Paris 2024 começa oficialmente nesta sexta-feira com os atletas a desfilar de barco no rio Sena na cerimónia de abertura. Até 11 de agosto, mais de 10.500 atletas disputam 329 medalhas em cenários icónicos da cidade, mas também do outro lado do mundo. Portugal assume a ambição de igualar as quatro medalhas de Tóquio, a melhor participação de sempre, nuns Jogos que acontecem num ambiente de grande tensão geopolítica global, mas que pretendem ser uma enorme festa
Dezenas de barcos a deslizar pelo Sena, lá dentro os atletas, centro do espetáculo que se prolonga paras as margens do rio. Paris 2024 começa com uma cerimónia de abertura única, a partir das 18h30 desta sexta-feira. Será a primeira de sempre ao ar livre, um evento ambicioso e rodeado de secretismo que é também um enorme desafio de segurança, nuns Jogos Olímpicos onde esse é tema central. Mas que prometem oferecer ao mundo uma festa inesquecível.
Quando o presidente francês, Emmanuel Macron, declarar abertos os Jogos da XXXIII Olímpiada, estará oficialmente em curso, até 11 de agosto, a 30ª edição do maior acontecimento desportivo do planeta, aquele que de quatro em quatro anos junta os melhores atletas do mundo. O único onde é possível ver LeBron James encabeçar a delegação dos Estados Unidos como porta-estandarte, lado a lado com perfeitos desconhecidos para a generalidade do público.
Serão mais de 10.500 atletas, em representação de 206 nações. Vão lutar por 329 medalhas em 32 modalidades, com apenas uma estreia em relação a Tóquio 2020 – o breaking, misto de desporto e dança urbana com raízes no hip hop, onde Portugal estará representado.
Dos portugueses aos palcos das competições, das estrelas às principais datas, das controvérsias às questões de segurança, o Maisfutebol deixa aqui um guia para Paris 2024. Que comecem os Jogos.
Os portugueses
Estarão em Paris 73 atletas portugueses, a competir em 15 modalidades, e pela primeira vez há mais mulheres (37) do que homens (36). É a delegação mais curta desde Sydney 2000, um número que se explica também pela ausência de qualquer modalidade coletiva, objetivo assumido que foi falhado. Mas é uma delegação com um nível médio alto, um dado que os responsáveis portugueses têm sublinhado, assente no estatuto de atletas como o campeão olímpico Pedro Pichardo, que defende o título no triplo salto, o multicampeão Fernando Pimenta, que procura tornar-se o primeiro português medalhado em três Jogos Olímpicos, ou os campeões do mundo João Ribeiro e Messias Batista, também na canoagem, Diogo Ribeiro, na natação e Iúri Leitão, no ciclismo de pista, ou ainda campeãs da Europa como a lançadora Liliana Cá, a nadadora Camila Rebelo e a atiradora Maria Inês Barros.
Portugal conta ainda com o já medalhado olímpico Jorge Fonseca, no judo, entre atletas que conseguiram lugares de destaque em Jogos anteriores e estão em Paris com ambições altas, como o skater Gustavo Ribeiro, as surfistas Yolanda Hopkins e Teresa Bonvalot, a ciclista Maria Martins ou o mesatenista Marcos Freitas. Há ainda outros atletas que chegam aos Jogos com lugares de pódio a nível mundial ou com posições cimeiras nos rankings das suas modalidades, como a nadadora Angélica André, o triatleta Vasco Vilaça, a judoca Catarina Costa, a saltadora Agate de Sousa, a b-girl Vanessa Marina ou o ginasta Gabriel Albuquerque, que compete nos trampolins e é aos 18 anos o mais jovem da comitiva nacional. A mais velha é a mesatenista Fu Yu, que tem 45 anos. A delegação, que tem o atletismo como modalidade mais representada (22 atletas) junta juventude e experiência – a marchadora Ana Cabecinha, que foi mãe em maio e será porta-estandarte ao lado de Fernando Pimenta, vai para a sua quinta presença olímpica, tal como a canoísta Teresa Portela e os mesatenistas Marcos Freitas e Tiago Apolónia.
Nuns Jogos que tiveram critérios de qualificação mais apertados, e mesmo com algumas baixas de peso, como as lesionadas Patrícia Mamona, medalhada em Tóquio, e Auriol Dongmo, além da judoca Telma Monteiro, bronze em 2016 e que falhou uma sexta presença recorde, o potencial da delegação permite manter os objetivos assumidos pelo Comité Olímpico de Portugal no contrato-programa assinado com o Governo em 2022 – quatro pódios, 15 posições até ao oitavo lugar, correspondentes a diploma, e 36 até ao 16º lugar. Isso significa igualar Tóquio 2020, os melhores Jogos de sempre para Portugal, com a conquista de quatro medalhas que elevaram para 28 o total do país, em mais de cem anos de história olímpica.
