Este casal partiu com o seu amado cão numa viagem de mota pelo mundo. Então, a tragédia atingiu-os

CNN , Tamara Hardingham-Gill
8 jun 2023, 10:00
Stu

O mundo está cheio de histórias extraordinárias. Eis uma

A paixão deles por viagens foi um dos temas principais de conversa durante o seu primeiro encontro em 2004.

Mas, além de "alguns cruzeiros", Janell e Stu Clarke, ambos da Austrália, viajaram pouco para fora do país nos dez anos seguintes.

Quando Janell obteve em 2009 a carta para conduzir mota, e após alguma persuasão de Stu - que já era motociclista há muito tempo -, começaram a fazer viagens de mota pela Austrália com o seu cão Skyla e estavam ansiosos por ampliar os seus horizontes.

"Eu tinha tentado fazer uma viagem só com uma mochila quando tinha 18 anos mas era muito jovem", diz Stu, que anteriormente trabalhava como engenheiro na marinha australiana. "Sempre foi algo que eu realmente queria fazer. Estava à espera que o meu compromisso com a Marinha terminasse."

A viagem definitiva

Quando Stu deixou a Marinha em 2014, o casal - são marido e mulher desde 2009 - decidiu que não só era finalmente hora de sair e ver o mundo mas de vê-lo "de uma só vez".

Segundo Janell e Stu, uma das principais razões pelas quais escolheram fazer uma viagem prolongada foi o custo dos voos de ida e volta para a Austrália.

"Calculámos que assim que saíssemos da Austrália era melhor ficarmos ausentes pelo maior tempo que pudéssemos pagar", explica Stu. "É tão caro sair da Austrália."

Embora inicialmente tivessem planeado viajar durante seis meses, isso foi estendido para 18 meses e depois dois anos enquanto faziam planos.

Havia um pequeno problema. Ambos não suportavam a ideia de deixar Skyla para trás por tanto tempo.

Quando o casal investigou a possibilidade de levá-la, rapidamente perceberam que "não era tão impossível como outros nos tinham levado a acreditar" e começaram a fazer preparativos para uma volta ao mundo com o seu cãozinho.

"Todo o planeamento estava relacionado com a Skyla", explica Stu. "Tínhamos os documentos de importação preenchidos para ela poder entrar em todos os países que tínhamos intenção de visitar. Queríamos ter a certeza de que ela estaria completamente salvaguardada."

Mas, à medida que a sua épica jornada de moto se aproximava, os Clarkes ficaram arrasados quando o seu amado animal de estimação foi diagnosticado com cancro.

Embora isso tenha sido sem dúvida um grande contratempo, Skyla recebeu quimioterapia, fez um transplante de medula óssea e eventualmente foi considerada saudável o suficiente para fazer a viagem.

"Embora as probabilidades estivessem contra ela, tínhamos todas as razões para acreditar que podia viver uma vida plena, feliz e saudável", diz Janell, engenheira civil.

Em fevereiro de 2014, voaram da Austrália para Dallas, Texas, nos EUA, onde começaram a sua viagem.

O casal comprou duas motos no Texas: Janell escolheu uma BMW F650GS de 2006 e Stu optou por uma G650GS de 2012.

"As motos são caras na Austrália", explica Janell. "E ainda há o custo do transporte. Então fazia sentido comprar as motos quando começássemos a nossa viagem."

Partiram com as suas motos novas em março, com Skyla a viajar confortavelmente ao lado deles numa transportadora de cães que eles mesmos projetaram para atender às necessidades dela.

"Ela era a nossa maior preocupação", acrescenta Janell. "A nossa principal preocupação antes de partirmos era garantir que ela estava confortável."

Caninos a bordo

Enquanto viajavam em direção ao México, Janell e Stu tentaram deixar o stress da doença de Skyla para trás e concentrar-se na enorme jornada que tinham pela frente.

No entanto, algum tempo depois de cruzarem a fronteira com o México, descobriram que o cancro de Skyla tinha voltado e que pouco podia ser feito dessa vez.

"Então, a única opção que tínhamos era usar medicação para quimioterapia e passar o máximo de tempo possível com ela, dando-lhe a melhor qualidade de vida que pudéssemos", explica Janell.

Continuaram pela América Central, atravessaram Belize, Guatemala, El Salvador, Honduras, Nicarágua e Costa Rica, onde cruzaram a fronteira com o Panamá.

