REPORTAGEM | O último dia de campanha da AD foi em Lisboa. Houve arruada no Chiado, um almoço com mulheres e um comício no Campo Pequeno. Luís Montenegro pisca o olho à esquerda e à direita, mas quer mesmo é ir em frente: "Agora é tempo de rematar a baliza, é tempo de marcar golo"
Os Insert Coin entraram pela arena do Campo Pequeno, em Lisboa, às 18:30, para animar os apoiantes que começavam a ocupar as bancadas. “I got a feeling that tonight's gonna be a good night”. A música está altíssima, os jovens agitam as bandeiras e cantam o refrão dos Black Eyed Peas. Ao fim de duas semanas de campanha, ao menos nisto todos concordamos: esta será uma noite boa, porque será a última. Estamos no comício de encerramento da campanha da AD e, pelo menos até domingo, não teremos de ouvir mais bombos nem “deixa o Luís a trabalhar”. Mas até lá ainda teremos sofrer bastante ao som da “Macarena”, da “Barbie Girl”, da “Casinha” dos Xutos, do “atirei o pau ao gato”, êxitos de Quim Barreiros e Emanuel. A barulheira é tanta que até já desejamos que os discursos comecem rapidamente.
Luís Montenegro chega uma hora depois. O Campo Pequeno não está completamente cheio. Em todos os lugares foram colocadas bandeiras da AD ou de Portugal e há muitas bandeiras que ficam nos seus lugares. Mas isso não desmotiva os candidatos. Depois de breves discursos de Joaquim Miranda Sarmento, cabeça de lista da AD em Lisboa, e de Nuno Melo, do CDS-PP, o líder da AD ocupa finalmente o púlpito para o último discurso: "Podem ter a certeza, o Luís vai trabalhar, o Luís vai continuar a trabalhar e Portugal não vai parar", começa por dizer.
"Há muitos anos que não víamos uma campanha assim, que não sentíamos tanto entusiasmo", diz Luís Montenegro, garantindo ainda que "nesta equipa jogam todos e para todos" e voltando a falar da necessidade de o país ter estabilidade. "Eu sei que as portuguesas e os portugueses estão cansados de eleições", diz, e é por isso que afirma "tranquilamente, serenamente", que confia na decisão que os eleitores tomarem no domingo.
Sem nunca referir o caso Spinumviva, o primeiro-ministro afirma que a sua é uma "liderança ética: "Aqueles que não conseguiram contrapor o projeto e desacreditar a equipa, tentaram a via mais fácil que era atacar o líder. A minha postura é diferente, eu estou aqui para apresentar soluções. E não me queixo, sujeito-me a todo o escrutínio e toda a avaliação. Nunca ninguém foi tão transparente como eu fui", diz, acrescentando: "Nunca farei a ninguém aquilo que me quiseram fazer a mim." Neste momento, é aplaudido por todos, enquanto um grupo de apoiantes grita: "Já não pára, Montenegro! Já não pára!"
"Eu sei que vamos ganhar as eleições, mas ainda que as não ganhássemos, eu já ia de coração cheio por termos um grande país. Viva Portugal!"
"What is happening here?" - é o show de Luís Montenegro a descer o Chiado
Se ontem o duelo foi em Santa Catarina, no Porto, esta sexta-feira todos os caminhos levavam os políticos ao Chiado, em Lisboa. Para evitar cruzamentos com o PS e com o Chega - e também porque Luís Montenegro tinha um almoço marcado com mulheres, na Estufa Fria - a AD decidiu fazer a sua arruada ao final da manhã. Passava pouco das 11:00 e já havia baile junto à estátua do Chiado. Vestidos de amarelo, os elementos da Charanga Huga do Rosário tocam canções populares - nada de “macarenas” nem “ana júlia”, aqui cheira bem, cheira a Lisboa, aperta, aperta com ela, viva a Espanha e mais umas quantas canções orelhudas que põem os apoiantes da AD a dançar.