Conheça aqui os 73 atletas portugueses, veja o calendário completo da participação nacional e recorde aqui muitas das suas histórias menos conhecidas, contadas por eles.
As estrelas
Os Jogos ainda não voltaram a ter estrelas do nível de Usain Bolt e Michael Phelps, que se despediram em 2016, mas há muitos candidatos a cimentar a sua lenda. Desde logo a ginasta Simone Biles, de volta ao seu melhor nível depois de ter deixado o mundo em choque em Tóquio, quando desistiu de várias provas em nome da sua saúde mental.
Também há, claro, uma nova Dream Team norte-americana no basquetebol, que inclui LeBron James, Stephen Curry, Kevin Durant, Jayson Tatum ou Joel Embiid. E que terá pela frente uma aposta forte da anfitriã França, liderada pelo fenómeno Victor Wembanyama.
Na natação não faltam atletas consagrados, com as atenções centradas no mano a mano entre os Estados Unidos, que têm em Caeleb Dressel e Katie Ledecky os cabeças de cartaz, e uma Austrália cada vez mais forte, liderada pelas multi-medalhadas Emma McKeon, Ariarne Titmus e Kaylee McKeown. Também a França tem uma aposta forte no jovem Léon Marchand, que bateu o recorde mundial de Michael Phelps nos 400m estilos.
No atletismo, o primeiro destaque óbvio é o sueco Armand Duplantis, que domina o salto com vara a seu bel-prazer, batendo sucessivos recordes do mundo. Na velocidade, os favoritos são os campeões do mundo de 100m e 200m, os norte-americanos Sha’Carri Richardon e Noah Lyles, mas estas são distâncias sem um rei indiscutível, como provou o italiano Marcell Jacobs, campeão olímpico nos 100m em Tóquio e que estará de volta em Paris. Há grandes eventos em perspetiva na pista do Stade de France e um deles será seguramente o concurso do triplo salto. Além de Pedro Pichardo, tem mais dois atletas de origem cubana de grande nível, o espanhol Jordan Díaz, que bateu Pichardo nos Europeus com o terceiro melhor salto da história, e Andy Diaz, que acaba de garantir nacionalidade italiana. E ainda Lázaro Martínez, que compete por Cuba, o jovem prodígio jamaicano Jaydon Hibbert e o campeão do mundo em título Hughes Fabrice Zango. Como disse Pichardo, o campeão olímpico de Paris terá provavelmente de bater o recorde do mundo, que ninguém atinge há 29 anos – os 18.29 metros alcançados pelo britânico Jonathan Edwards em 1995.
No torneio de ténis, que tem Roland Garros como palco e volta a jogar-se em terra batida pela primeira vez desde Barcelona 1992, há grandes nomes a seguir, apesar da desistência de Jannik Sinner, o número 1 do mundo. Desde logo os veteranos Novak Djokovic e Rafa Nadal, mas também o bicampeão olímpico Andy Murray, que terminará a carreira no torneio de pares. E há a grande expectativa de ver Nadal a fazer dupla com Carlos Alcaraz, o novo fenómeno do ténis espanhol e mundial, no torneio de pares. Também o ciclismo tem um elenco forte, mesmo depois do abandono de Tadej Pogacar, contando com nomes como Mathieu van der Poel, Remco Evenepoel ou Wout van Aert.
No futebol, se o torneio masculino não é tradicionalmente uma constelação de estrelas, no feminino elas estão lá todas. Desde logo na Espanha, que se estreia em Jogos Olímpicos com a equipa que foi campeã do mundo, liderada por nomes como Aitana Bonmati ou Alexia Putellas. Mas também do Brasil, que conta mais uma vez com a «rainha» Marta, aos 38 anos a disputar os seus sextos Jogos Olímpicos.
Os momentos-chave
Haverá campeões olímpicos logo ao fim da manhã de sábado, dia 27. O tiro e os saltos para a água distribuem as primeiras medalhas, num dia em que há decisões finais também para quatro portugueses – Catarina Costa, no judo, Gustavo Ribeiro, no skate, e os ciclistas Rui Costa e Nélson Oliveira, no contrarrelógio.
Quanto às modalidades mais populares dos Jogos, a ginástica artística decorre de 25 de julho a 4 de agosto e a natação de 27 de julho a 4 de agosto, enquanto o atletismo começa a 1 de agosto e só termina no último dia, 11 de agosto. A final dos 100m masculinos, um dos momentos altos dos Jogos Olímpicos, será a 4 de agosto e as maratonas estão reservadas para o fim – a 10 de agosto a mais longa distância masculina e no derradeiro dia a prova feminina.
