Governo apresenta queixa de notícia incómoda sobre a TAP, jornal reage: "Escrevemos a verdade, desmentimos preto no branco" Medina

Agência Lusa , AM
20 abr 2023, 09:00
António Costa e Fernando Medina no Parlamento (Lusa/ José Sena Goulão)

Notícia em causa tinha por título "Medina ainda procura justa causa já depois de demitir CEO da TAP". Foi publicada no Jornal Económico. Esta queixa do Governo surge numa altura em Fernando Medina e João Galamba recusaram entregar à comissão de inquérito à TAP um parecer que fundamenta o despedimento da CEO - o PSD já disse que o Executivo de António Costa incorre "num crime de desobediência qualificada"

O Ministério das Finanças apresentou queixa na ERC contra o Jornal Económico sobre um artigo relativo à justa causa da demissão da CEO da TAP, tendo o diretor confirmado a notificação e garantido que as notícias do título "são verdadeiras".

A queixa, de acordo com documentação a que a Lusa teve acesso, deu entrada na Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) em 10 de abril e é relativa ao artigo "Medina ainda procura justa causa já depois de demitir CEO [presidente executiva] da TAP", que foi publicado em 10 de março.

No documento, assinado pelo ministro das Finanças, Fernando Medina, é apresentado "recurso por cumprimento deficiente da publicação de um direito de resposta e retificação e queixa por violação do dever de rigor informativo contra o Jornal Económico [JE]", detido pela Media9Par.

"Confirmo que fomos notificados. Vamos analisar com calma e apresentar a nossa oposição", disse o diretor do JE, Filipe Alves, à Lusa.

"Posso dizer apenas que as notícias que escrevemos são verdadeiras, como de resto se veio a comprovar. E agora estamos a ser objeto de uma queixa na ERC não por escrever notícias falsas, mas sim por desmentir, preto no branco, o desmentido das Finanças. Diz muito sobre o estado da nossa democracia", concluiu.

A notícia em causa (de 10 de março) refere que, "só depois de ter demitido a presidente executiva (CEO) e o 'chairman' (presidente do Conselho de Administração) da TAP, o Ministério das Finanças chamou advogados para ajudar a reforçar a justa causa".

Em 13 de março, em Bruxelas, o ministro das Finanças negou ter contactado escritórios de advogados já depois de ter anunciado a saída da CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, para sustentar juridicamente o despedimento por justa causa.

Três dias depois, o Ministério das Finanças requereu ao JE o exercício de direito de resposta e retificação relativamente ao conteúdo daquela notícia, o qual foi publicado na edição de 17 de março, na página 02, com a chamada de capa "Direito de Resposta e Retificação: Medina ainda procura justa causa já depois de demitir CEO da TAP".

No Direito de Resposta, o Ministério das Finanças diz que "é falso que o Governo estivesse à procura das razões que justificam a justa causa para as demissões do presidente do Conselho de Administração e da presidente executiva" da TAP "após o anúncio da decisão".

"E é igualmente falso que o Governo tenha promovido várias reuniões com escritórios de advogados para identificar as razões que sustentam a decisão", lê-se no Direito de Resposta, referindo que o Ministério das Finanças "não comentam reuniões regulares ao seu funcionamento, incluindo com equipas jurídicas internas e externas que trabalham com o Estado".

Ainda assim, "desmente que tenham ocorrido reuniões com escritórios de advogados externos noticiados por este jornal com o intuito de, após o anúncio, ser identificada a fundamentação da destituição por justa causa anunciada a 06 de março", adianta o Direito de Resposta.

Nessa mesma edição, o JE chama à capa que "Sócio da VdA [Vieira de Almeida] confirma que Governo pediu apoio jurídico sobre CEO da TAP", no qual confrontado pelo Jornal Económico o advogado Jorge Bleck "confirma que Finanças pediram apoio para 'dar sequência às conclusões do parecer da IGF'" sobre a CEO da TAP.

