai voltar a suceder”, conclui o politólogo José Filipe Pinto, que se referia à última vez em que uma decisão deste género foi tomada. Em 2023, e apesar de contar com maioria à direita, o Presidente da República foi surpreendido por Miguel Albuquerque, que se colocou contra a dissolução da Assembleia da República. O resultado final foi 8-8, mas o chefe de Estado avançou para o que pretendia.
É neste contexto que André Azevedo Alves considera que Marcelo Rebelo de Sousa “está a ser vítima de si próprio, da sua conduta passada”, apontando que o Presidente da República “não tem grande alternativa” senão dissolver o Parlamento, “pela doutrina que o próprio estabeleceu”, optando pela chamada “bomba atómica” naquelas duas ocasiões.
Além disso, acrescenta André Azevedo Alves, “Marcelo Rebelo de Sousa não tem, neste momento, poder de influência praticamente nenhum, também por culpa própria”, tendo em conta “a forma como conduziu o exercício dos poderes presidenciais e pelo relacionamento - ou falta dele - com os líderes partidários, etc.,”.
Depois de oito anos de coabitação com António Costa - que recordou recentemente com a frase “éramos felizes e não sabíamos” - é sabido que o Presidente da República não está satisfeito com a relação “institucional” com Luís Montenegro, chegando a apelar, em público, para que ambos trabalhem em “cooperação estratégica”.
A alternativa à chamada ‘bomba atómica’ seria pedir ao PSD que indique outro nome para liderar o Governo, mas José Filipe Pinto acredita que essa não será uma opção. “Luís Montenegro tem uma legitimidade interna que fará com que o partido volte a apostar nele”, sublinha o politólogo, lembrando as demonstrações de apoio ao primeiro-ministro por parte dos ministros e dos sociais-democratas em comentários televisivos e no Parlamento.
Na perspetiva de José Filipe Pinto, o Presidente poderia mesmo ser “penalizado” caso optasse por essa alternativa. “Temos vindo a perceber, principalmente desde o caso das gémeas, que Marcelo Rebelo de Sousa tem vindo a perder protagonismo. Marcelo Rebelo Sousa é alguém que convive muito mal com esta quebra de popularidade”, sustenta o politólogo.
Neste contexto, José Filipe Pinto acredita que o Presidente da República vai anunciar aquilo que já todos sabemos: “Que, não sendo do interesse do país, a convocação de eleições é uma inevitabilidade.”