Discurso diplomático no 25 de Abril, acordos importantes fechados e posição mais clara sobre a guerra na Ucrânia é muito mais importante que protestos
“A notícia que lhes trago é que as forças democráticas brasileiras demonstraram sua solidez e resiliência.” Nada melhor do que o Parlamento português, em pleno 25 de Abril, para reforçar ao mundo o compromisso do Brasil com a democracia.
A vitória da soberania do povo contra a tirania é uma das mais importantes conquistas das últimas décadas em Portugal, no Brasil e em tantos outros países que viveram os horrores da ditadura. E agora, mais do que nunca, é hora de defendê-los e protegê-los, especialmente no momento em que existem ameaças concretas, como “quando alguns tentaram invadir e derrubar as instituições democráticas”, lembrou Augusto Santos Silva, presidente da Assembleia da República.
No discurso histórico, Lula resistiu ao ímpeto sempre presente de fugir das palavras já escolhidas e partir para o improviso. O tom foi diplomático do início ao fim, com um apanhado dos temas mais importantes que o momento ímpar exigia.
Os desafios contemporâneos que unem as democracias, o 25 de Abril como movimento inspirador para libertar o Brasil da ditadura, o perigo das fake news, a emergência climática e os direitos humanos estiveram na fala, assistida pelo mundo. E ainda usou versos de Chico Buarque, que torna tudo mais belo.
Sobre o ponto mais sensível na Europa no momento, Lula condenou, mesmo que não de maneira tão enfática, a guerra na Ucrânia. A diplomacia das palavras diz tudo. Utilizar “violação da integridade territorial da Ucrânia” não é o mesmo que “condenar a invasão russa”. Mesmo que ainda tímida, é importante que essa posição continue, sem voltar atrás no próximo discurso ou entrevista.
Em outro aceno estratégico, o presidente afagou a União Europeia (UE), a qual definiu como “um patrimônio democrático da humanidade”. A frase sinaliza uma forma de minimizar as recentes críticas ao bloco sobre a guerra. As palavras certamente vão chegar aos corredores de Bruxelas, onde será decidido o acordo com o Mercosul, do qual o Brasil está bastante esperançoso.
A visita ao parlamento, o hino brasileiro e português ecoando, os cravos vermelhos nas lapelas, a imprensa livre, os abraços, sorrisos e civilidade fecham cinco dias de visita de estado à terra de Camões, que certamente ficará na história. Com direito a comer bacalhau, claro.
Ao fim de semanas a fio de polêmicas, frases prontas de efeito, dancinhas no Tik Tok (me pergunto como vamos olhar para isso daqui 30 anos), ficará eternizado o que reflete os valores de Abril: diálogo entre os governos, especialmente sobre os direitos dos imigrantes, fortalecimento da diplomacia e democracia, acordos comerciais e de impacto social.
Entre protestos mais ou menos elegantes, com mais ou menos decoro que um assento parlamentar exige, dentro ou fora do parlamento, fica o essencial: a democracia e o direito de protestar. Foi pra isso que se fez a revolução e, mais ainda, se fez para proteger a democracia e não deixar que o fascismo se instale novamente.
Viva o 25 de Abril, viva a democracia. Viva a liberdade, a união do Brasil e Portugal, a união dos brasileiros e portugueses. Viva a língua portuguesa nos seus mais diferentes sotaques, viva os valores que a Revolução dos Cravos trouxe e inspirou o mundo. Hoje e sempre.
* Amanda Lima escreve a sua opinião em Português do Brasil