Está um dia de calor, o sol aquece as cabeças dos militantes, os turistas que tinham pensado tomar um brunch descansado na esplanada da Brasileira estão estupefactos com tanta movimentação, outros sacam do telemóvel e começam a filmar.
“What is happening here?”, pergunta um turista. Maria responde-lhe em inglês que é a campanha eleitoral do partido social-democrata e, depois, não vá o turista ficar equivocado, acrescenta: “From the right, not the left.” Maria Granja tem 61 anos e veio de Oeiras para apoiar Luís Montenegro: “Acho que é o único com capacidade para ocupar o lugar de primeiro-ministro”, diz. “O do Partido Socialista, que nem vou dizer o nome, não me inspira confiança nenhuma.” Com uma bandeira não mão e autocolantes ao peito, como quase todos os apoiantes que se juntam para a arruada, Maria defende que Montenegro deve ter oportunidade de continuar as políticas iniciadas. Entre as medidas do último Governo que considera mais relevantes, destaca os medicamentos mais baratos para os pensionistas. “Conheço muitas pessoas mais velhas que antes votavam no PS e que agora vão votar AD porque, de facto, percebem que a sua vida melhorou. Para mim, é um homem que só diz o que realmente faz”, conclui.
Joana, de 24 anos, e Leonor, de 21, são militantes da Juventude Popular e também vieram dar o seu apoio à coligação.”Acho que é superimportante nesta altura de instabilidade do país estar aqui a apoiar a campanha da AD”, explica Leonor. As duas amigas estão contentes com as políticas de apoio aos jovens, como o IRS Jovem e o apoio à compra de casa. “Temos vários amigos que saíram do país porque não tinham perspetivas aqui”, diz Joana. “A geração dos nossos pais não tinha salários muito mais altos mas tinham acesso a uma vida digna, hoje é muito mais complicado. Os jovens têm de sair para ganhar dinheiro para depois poderem voltar e comprar uma casa.”
Luís Montenegro chega ao Chiado e a partir daqui já conhecemos o guião. A charanga vai à frente, os seguranças estabelecem um perímetro de segurança, os jovens rodeiam o líder com gritos, bandeiras e balões gigantes, alguns apoiantes conseguem aproximar-se de Montenegro e a multidão por ali vai, descendo a rua Garret e depois a rua do Carmo. Em três momentos um canhão lança papelinhos azuis e cor-de-laranja, momento bastante instagramável, e é ver apoiantes, turistas, transeuntes, gente de todas as cores políticas a tirar fotografias, que é para isso, afinal, que se fazem arruadas, não é?
Na descida do Chiado, o líder do PSD teve ao seu lado a mulher, Carla Montenegro, o presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, o presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, e membros do seu Governo como o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, também cabeça de lista da AD por Lisboa. Na primeira linha estiveram ainda o presidente do CDS, Nuno Melo, a antiga líder social-democrata Manuela Ferreira Leite, a “primeira vice” do PSD, Leonor Beleza, - as duas passaram para o lado de Montenegro no final da arruada - e outros membros do seu Executivo como Miguel Pinto Luz, António Leitão Amaro ou Margarida Balseiro Lopes.
"Já só faltam dois dias para a vitória", cantam os jovens. Ao chegar ao Rossio, aos ombros de dois apoiantes, como aconteceu várias vezes além do percurso de cerca de meia hora, Luís Montenegro fala brevemente com o megafone na mão, antes de entrar para o carro: “Muito obrigado a todos e a todas. Estamos no último dia da campanha eleitoral, uma campanha eleitoral mágica, uma campanha eleitoral das pessoas, uma campanha eleitoral do futuro e da esperança.” Aos apoiantes e eleitores potenciais da AD, deixa um último pedido, também em forma de alerta. “Só vos peço um último esforço, um esforço para darmos tudo até ao último segundo: todos os indicadores apontam para que estamos no rumo certo, mas nada está garantido. Temos de levar todos a votar e temos de levar a nossa vitória para darmos estabilidade a Portugal.” Empoleirado no carro, Luís Montenegro acena a todos. Os apoiantes gritam "Portugal, Portugal, Portugal".
