Portugal vive um momento decisivo. O debate sobre a regulação do lobbying chegou à especialidade parlamentar e esta pode ser a oportunidade que o país precisava para aprovar uma lei justa e transparente. Depois de sucessivos adiamentos, o tema volta à mesa com um consenso político raro e uma urgência evidente: regular para fortalecer a democracia.
A verdade é que Portugal continua entre os poucos países da União Europeia sem enquadramento legal definitivo para o lobbying. Esta ausência prejudica a competitividade e fragiliza a confiança nas instituições. Num contexto em que os cidadãos pedem mais transparência e ética pública, manter tudo como está é um risco que o país já não pode correr.
Pela experiência que tenho numa agência global presente em Portugal, Espanha, Bruxelas e na América Latina, tenho acompanhado de perto a evolução destas matérias. Em Bruxelas existe um registo de interesses consolidado, embora os debates sobre fiscalização e conflitos de interesse se mantenham muito vivos; em Espanha, o processo legislativo deu passos claros nos últimos anos e, em 2024-2025, surgiram propostas para um regime nacional mais estruturado, com desafios práticos de implementação a nível regional; e na América Latina o progresso é heterogéneo. Há países que já avançaram com registos e estudos, nomeadamente Chile e México, enquanto outros estão agora a iniciar reformas.
É também altura de desmistificar o termo. “Lobbying” não é sinónimo de tráfico de influências. Quando regulado, é uma ferramenta legítima de participação democrática. Permite que empresas, associações, sindicatos e organizações da sociedade civil partilhem conhecimento com os decisores públicos e contribuam para políticas mais informadas. O problema nunca foi o diálogo entre o poder político e os interesses privados, mas a falta de regras claras sobre como esse diálogo ocorre.
Uma lei eficaz deverá ser igual para todos. Empresas, ONGs, sindicatos, ex-governantes e consultoras devem estar sujeitos às mesmas regras. A transparência não se mede por intenções, mede-se por práticas. Sempre que há exceções, abre-se espaço para zonas cinzentas e desigualdades de acesso. E quando os cidadãos não sabem quem influencia as decisões públicas, a confiança quebra-se.
A regulação do lobbying não é apenas uma questão ética, é também económica. Um sistema transparente e previsível cria um ambiente de negócios mais estável, e garante às pequenas e médias empresas condições mais justas para competir. A previsibilidade institucional é, hoje, um fator de competitividade tão importante como a fiscalidade ou a inovação.
Existem exemplos que Portugal pode seguir. O registo público de lobistas e a chamada “pegada legislativa” que documenta as interações entre decisores e representantes de interesses são instrumentos, simples e eficazes, para garantir responsabilidade e transparência. O país tem agora uma janela de oportunidade. O Governo e a Assembleia da República devem agir com coragem e não deixar que o tema volte a ser adiado. Regular o lobbying
não é criar privilégios, é garantir igualdade. Não é limitar o diálogo, é dar-lhe luz. A transparência não é um obstáculo à política, é a sua melhor defesa.
Aprovar uma lei de lobbying é investir na integridade das instituições e na maturidade democrática do país. É um passo em frente e, desta vez, é urgente que seja dado.