Na queixa, as Finanças referem que esta notícia tem "chamada de capa" que "visualmente, pela inserção e tamanho, se destaca da chamada de capa relativa ao direito de resposta e retificação do Ministério das Finanças".

Para as Finanças, "o Jornal Económico violou, de modo flagrante, os deveres que sobre si recaem nos termos do artigo 26.º da Lei da Imprensa, aquando da publicação do texto do Ministério das Finanças submetido ao abrigo do direito de resposta e retificação" em 16 de março.

Este artigo versa sobre a publicação da resposta ou da retificação, que no número 3 refere que a "publicação é gratuita e feita na mesma secção, com o mesmo relevo e apresentação do escrito ou imagem que tiver provocado a resposta ou retificação, de uma só vez, sem interpolações nem interrupções, devendo ser precedida da indicação de que se trata de direito de resposta ou retificação".

Já o número 6 do mesmo artigo, apontam as Finanças, refere que "no mesmo número em que for publicada a resposta ou a retificação só é permitido à direção do periódico fazer inserir uma breve anotação à mesma, da sua autoria, com o estrito fim de apontar qualquer inexatidão ou erro de facto contidos na resposta ou na retificação", a qual pode originar nova resposta ou retificação.

"O Jornal Económico incumpriu patentemente os citados preceitos da Lei de Imprensa, na vertente do princípio de igualdade de armas, porquanto não atribuiu ao direito de resposta e retificação do Ministério das Finanças destaque equivalente ao da notícia que o originou e porquanto fez publicar, na mesma edição, dois textos destinados a desvalorizar e descredibilizar aquele direito de resposta e retificação", consideram as Finanças.

Além disso, na mesma edição em que foi publicado o direito de resposta e retificação das Finanças, o JE "fez constar um editorial na página 2 e uma notícia na página 3 - ocupando respetivamente meia página e uma página completa - que repisam o teor da notícia que motivou o direito de resposta e retificação e, mais do que isso, procuram desvalorizar e descredibilizar o respetivo teor", diz o ministério tutelado por Medina.

As Finanças apontam ainda que a notícia de 10 de março viola os deveres de rigor informativo e objetividade.

Governo recusa enviar parecer para "salvaguarda do interesse público"

O Governo continua a recusar enviar à comissão de inquérito da TAP os pareceres jurídicos que deram respaldo à demissão da anterior presidente-executiva da companhia, justificando a recusa com a necessidade de "salvaguarda do interesse público".

Numa nota enviada à agência Lusa, o gabinete da ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, alega que "o parecer em causa não cabe no âmbito da comissão parlamentar de inquérito (CPI)" e "a sua divulgação envolve riscos na defesa jurídica da posição do Estado".

"Por isso mesmo, a resposta do Governo à CPI visa a salvaguarda do interesse público", assinala a nota do gabinete de Ana Catarina Mendes.

O PSD acusou o Governo de “atuar à margem da lei” por recusar enviar à comissão de inquérito à TAP os pareceres que deram “respaldo jurídico” à demissão da CEO por justa causa, pedindo uma reunião urgente para esta terça-feira.

No requerimento do PSD, é citada a resposta que chegou dos ministérios de Fernando Medina e de João Galamba.

“A Resolução da Assembleia da República n.º 7/2023, de 14 de fevereiro, foi aprovada no dia 3 de fevereiro de 2023 para constituição de uma comissão de inquérito à tutela política da gestão da TAP SGPS e da TAP SA. Nos seus termos, foi delimitado o respetivo objeto (cfr. alíneas a) a g) da referida resolução) e, bem assim, o horizonte temporal (período entre 2020 e 2022)”, referem.

Segundo a mesma resposta do Governo, “extravasando o aludido objeto da comissão parlamentar de inquérito e/ou reportando-se a factos posteriores à respetiva constituição, as informações requeridas não recaem no escopo” do Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares.

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