Opinião: jurados no caso de Johnny Depp e Amber Heard têm de escolher em que ator acreditar

CNN , Opinião de Paul Callan
11 mai 2022, 22:00
Johnny Depp e Amber Heard (AP Photo)

Nota: Paul Callan é um analista jurídico da CNN Internacional, um antigo procurador de homicídios de Nova Iorque e consultor da firma de advocacia nova-iorquina Edelman & Edelman PC, que se foca em casos de condenação ilícita e direitos cívicos. As opiniões expressas neste comentário são dele

Há uma história, talvez apócrifa, de que a filha de Johnny Depp, Lily-Rose, quando lhe perguntaram o que o pai fazia, respondeu: "O meu pai é um pirata." Se Depp receber uma grande indemnização por danos no seu caso atualmente em julgamento em Fairfax, na Virgínia, a sua lenda como pirata pode crescer. Claro que os jurados poderiam, em vez disso, optar por atribuir uma enorme quantia de dinheiro à ex-mulher de Depp, Amber Heard, caso aceitassem as suas descrições chorosas de violência e abuso alegadamente infligidas nela por Depp. Outra possibilidade real é ambos os litigantes estrelas de cinema saírem do tribunal de mãos a abanar.

O julgamento do caso de difamação de Depp contra Heard entrou no seu 15.º dia na quinta-feira. Depp alega que Heard o acusou falsa e maliciosamente de violência doméstica, prejudicando a sua carreira e reputação em 50 milhões de dólares. Heard contraprocessou com 100 milhões de dólares por ofensas morais.

Tanto Heard como Depp negaram as alegações de abuso um do outro.

Os primeiros 15 dias deste julgamento pareceram mais um reality show do que um processo na Virgínia. Depp está vestido à boa tradição de estrela de cinema, com roupas vistosas enquanto usa vários anéis, um rabo de cavalo, óculos de sol, lenço ao pescoço, brincos e uma série de tatuagens visíveis dignas da sua famosa interpretação como Capitão Jack Sparrow em "Piratas das Caraíbas".

O tribunal tem estado cheio, com filas de espectadores na expetativa de um vislumbre de Depp e Heard. Depp, no entanto, é claramente a atração principal. Isto é compreensível dado o papel do ator de 58 anos como protagonista em 40 filmes, com um rendimento bruto nas bilheteiras de mais de 8 mil milhões de dólares, colocando-o na terceira posição em rendimentos brutos a nível mundial. Em comparação, Heard, de 36 anos, está na posição 2.086 no seu papel de atriz secundária em 11 filmes, rendendo menos de 1,2 mil milhões de dólares. (É claro que a carreira de Depp também foi mais longa do que a de Heard.)

Na antecipação do julgamento, muitos advogados com quem falei que estavam a seguir o caso achavam que Depp não tinha hipótese de ganhar. Os casos de difamação interpostos por uma figura pública como Depp são mais difíceis de provar porque o queixoso tem de provar não só que uma declaração ofensiva sobre ele era falsa, mas também que foi feita com "malícia".

Depp também tinha perdido um caso de difamação contra um tabloide britânico em 2020 que o descreveu como um "espancador de esposas".

Durante os primeiros 13 dias do julgamento, os advogados de Depp tentaram sistematicamente destruir a reputação de Heard, chamando inúmeras testemunhas que testemunharam que as coisas que viram e ouviram sugeriam que ela tinha sido abusiva em relação a Depp. Depp testemunhou de forma estranha e murmurante, raramente estabelecendo contacto visual com alguém na sala de audiências, mas a história que contou pareceu convincente para muitos, particularmente para os seus fãs.

Apoiados por testemunhos ao vivo e vídeos de depoimentos do seu guarda-costas, Malcolm Connolly, e de outros, os advogados de Depp alegaram que o abuso de Heard para com Depp começou na viagem de lua de mel no Expresso do Oriente. Connolly testemunhou que observou arranhões no pescoço de Depp bem como hematomas no olho e no nariz, e ainda um lábio inchado após um alegado ataque particularmente violento de Heard durante a viagem. O guarda-costas disse que parecia que “ele foi de encontro a uma porta, ou uma porta foi de encontro a ele”.