"Agora é tempo de rematar à baliza, é tempo de marcar golo"
No final destas duas semanas de campanha, Montenegro mostra-se confiante. Luís quer continuar a trabalhar, como diz a canção. "Nós fizemos em 11 meses mais do que o PS fez em oito anos", disse-se até à exaustão. Nos seus últimos discursos, algumas ideias foram enfatizadas. Desde logo, a redução dos impostos. Luís Montenegro insistiu na ideia de que quem mais trabalha deve levar mais dinheiro para casa no final do mês e dar menos dinheiro ao Estado - uma das grande batalhas dos liberais. E voltou a dizê-lo esta sexta-feira: "Aqueles que acham que nós estivemos apenas a acenar com uma mensagem eleitoralista é porque têm uma visão da política muito pequenina. Nós queremos que as pessoas sintam que o trabalho vale a pena, que quem trabalha mais e tem melhores resultados seja mais remunerado, queremos que o mérito seja recompensado. Se tivermos uma economia mais competitiva é para bem de todos."
O aumento das pensões e os acordos laborais conseguidos com vários trabalhadores também foram muitas vezes dados como exemplo do trabalho feito ao longo dos últimos meses. Por várias vezes, Montenegro garantiu que não vai deixar cair o SNS nem a escola pública, e defendeu um estado social que pode até ter menos Estado mas "não deixa ninguém para trás", ao contrário daquilo que a esquerda diz. A aposta na segurança (e a defesa das megaoperações policiais) e a regulação da imigração foram outras das bandeiras erguidas, com Luís Montenegro a piscar claramente o olho ao eleitorado do Chega. No último discurso, Montenegro voltou a criticar a "balbúrdia" herdada do anterior Governo no que toca à imigração e reforçou que "quem não cumpre as regras tem mesmo de sair". falou muito da necessidade de "autoridade".
O apelo ao voto passou precisamente por colocar a AD no centro político, num espaço de “moderação”. "Não somos socialistas. Porque se fôssemos socialistas, nós achávamos que era o Estado que fazia tudo. Se fôssemos socialistas, nós andávamos a engordar o Estado para o Estado se autoalimentar a si próprio", disse Montenegro. No entanto, também não é liberal. "Se fôssemos liberais, achávamos que era o mercado, que era a sociedade que resolvia os problemas de todos por si só. E nós não achamos isso."
Sobre o que vai acontecer na segunda-feira, Montenegro garantiu que só governará se vencer as eleições. Mas sobre um eventual acordo de governação com a Iniciativa Liberal nunca foi claro. De qualquer forma, em todos os comícios pediu "uma maioria maior" e também falou do "voto útil na AD", o único voto na "estabilidade - a AD quer governar sozinha e só se isso não for possível é que colocará outras hipóteses. "Cada voto no Chega, cada voto na Iniciativa Liberal, só deixará o Partido Socialista mais próximo de vencer", voltou a dizer Nuno Melo esta tarde no Campo Pequeno.
Já no almoço desta sexta-feira, Luís Montenegro afirmou que os portugueses podem confiar na AD, "porque independentemente da dimensão da maioria que lhe for atribuída, esta coligação eleitoral estará à altura da sua responsabilidade". "Saberemos ouvir, saberemos estar em diálogo permanente com todos aqueles que estão de boa-fé no espaço público, com todos aqueles que representam setores de atividade em Portugal", prometeu.
O que vai acontecer na segunda-feira depende do resultado obtido no domingo. No último dia de campanha Luís Montenegro já não tem mais cartas para jogar: "Agora é tempo de rematar à baliza, é tempo de marcar golo."