Ao chegarem ao Panamá, pegaram uma balsa para a América do Sul para evitar ter que colocar Skyla numa caixa para um voo. À medida que entravam no continente, a condição de Skyla piorava e o casal preparava-se para o inevitável.

"Estávamos rodeados de pessoas que estavam  fazer a o melhor possível para nos ajudar a cuidar da Skyla", diz Janell. "Mas nos sentíamo-nos muito distantes de casa naquele momento. Foi um momento difícil."

Quando Skyla morreu na Venezuela a 10 de setembro de 2014, o casal ficou tão devastado que considerou voltar para a Austrália.

"Eu só queria ir para casa", admite Janell. "Parecia que tudo tinha acabado. Eu estava realmente a sentir-me muito mal."

Decidiram tirar um tempo e fizeram uma caminhada até às montanhas da Venezuela para "se afastarem de tudo" e dar a si mesmos tempo para refletir.

"Tudo o que tínhamos de fazer era carregar as nossas mochilas e caminhar, sem pensar muito", acrescenta Janell. "Foi uma maneira realmente adequada para lidar com a tristeza."

Após a caminhada, tiraram mais algumas semanas para processar as coisas antes de decidirem continuar.

Nova perspetiva

No entanto, a perspetiva deles sobre a viagem tinha mudado completamente naquela altura e Janell e Stu, que estavam a contar num site tudo o que lhes estava a acontecer - The Pack Track -, prometeram abordar o que faltava da viagem de uma maneira muito diferente.

"Depois de perdermos a Skyla decidimos que iríamos diminuir o ritmo", diz Stu. "Decidimos focar-nos na nossa relação porque o cancro da Skyla teve um impacto no nosso relacionamento - e não tínhamos uma data para o fim da viagem."

Pouco antes de deixar a Venezuela, o casal decidiu visitar novamente o veterinário que tratou Skyla durante os últimos dias de vida da cadela e perguntaram se podiam conhecer Weeti, uma cadela que doou sangue durante os tratamentos de Skyla - que precisou de transfusões.

"Quando dissemos 'olá, Weeti', o veterinário perguntou 'vocês querem adotá-la?' e nós respondemos 'sim'", conta Janell sobre a decisão de acolher a cadela - que tinha uma deficiência. "Não pensamos muito, o que foi um pouco louco."

Deixaram a Venezuela e continuaram pela América do Sul, "indo até o sul". Ao passarem pela Colômbia em agosto de 2015, resgataram uma segunda cadela, Shadow.

"Ela apareceu na estrada à minha frente", diz Stu. "Eu passei por ela mas o carro atrás de mim passou por cima dela."

Quando voltou para verificar o que tinha acontecido ao animal, Stu percebeu que a cadela ainda estava viva. A seguir perguntou a quem via se a cadela tinha dono.

Ao descobrir que ela aparentemente fazia parte de um grupo de cães abandonados, Stu e Janell colocaram a cadela ferida junto com Weeti na sua transportadora de cães e seguiram para Bogotá, onde a levaram a um veterinário.

Embora inicialmente tivessem planeado encontrar um novo lar para Shadow na capital colombiana, eles foram informados de que isso era improvável devido ao grande número de cães abandonados na cidade e ela "não teria muitas hipóteses" de sobrevivência se a deixassem para trás.

"Ela é tão pequena", diz Janell. "Então pensámos 'bem, já estamos  viajar com uma cadela, adicionar um cachorrinho não seria tão mau assim'."

Alguns meses depois estavam no Equador e a seguir regressaram aos Estados Unidos - apanharam um cruzeiro de luxo para o Reino Unido. Escolheram o Queen Mary 2 (QM2), o único navio no mundo que permite que os animais de estimação viajem com seus donos.

Expansão da família

Após uma viagem de sete dias até à cidade de Southampton, no Reino Unido, eles voltaram novamente às motos, seguiram para o continente europeu e entretanto foram para Marrocos antes de viajarem para a África Ocidental e chegarem ao extremo sul de África.

"África foi muito desafiadora para nós", admite Stu. "Foi duro. Mas olhando para trás, é um dos nossos momentos marcantes."

O casal seguiu mais tarde para o Egito e dali regressou ao Reino Unido.