O testemunho direto de Depp pintou o casamento como uma câmara de horrores. Recordou ter-se escondido numa casa de banho para se proteger, certa vez, depois de ter sido atingido no crânio por Heard, que admite numa gravação áudio que não pode negá-lo porque estava "sob a influência de Ambien" na altura.

Em mais um incidente, Depp alegou que Heard lhe atirou uma garrafa de vodka, que quase lhe cortou o dedo, deixando "o osso à vista". O guarda-costas Travis McGivern aumentou a ladainha de alegações de atos violentos, contando que viu Heard atirar uma lata de Red Bull às costas do ator e a cuspir nele também.

Esta é apenas uma lista parcial de ataques violentos graficamente descritos durante três dias de depoimento, apresentada pelos advogados de Depp, com Depp indicando que às vezes teve de se defender de Heard.

Este testemunho foi ainda reforçado por uma psicóloga, Shannon Curry, contratada pelos advogados de Depp, que examinou Heard durante 12 horas. Ela concluiu que Heard sofre de um distúrbio de personalidade borderline e de um distúrbio de personalidade histriónica.

Um distúrbio de personalidade borderline, disse Curry, "parece ser um fator preditivo em mulheres que exercem violência contra o parceiro." Quanto ao distúrbio de personalidade histriónica, os sintomas mostram "drama e superficialidade", disse.

A equipa jurídica de Heard responderia mais tarde às afirmações de Curry com testemunhos da sua perita, uma psicóloga forense, Dawn Hughes, que já tinha dito que a atriz tinha sido sujeita a violência sexual por parte de Depp e acreditava que Heard tem transtorno de stress pós-traumático como resultado do alegado abuso.

Quando Heard foi depor, depois de os advogados de Depp terem concluído o caso, o seu comportamento contrastou marcadamente com o do Depp. Ela estabeleceu contacto visual com os jurados e os seus interrogadores, derramou lágrimas e, por vezes, sorriu com intervalos regulares, exibindo abertamente uma série de emoções.

Depp, por outro lado, parecia fazer a maior parte do seu contacto visual com um monitor ligado ao banco de testemunhas, muitas vezes murmurando e raramente mudando o seu tom de voz ou exibindo qualquer tipo de emoção. Depp quase parecia estar a interpretar uma das suas singulares personagens de filmes em vez de si próprio.

Heard contou uma história particularmente angustiante de Depp ter rasgado as suas roupas e a ter submetido a uma "busca na cavidade" por drogas durante umas férias com amigos em 2013.

De acordo com o seu testemunho, o grupo de amigos tinha consumido cogumelos - "drogas para fazer rir", como Heard lhes chamou, e ela tinha ingerido um cogumelo - antes deste evento ocorrer. Ela disse que não tentou sair quando Depp terminou este ato particularmente vil ou quando ele destruiu o interior da caravana onde estavam numa fúria assustadora, embora ela descrevesse a sua angústia emocional. Em seguida, continuaram as férias no parque de caravanas com amigos.

Heard oscilou entre testemunhos de histórias em que Depp abusava dela com descrições do quanto o amava. Especialistas em casos de violência doméstica frequentemente testemunham que este não é um comportamento anormal para uma vítima de abuso. Em última análise, o júri tem de avaliar a relevância do comportamento em cada caso individual.

Avaliar as lágrimas das testemunhas pode ser particularmente difícil para os jurados em qualquer caso. Heard derramou umas quantas no seu depoimento, quando narrou as acusações sobre o alegado abuso sexual, físico e emocional de Depp contra ela. A questão que os jurados vão enfrentar é se as lágrimas e as exibições emocionais foram uma resposta autêntica e compreensível a um trauma e abuso infligidos reais ou "a interpretação de uma vida", como alegado pelos advogados de Depp.

Quando o caso for retomado a 16 de maio, é provável que dure pelo menos mais duas semanas, uma vez que tanto Depp como Heard procuram corroborar as suas alegações com testemunhas credíveis e outras provas. Podem ser esperados mais testemunhos e manchetes, causando danos substanciais e permanentes à reputação e carreira dos dois famosos atores. Ao contrário dos filmes de sucesso de ambos, o julgamento de um caso de difamação raramente tem um final feliz.

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