Ivo Rosa avança com reclamação junto de Amadeu Guerra após Ministério Público ter recusado acesso aos processos arquivados

24 out, 13:12
Ivo Rosa

Esta é a segunda vez este mês que Ministério Público manda para trás requerimentos apresentados pelo juiz desembargador para aceder aos três processos

O juiz Ivo Rosa confirma à CNN Portugal que já avançou com a reclamação junto do Procurador-Geral da República, Amadeu Guerra, depois de o Ministério Público ter recusado o acesso ao magistrado a três processos já arquivados em que se viu envolvido.

O pedido de Ivo Rosa surge como reação a uma notícia da CNN Portugal, que dava conta que o juiz desembargador tinha sido investigado num inquérito-crime durante três anos, entre 2021 e 2024, por suspeitas de corrupção.

Ivo Rosa discorda da decisão do Ministério Público e diz que a justificação para a consulta "é muito simples": "Sendo visado na investigação e tendo sido praticados atos de inquérito restritivos dos meus direitos fundamentais, como é o caso do acesso a metadados, é mais do que evidente o meu interesse em consultar o processo", explica Ivo Rosa.

Na apreciação de recusa do acesso assinada pelo Procurador-Geral Adjunto José Ribeiro de Albuquerque, a que a CNN Portugal teve acesso, é referido que Ivo Rosa “não comprovou o interesse legítimo [da consulta], limitando-se a alegá-lo indiretamente por referência genérica ao artigo 90.º do Código de Processo Penal”. 

José Ribeiro Albuquerque destaca que o pedido de consulta de Ivo Rosa “deve estar assente na alegação e prova ou demonstração de uma necessidade, utilidade ou funcionalidade concreta do requerente conexa com a consulta requerida”, sendo que esta justificação de ser “suficientemente relevante/ponderável”. “O que significa dar a saber o ‘para quê’”, pode ler-se na apreciação.

A decisão sobre o pedido de acesso aos três processos arquivados cabia ao Ministério Público, porque é o titular do processo e que este nunca chegou a passar da fase de inquérito.  Tal decisão cabe, por isso, ao Ministério Público que, neste caso, é representado por um procurador-Geral Adjunto por estar em causa um juiz desembargador.

"Os dados conhecidos desta história não deixam os cidadãos tranquilos, independentemente de quem é visado"

O advogado Pedro Duro considera que "é verdade que quem não é sujeito processual deve revelar o interesse legítimo na consulta do processo", mas lembra que não conhece o requerimento do Sr. Dr. Ivo Rosa. "No entanto, considerando a matéria de conhecimento público, vejo com muita dificuldade qualquer recusa", reitera penalista.

"Sustentá-la com formalismos não é defender o Estado de Direito - tarefa que também cabe ao Ministério Público. Neste caso, o interesse legítimo do visado em atos de investigação é público e notório, sendo desnecessária qualquer frase mágica para o justificar. É evidente, de perceção natural e, por isso, de ciência oficiosa, que um visado de diligências invasivas deve poder escrutinar os atos processuais para perceber se os seus direitos foram respeitados e, se entender que não foram, promover o que considerar pertinente, designadamente no foro disciplinar", aponta Pedro Duro, acrescentando que perante o sucedido fica uma certeza: "Os dados conhecidos desta história não deixam os cidadãos tranquilos, independentemente de quem é visado".

Decisão "ilógica, ilegal e incompreensível"

Também o advogado Rogério Alves se mostra contra a decisão de vedar o acesso de Ivo Rosa ao inquérito. "Salvo o sempre devido respeito por opinião diversa, entendo que a decisão (...) é ilógica, ilegal e incompreensível". E para o comentador da CNN a explicação para esta opinião é simples: "um cidadão foi denunciado, investigado, vigiado e ilibado. Tem todo o direito de saber, de fonte oficial e sem mediação da comunicação social, quem o denunciou, porque foi investigado e em que moldes foi vigiado. O interesse legítimo é óbvio e notório", sublinha, lembrando que Orwell dizia que às vezes é preciso um esforço para ver o óbvio. Assim sendo, prossegue Rogério Alves, "que se faça esse esforço, pondo de parte interpretações de leis e diretivas num quadro draconiano de exigência que não albergam nem toleram. Por acaso a pessoa em causa é juiz desembargador. Mas isto vale para seja lá quem for".

José Ribeiro Albuquerque é o mesmo procurador-geral-adjunto que arquivou o inquérito-crime relacionado com suspeitas de corrupção, peculato e branqueamento de capitais - concluindo que a denúncia original “não tinha qualquer sorte de credibilidade”, como avançado pelo jornal Expresso esta sexta-feira.

Nesse despacho final, o procurador ordenou a destruição dos autos, o que, segundo Expresso, ainda não aconteceu.

Ivo Rosa foi responsável pela pronúncia da Operação Marquês em 2021, tendo deixado cair uma série de crimes de que o ex-primeiro-ministro José Sócrates estava acusado.

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