Mas depois de passarem alguns meses a viajar pela Europa em 2020, a pandemia de covid-19 atingiu duramente o continente e Stu e Janell foram forçados a ficar num único lugar.

"Ficámos presos em Portugal até junho ou julho", diz Stu. "Não foi terrível, mas desacelerou-nos."

À medida que as restrições da pandemia começaram a ser suspensas, conseguiram retomar a viagem e passaram meses "a pular pela Europa", evitando grandes cidades o máximo possível devido à pandemia, que ainda estava a espalhar-se rapidamente por vários países.

Após outra viagem de regresso ao Reino Unido - quando "as coisas pioraram com a covid" -, seguiram para o leste europeu.

Os Clarkes adotaram a sua terceira cadela resgatado, Azra, quando ela atravessou a estrada na frente deles enquanto estavam na Turquia em dezembro de 2021.

"Caminhei até à vila com ela para ver se alguém a reconhecia ou se havia uma mãe por perto", explica Janell.

Quando não conseguiram encontrar um dono, o casal perguntou a um agricultor local se ele aceitaria o animal, mas ele não estava disposto a isso.

Em vez de deixar o cão "à beira da estrada", eles decidiram seguir para a próxima cidade e levá-la a um centro de resgate.

No entanto, foram informados de que a cadela tinha um vírus altamente contagioso e o veterinário que a tratava só continuaria a fazê-lo se eles a adotassem.

Agora, depois de saírem da Austrália com um cão, Janell e Stu estão a preparar-se para terminar a viagem quase 10 anos depois, agora com três cães completamente diferentes.

"Todos eles são negros e são fêmeas", diz Janell.

Os desafios

Tiveram de permanecer na Turquia cerca de três meses para obter toda a documentação necessária para continuar a viagem com Azra.

"Ter cães desacelera-nos", explica Janell. "Temos de pensar no bem-estar deles. Então é preciso diminuir um pouco o ritmo da viagem."

Além de se moverem a um ritmo um pouco mais lento, viajar com três cães pode causar problemas quando se trata de encontrar um lugar para ficar e há várias atividades que eles não conseguiram fazer, como visitar museus.

"Temos de pensar neles o tempo todo", diz Stu. "Pensamos neles quando vamos ao WC, quando paramos para beber água. Pensamos se o alojamento é adequado para animais de estimação e se os quartos em que estamos hospedados são confortáveis para eles. Isso também está presente."

Mas ambos enfatizam que nunca sentem que estão a perder algo ao viajar com as suas "meninas".

Na verdade, ter Weeti, Shadow e Azra ao lado deles durante a viagem trouxe um enorme conforto, especialmente agora que estão na estrada há tanto tempo.

"Quando nós os dois saímos e as deixamos num quarto de hotel, ao voltar abrimos a porta e é como se estivéssemos a chegar a casa", diz Stu. "Há três caudas a abanar à espera de nos ver."

O casal lançou há alguns anos um pequeno negócio para vender transportadoras de cães ajustadas para motas, direcionadas para cães de porte pequeno a médio.

Agora, perto do fim da sua viagem de quase uma década, Janell e Stu, que estavam no Sudeste Asiático na altura da escrita desta viagem, viajaram 240.000 quilómetros e atravessaram 108 países de mota.

O casal está atualmente a preparar-se para enviar as suas motas para os Estados Unidos, onde Janell e Stu vão passar alguns meses a reunir a documentação necessária para regressarem à Austrália no início de 2024 com os seus cães.

Infelizmente, as regras relativas à entrada de animais de estimação na Austrália mudaram desde que eles partiram, pelo que Weeti, Shadow e Azra têm de passar 30 dias em quarentena em vez de 10, que era o requisito anterior a março.

O casal escolheu voar dos Estados Unidos para que eles e os seus animais de estimação pudessem viajar a seguir diretamente para a Austrália.

Embora Janell e Stu, que esperam escrever uma série de livros sobre as suas viagens no futuro, digam que não têm planos definitivos  além desse ponto, há uma coisa que estão determinados a fazer quando estiverem de volta à Austrália.

"Queremos percorrer a Austrália porque nunca fizemos isso de mota", diz Janell. "Acho que seria uma forma agradável de terminar a viagem."

"Fazer uma volta ao nosso próprio país com as meninas nas motas e depois reformar. Reformar as motas e reformar as meninas."

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