A votação da Lei da Nacionalidade, que estava prevista para quarta-feira no Parlamento, voltou a ser adiada. A falta de acordo nesta matéria levou a que durante a noite de terça para quarta-feira entrassem novas propostas de PSD/CDS, PS e Chega. A comissão de Assuntos Constitucionais decidiu não se reunir para que as propostas sejam analisadas. Mas vejamos o que se sabe
O que é a Lei da Nacionalidade?
A Lei da Nacionalidade regula quando uma pessoa é ou quando se pode tornar portuguesa, seja por nacionalidade originária (ao nascer) ou por aquisição (naturalização). Criada em 1981, já sofreu algumas alterações ao longo das últimas décadas.
Quem pode ser português?
Por nascimento ou por filiação, podem ser cidadãos portugueses: filhos de mãe ou pai português nascidos no país; filhos de mãe ou pai português nascidos no estrangeiro, se o progenitor estiver ao serviço do Estado; filhos de mãe ou pai português nascidos no estrangeiro se tiverem o nascimento inscrito no Registo Civil português ou declararem que querem ser portugueses.
Mas não só. Há também a possibilidade de adquirir a nacionalidade se a pessoa tiver pelo menos um ascendente de nacionalidade portuguesa originária de 2.º grau na linha reta que não tenha perdido essa nacionalidade. Basta declararem que querem ser portugueses e possuírem laços de afetiva ligação ao país.
Também há regimes especiais que englobam filhos de estrangeiros que residem legalmente em Portugal (ao fim de cinco anos de residência) ou outros oriundos das ex-colónias e com regimes especiais.
Nos casos da aquisição de nacionalidade por naturalização, as regras atuais são: residência legal em território português por determinado período - cinco anos; tem de saber falar português e não ser uma ameaça para a segurança ou defesa nacional. Tem ainda de provar ter laços ou estar integrado na comunidade.
Com as alterações que entraram em vigor em 2022, os filhos de cidadãos estrangeiros nascidos em Portugal cujos pais residam no país há pelo menos um ano também podem adquirir nacionalidade portuguesa, tal como cidadãos estrangeiros que residam há pelo menos cinco anos e tenham filhos nascidos no país.
E o que pode mudar com a nova lei?
Este não é um tema consensual entre partidos e as divergências entre direita e esquerda não têm permitido um acordo sobre a nova Lei da Nacionalidade.
Por exemplo, o Governo quer alterar e aumentar o prazo de residência legal no país. Em vez de cinco anos quer exigir sete anos para cidadãos de língua portuguesa (países lusófonos) e 10 anos para os demais. Quer ainda tornar obrigatório um exame de cultura/ligação à comunidade portuguesa e direitos/deveres associados à nacionalidade.
Mas um dos aspectos mais polémicos está relacionado com a perda da nacionalidade após a condenação por crimes graves. Inicialmente, o Governo pretendia a perda da nacionalidade para naturalizados há menos de 10 anos se fossem condenados por crimes graves.
Mas na noite de terça-feira o PSD e o CDS apresentaram uma proposta para que passe a estar prevista no Código Penal a perda de nacionalidade como pena acessória, retirando esta matéria da proposta de Lei da Nacionalidade, passando de cinco para quatro anos esta perda como pena acessória. Esta perda de nacionalidade seria decretada por um juiz, em caso de crimes de alta gravidade com pena de prisão efetiva igual ou superior a quatro anos, tal como crimes contra o Estado ou crimes violentos, como homicídios ou violações.
Um dos partidos que mais têm feito exigências neste ponto é o Chega, que também esta terça-feira apresentou uma alteração sobre este ponto, propondo agora que possa ser aplicada a pena de perda de nacionalidade a quem tenha sido condenado em pena de prisão efetiva de duração igual ou superior a três anos.
O PS e os outros partidos de esquerda recusam o princípio da perda de nacionalidade como pena acessória. Mas nenhuma destas alterações está ainda em vigor.
Todavia, é importante referir que a atual lei prevê que, em alguns casos, a nacionalidade portuguesa possa ser perdida. Por exemplo, por aquisição de outra nacionalidade.
A atribuição da nacionalidade portuguesa aos filhos de estrangeiros que vivem em Portugal tem sido outro aspeto a dividir partidos. Por exemplo, o PS entende (agora) que devem ter direito à nacionalidade as crianças nascidas no território português desde que, no momento do nascimento, um dos progenitores resida legalmente no território português há pelo menos dois anos. A lei atual refere um ano.
Outra aproximação do PS ao PSD verifica-se na aquisição de nacionalidade por cidadãos de países de língua oficial portuguesa ou da União Europeia. A aquisição da nacionalidade passa para seis anos, quando antes eram cinco anos. No caso de cidadãos de países terceiros, o PS sobe de sete para oito o prazo para aquisição da nacionalidade, “sem prejuízo de prazo distinto constante de convenção internacional em regime de reciprocidade”.
E os judeus sefarditas e as ex-colónias?
Os descendentes dos judeus sefarditas portugueses também usufruem de um regime especial que permite que os descendentes obtenham a nacionalidade, desde que comprovem a sua ligação ao país. Mas este é outro dos pontos que o Governo quer alterar, extinguindo esta forma de naturalização.
Também as pessoas nascidas nas ex-colónias portuguesas antes de 25 de Abril de 1974 ou que residiam em Portugal nessa data têm regime específico. Este permite que descendentes de cidadãos nascidos nas ex-colónias (Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe) possam solicitar a nacionalidade portuguesa, principalmente através da nacionalidade dos avós: podem ser netos, filhos ou até o próprio cônjuge. Sendo, por norma, exigido que o ascendente tenha nascido e falecido em território ultramarino antes da independência e que o requerente demonstre laços de ligação à comunidade portuguesa.
"Lei da Nacionalidade" e "Lei dos Estrangeiros" são nomes diferentes para a mesma coisa?
Não. A Lei dos Estrangeiros e a Lei da Nacionalidade são distintas e regulam situações distintas. A Lei dos Estrangeiros regula a entrada e permanência no país de cidadãos estrangeiros. É responsável pela atribuição de vistos, autorização de residência e reagrupamento familiar. Essa lei já foi promulgada pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.