Chuva em Lisboa bateu recordes. Não é um fenómeno "ímpar", mas é "extremo" - e deverá ocorrer com cada vez mais frequência

13 dez 2022, 22:02
Mau tempo em Lisboa (Lusa/ Tiago Petinga)

Fenómenos climatológicos e meteorológicos como o desta terça-feira deverão tornar-se cada vez "mais intensos e persistentes"

O mau tempo fustigou todo o território continental esta terça-feira, mas a cidade de Lisboa foi a região mais afetada. A estação meteorológica do Instituto Geofísico atingiu um novo valor máximo de precipitação entre 12 e 13 de novembro - significa isto que, até à data, naquele local, nunca se tinham registado valores de precipitação tão intensos num período de 24 horas.

Um relatório do IPMA enviado à CNN Portugal explica que o agravamento do estado do tempo nos últimos dois dias "foi condicionado por um fluxo de sudoeste, induzido pela depressão Efrain, que transportava uma massa de ar quente e com elevado conteúdo em vapor de água, com convecção embebida". As consequências, em termos mais simples, foram aquelas que se registaram em várias zonas do país, com destaque para a capital: "precipitação forte e persistente, por vezes acompanhada de trovoada". 

No mesmo relatório, são indicados quatro pontos em que se verificaram novos extremos de precipitação diária: o já referido Instituto Geofísico e, fora de Lisboa, as estações do Barreiro, Almada e Mora. A estação lisboeta registou 120,3 milímetros de precipitação no dia 13 de dezembro, ultrapassando o valor recorde anterior de 118.4 milímetros assinalado no dia 18 de fevereiro de 2008.

Importa realçar, porém, que noutras estações "o valor da precipitação registada em 24 horas foi da ordem de grandeza normal climatológica do mês". Ou seja, "foram atingidos recordes de precipitação, sim, mas não foi atingido o recorde de extremo absoluto da cidade de Lisboa", relativiza Ricardo Deus, chefe da Divisão de Clima e Alterações Climáticas do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA).

A estação do Instituto Geofísico, situada na Escola Politécnica de Lisboa, é apenas uma das várias estações meteorológicas distribuídas pela cidade. A amostragem recolhida neste ponto é posteriormente comparada com as leituras das restantes estações, permitindo obter uma dimensão mais abrangente e rigorosa do fenómeno. "Poderíamos fazer um exercício de extrapolação e dizer que aquele valor é o valor médio para a cidade de Lisboa, mas em termos de rigor fazemos uma comparação ponto a ponto nos locais onde há amostragem de dados", explica o especialista do IPMA.

A estação de Gago Coutinho, por exemplo, apesar de também ter registado valores de precipitação elevados, não atingiu valores recorde. Aliás, numa perspetiva temporal mais ampla, "até já aconteceram fenómenos com valores de precipitação ainda mais elevados na cidade de Lisboa". O fenómeno de precipitação desta terça-feira foi, portanto, "excecional, extremo, de magnitude muito elevada - mas não é um fenómeno ímpar". 

Fenómenos meteorológicos serão "mais intensos e persistentes"

Situações climatológicas e meteorológicas extremas sempre ocorreram. O que individualiza (e exacerba) os fenómenos mais recentes é acontecerem com cada vez mais regularidade, sobretudo em "malhas urbanas" como Lisboa. "Os indicadores apontam, de facto, que estes fenómenos serão mais intensos, mais persistentes, com quantidades de precipitação mais elevadas em períodos curtos", reconhece Ricardo Deus.

A explicação para este agravamento relaciona-se, "necessariamente", com as alterações climáticas. "É necessário compreender que esta fenomenologia está a acontecer num clima diferente. A temperatura do ar está mais elevada, em termos médios, e proporciona um clima muito mais energético" que, como tal, é também muito mais propício a situações meteorológicas extremas.

Fenómenos como o desta terça-feira parecem pintar a nova realidade de Lisboa. O impacto em terra pode ser minimizado através da permeabilização dos solos e de mecanismos mais eficazes de escoamento das águas, mas pouco podemos fazer para combater as intempéries comandadas pelo céu - pelo menos a curto prazo. 

"A adaptação é a melhor forma de convivermos com estes fenómenos. A curto prazo, não há muito mais a fazer. A longo prazo, temos de continuar a trabalhar na mitigação e tornar as pessoas mais sensíveis à temática das alterações climáticas", alerta o especialista.

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