Marcelo escolhe a estabilidade, apesar de "divergência de fundo" com Costa

4 mai 2023, 20:10

Numa declaração aos portugueses na qual arrasou a atuação de João Galamba no caso da comissão de inquérito à TAP, Marcelo prometeu ser "mais atento" e "mais interventivo" na fiscalização do Governo

O Presidente da República escolheu a estabilidade, não demitindo o Governo nem dissolvendo o Parlamento, depois de assumir, esta quinta-feira, que existe uma "divergência de fundo" com o primeiro-ministro, na sequência do caso que envolve o ministro João Galamba e que António Costa decidiu segurar.

Numa curta declaração ao país - a primeira declaração oficial após a recusa do primeiro-ministro em demitir o ministro das Infraestruturas, apesar de ser essa a vontade do Presidente - Marcelo Rebelo de Sousa recordou que "no passado, com maior ou menor distância temporal, foi sempre possível acertar agulhas" com o primeiro-ministro em diversas matérias.

"Desta vez não. Foi pena. Não por razões pessoais ou de disputa entre cargos, que a Constituição distingue muito bem entre si em termos de peso institucional, mas por razões de interesse nacional", assumiu.

Para o chefe de Estado, a responsabilidade política e administrativa deve reger o exercício de um governante, e terá sido o que falhou neste caso.

"Como pode um ministro não ser responsável por um colaborador que escolhera manter na sua equipa mais próxima, no seu gabinete, a acompanhar, ainda que para efeitos de informação, um dossier tão sensível como o da TAP, e merecer tanta confiança que podia assistir a reuniões privadas, preparando outras reuniões, essas públicas, na Assembleia da República?", começou por questionar.

O chefe de Estado prossegue, interrogando-se como pode João Galamba não ter responsabilidade por "situações rocambolescas, bizarras, inadmissíveis ou deploráveis" - ressalvando que estas palavras não são suas - suscitadas pelo seu então colaborador, que levaram a "apelar aos serviços mais sensíveis de proteção de segurança nacional, que, aliás, por definição, estão ao serviço do Estado e não do ministro".

Marcelo Rebelo de Sousa prometeu ser "mais atento" e "mais interveniente" na política nacional (LUSA)

Para o Presidente da República, assumir responsabilidades políticas e administrativas não se resume a pedir desculpa pelo sucedido. "Responsabilidade é mais do que pedir desculpa, virar a página e esquecer. É pagar por aquilo que se faz ou deixa de fazer", argumentou.

"Foi por tudo isto que entendi que o ministro das Infraestruturas deveria ter sido exonerado e que ocorreu uma divergência de fundo com o primeiro-ministro. Não sobre a pessoa, as suas qualidades pessoais ou até o seu desempenho, mas sobre a responsabilidade, credibilidade, a autoridade do ministro, do Governo e do Estado", justificou Marcelo.

Perante este cenário - e com outros em cima da mesa - o Presidente da República escolheu a "garantia da estabilidade institucional", afastando-se dos "cenários" que tem à sua disposição e que muitos analistas políticos recordaram e explanaram nas últimas horas, incluindo o cenário da 'bomba atómica' e antecipando a convocação de novas eleições.

"Os portugueses dispensam esses sobressaltos, essas paragens, esses compassos de espera, num tempo como este, em que o que querem é ver os seus governantes resolverem os problemas do dia a dia", defendeu.

"Comigo não contem para criar esses conflitos"

Em jeito de aviso, Marcelo salientou que há mais de sete anos que tem vindo a fazer "tudo para garantir a estabilidade institucional", num esforço de convivência com o executivo do espectro político oposto, "sem conflitos sensíveis".

"Comigo não contem para criar esses conflitos ou para deixar crescer tentativas isoladas ou concertadas para enfraquecer a função presidencial, envolvendo-a em alegados conflitos institucionais", vincou.

Demarcando-se das várias hipóteses que lhe foram apontadas, Marcelo assumiu que "o que sucedeu terá outros efeitos no futuro": "Terei de estar ainda mais atento à questão da responsabilidade política e administrativa dos que mandam."

"Até agora eu julgava que sobre essa matéria existia, com mais ou menos distância temporal, acordo no essencial. Viu-se que não, que há uma diferença de fundo", sublinhou.

Nos mais de dois anos de mandato que ainda tem pela frente, o presidente prometeu "sinalizar de modo mais intenso tudo aquilo que possa afastar os portugueses dos poderes públicos".

"Espero poder contar com a sensatez, o sentido de Estado e patriotismo de todos e, claro está, com a experiência, prudência e sabedoria do povo português", concluiu, afastando-se do púlpito no Palácio de Belém.

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