A final do torneio de futebol masculino será a 9 de agosto, um dia antes da final feminina. O basquetebol masculino tem o jogo decisivo a 10 de agosto, enquanto o torneio feminino decidirá a última medalha de ouro dos Jogos Olímpicos de Paris, a 11 de agosto. Depois, haverá apenas a cerimónia de encerramento, a partir das 19h, já no Stade de France.
Os palcos
Paris recebe pela terceira vez os Jogos Olímpicos – a última foi há cem anos, em 1924 - e fez questão de se apresentar em estilo, levando o desporto aos principais pontos turísticos de uma das cidades mais icónicas do mundo.
A torre Eiffel serve de cenário ao improvisado estádio do voleibol de praia, no Champ de Mars, com o pavilhão onde decorrerão as competições de judo também ali ao lado. A Place de La Concorde está transformada em parque urbano para receber o skate, o breaking, o BMX e o basquetebol 3x3.
As provas de ciclismo de estradas atravessam os principais pontos turísticos da cidade, tal como o triatlo, com a Ponte Alexandre III como base. A prova de natação do triatlto, bem como a competição de natação de águas abertas, serão no Sena, se a poluição do rio não estragar os planos. O Grand Palais foi restaurado e recebe a esgrima e o taekwondo, a partida das maratonas será frente ao Hotel de Ville e a chegada nos Invalides.
A Arena de La Defense foi transformada em piscina olímpica para acolher a natação, os imponentes jardins do Palácio de Versalhes recebem as provas de hipismo e pentatlo moderno, o ténis será em Roland Garros.
Na verdade, os Jogos vão muito para lá de Paris. Vão até ao Taiti, a mais de 15 mil km de distância, onde decorrerá a competição de surf. Além disso, o futebol joga-se em vários estádios pelo país, a vela decorre em Marselha e o tiro em Chateauroux, a mais de 300km de Paris.
As controvérsias e a segurança
Não estarão em Paris a Rússia nem a Bielorrússia, suspensas desde a invasão da Ucrânia em 2022. No meio de muita incerteza, o Comité Olímpico Internacional admitiu a presença de atletas desses países, mas com muitas restrições, desde logo tendo como condição que não apoiem a guerra. Apenas estarão em Paris 16 bielorrussos e 15 russos, 31 atletas que competirão como atletas neutros individuais, sob a sigla AIN.
A guerra na Ucrânia já tinha tornado mais premente a questão da segurança, reforçada com o recrudescimento do conflito Israel-Hamas e todas as implicações geopolíticas que ambos os conflitos envolvem. Houve quem defendesse a exclusão total de atletas russos, houve também vozes a questionar a presença de Israel, cuja delegação é sempre alvo de cuidados especiais de segurança desde o atentado de Munique em 1972, mas que serão seguramente redobrados em Paris.
É um momento global particularmente instável e tenso, numa cidade que já se mostrou, nos últimos anos, vulnerável a ataques terroristas. Está montado um sistema de segurança de enormes dimensões, que envolve mais de 50 mil elementos, entre polícia e militares franceses e também forças de autoridade estrangeiras, com ligação direta às várias delegações nacionais.
A tudo isto juntam-se ameaças de greves e protestos sociais a coincidir com os Jogos. E ainda.a situação política em França, ainda sem Governo nomeado depois das eleições legislativas-relâmpago convocadas por Macron, que deram a vitória à coligação de esquerda.
Em termos de orçamento, estimado em 9 mil milhões de euros, os Jogos Olímpicos de Paris pretendem apresentar-se como um bom exemplo, com menos custos do que edições anteriores. Mas não escaparam a polémica, com muitos franceses a contestarem o investimento, as derrapagens nas contas e, sobretudo, as inúmeras restrições impostas à vida quotidiana em Paris.
Também há dúvidas sobre a forma como o sistema de transportes parisiense irá responder à presença estimada de 15 milhões de visitantes, e se as próprias deslocações de atletas não serão afetadas, uma preocupação já manifestada nomeadamente pelo presidente do Comité Olímpico de Portugal.
Outra das controvérsias em torno dos Jogos é a poluição no Sena. Desde 1923 que os banhos estão interditos no rio que atravessa Paris e as dúvidas sobre a qualidade das águas persiste, mesmo depois de muitos esforços das autoridades francesas para limpar o rio, construindo nomeadamente um enorme reservatório para tratamento das águas, e de a presidente da câmara de Paris, Anne Hidalgo, ter cumprido na semana passada a promessa de nadar no rio, para provar que era seguro.