"Uma pouca-vergonha. Repito: é uma pouca-vergonha": foi desta forma que o primeiro-ministro - “estupefacto” - reagiu à notícia avançada pela CNN Portugal que dá conta da intenção dos procuradores que investigam o caso Spinumviva de pedirem a abertura de um inquérito. Luís Montenegro considera que esta nova revelação é uma "deslealdade institucional"
O comentador da CNN Portugal Filipe Santos Costa lembra que, historicamente, processos com repercussão política tendem a emergir em momentos sensíveis - como eleições. Nesse sentido, lembra episódios anteriores, como o processo dos submarinos. "Aqui há uns anos, quando Paulo Portas era um político no ativo, ele dizia sempre que os submarinos emergem quando há eleições e submergem quando não há eleições, porque ao longo de anos foi sempre assim. Havia essa coincidência do processo dos submarinos vir à tona sempre que havia eleições, era certo como o destino. Pelos vistos vai acontecer o mesmo com Luís Montenegro."
Para o comentador da CNN Portugal, a crítica de Luís Montenegro sobre “deslealdade institucional” reflete uma frustração compreensível, mas a informação disponível até agora não permite grandes conclusões: não há inquérito formal aberto e os detalhes sobre documentação em falta mantêm-se pouco claros. "Ponto 1. Luís Montenegro diz-se muito tranquilo, mas ao mesmo tempo diz-se revoltado, que isto é uma pouca-vergonha, uma deslealdade institucional, isto não parece tranquilidade nenhuma. Número 2. O caso Spinumviva nunca ficou esclarecido. O facto de não ter sido relevante para o resultado das legislativas, porque manifestamente o PSD ganhou e com um resultado melhor do que tinha tido nas eleições anteriores, significa que as pessoas não valorizaram este caso, mas ele nunca ficou esclarecido."
Filipe Santos Costa sublinha ainda que, apesar do impacto mediático, o efeito direto sobre a opinião do eleitorado pode ser limitado, sobretudo nas eleições autárquicas, onde os eleitores tendem a separar suspeitas nacionais do voto local. "Apostaria que nenhum eleitor, quando estiver no domingo a escolher o seu presidente de Câmara, escolherá condicionado pelo facto de haver suspeitas sobre o primeiro-ministro ter uma avença com a empresa A ou a empresa B. Dá-me ideia. Sobretudo nestas eleições, em particular, as pessoas sabem distinguir as coisas."
Para o comentador da CNN Portugal Miguel Pinheiro, "cada vez que se ouve a palavra Spinumviva é problemático para Luís Montenegro". Por outro lado: "Aquilo que me parece que se retira da reação oficial da Procuradoria - que negou que tivesse sido tomada uma decisão - é que há ali um dado factual que é importante: a Procuradoria diz que ainda está à espera de documentação. E isso deixa-me um bocadinho perplexo - não consigo entender exatamente porque é que falta documentação. Acho que era interessante percebermos porque é que essa documentação está em falta."
Para Miguel Pinheiro, é importante "perceber exatamente o que é que se está a passar" porque "ouvimos Luís Montenegro a dizer que deu toda a informação que foi pedida, mas depois temos a Procuradoria a dizer que ainda está à espera de documentação".
O advogado e também comentador da CNN Portugal Rogério Alves explica que a fase de averiguação preventiva, em que se encontra o processo, não equivale a um inquérito, sendo caracterizada por limitações legais e ausência de prazos definidos. Mas Rogério Alves sublinha que "já é tempo de esta decisão ser tomada".
"O pior de tudo é não haver decisão. O pior de tudo é a perpetuação desta situação de incerteza em que agora, ainda por cima, se tornou público - a fazer fé na notícia - de que já há uma convicção de quem investiga e que o assunto está no regaço do procurador-geral da República. Portanto, convinha que isto se decidisse", alerta Rogério Alves
O comentador da CNN Portugal defende que o esclarecimento rápido beneficiaria tanto o sistema judicial quanto a confiança pública e chama ainda a atenção para a exposição mediática prematura de investigações que, por lei, deveriam ser sigilosas.
Já o secretário-geral do PS considera que o primeiro-ministro deve dar as explicações sobre o caso Spinumviva que lhe forem pedidas “quando chegar a hora”, apelando a que se evitem precipitações. “A minha confiança na justiça mantém-se e a justiça fará o trabalho, no momento e com o método que considerar oportuno. Aquilo que eu entendo é que o primeiro-ministro, quando chegar a hora, deve dar as explicações que as autoridades lhe solicitarem”, afirma José Luís Carneiro, acrescentando que, “nestas matérias, o mais importante é mantermos um sentido de Estado". "O sentido de Estado é confiar nas instituições da justiça, confiar na justiça e evitar precipitações.”
José Luís Carneiro refere que aquilo que leu no comunicado que a Procuradoria-Geral da República (PGR) enviou a seguir à notícia da CNN Portugal era que "se mantinha em curso a averiguação preventiva". "Há que aguardar que ela chegue ao seu término e, depois, a partir da averiguação preventiva, haverá ou não lugar à realização do inquérito. Depois da realização do inquérito há depois a fase em que se pode ou não constituir arguido."
João Marcelino, comentador da CNN, considera que o caso Spinumviva terá "pouco impacto" nas eleições de domingo porque, até lá, “não haverá certezas sobre se esta averiguação se vai transformar num processo de inquérito criminal”. No entanto, "em termos nacionais, com certeza que terá importância saber se este processo de averiguação fica por aqui e termina". "Obviamente, todo o caso Spinumviva já foi julgado politicamente nas eleições legislativas." Por outro lado: se houver "novos dados", "isso com certeza condicionará muito a política portuguesa porque estará em causa as condições que Luís Montenegro possa vir ou não a ter para governar".
“Ou seja, aqui, neste caso, o que está em causa é que os procuradores que estão diretamente a investigar o caso terão, neste momento, determinadas apreciações em relação ao processo. E isso não deveria ser tornado público”, considera João Marcelino, acrescentando que o que “devemos querer todos em Portugal é que os inquéritos decorram serenamente e no resguardo destas antecipações, que não fazem sentido vindas de dentro da Justiça - porque só podem vir dentro da Justiça”.
Esta quarta-feira, durante uma ação de campanha em Lisboa, Carlos Moedas mostrou-se solidário com Montenegro, considerando "que o que aconteceu ontem é além de lamentável". "O senhor primeiro-ministro já deu todas as explicações, é algo que não deveria ter acontecido. Eu sobre isso não tenho dúvidas, não há aqui nenhum impacto [nas autárquicas] porque isto é algo que não deveria ter acontecido, que é de certa forma, como dizia o primeiro-ministro, é uma vergonha. É uma vergonha estarmos agora no meio de uma campanha eleitoral e ter acontecido isto, uma informação que vem de alguém de dentro e que não corresponde à verdade. Estou totalmente solidário."
Já Hugo Soares, líder parlamentar do PSD, considera que a repercussão de notícias sobre Spinumviva é frequentemente utilizada como "instrumento" de campanha e "manipulação da perceção pública". Diz ainda tratar-se de "campanhas sujas".