(um artigo para quem tem medo que o ChatGPT destrua empregos) Até pode ser que a inteligência artificial nos liberte para funções melhores

1 mai 2023, 18:00
ChatGPT (AP)

Se as funções de rotina e as coisas chatas ficarem para a inteligência artificial, então as atividades criativas ficam para os humanos. Como assim?

Ferramentas como o ChatGPT intensificaram o debate sobre o papel da inteligência artificial (IA) no mercado de trabalho, mas a verdade é que esta tecnologia já está presente há vários anos no dia-a-dia dos programadores, através de ferramentas que sugerem quais os passos mais prováveis a incluir no código, por exemplo. No entanto, houve uma recente evolução da IA que a tornou mais visível.

Com o ChatGPT, esta tecnologia passa a ser acessível a todos, sendo apenas necessário saber ler ou escrever para a utilizar. Mas os alarmes tocaram: a IA vai substituir as pessoas? Afinal de contas, o ChatGPT tem capacidade para passar nos exames dos cursos de Direito e Gestão de prestigiadas universidades norte-americanas. Ainda assim, há quem defenda que esta tecnologia vai criar empregos ou garantir mais tempo livre para outro tipo de tarefas.

João Magalhães, cofundador da Academia de Código, bem como Miguel Baltazar, vice-presidente de developers na OutSystems, rejeitam em declarações à CNN Portugal que ferramentas como o ChatGPT acabem com a necessidade de programadores. No entanto, defendem que a IA vai acabar com a mão humana nos processos rotineiros e menos criativos.

João Magalhães e Miguel Baltazar são perentórios: a IA não vai substituir os programadores. O cofundador da Academia de Código sugere que a IA servirá antes para facilitar o trabalho dos programadores e permitirá que estes se dediquem a áreas cada vez mais complexas e criativas. No entanto, ferramentas como o ChatGPT não devem ser vistas como infalíveis, pois o seu resultado nem sempre é 100% correto, sublinha.

Já Miguel Baltazar aponta que mesmo com a IA a tornar-se cada vez mais sofisticada, cabe aos programadores perceber se as suas sugestões vão ao encontro dos objetivos. O vice-presidente de developers na OutSystems acredita que esta evolução traz um aumento da capacidade dos programadores mas não os substitui.

“Estes modelos dão aos programadores informação que já existe, não havendo nada de criativo no seu output mas sim uma combinação de informação anterior”, destaca Miguel Baltazar. Neste sentido, defende que todo o trabalho de criação de novos programas e funcionalidades terá sempre de ser feito por humanos.

Por outro lado, a IA vai aumentar a produtividade e obrigar a que o programador perceba ainda mais sobre programação, refere Miguel Baltazar, garantindo que uma pessoa sem conhecimentos não pode criar algo com qualidade através desta tecnologia.

Quais as skills a desenvolver?

A mão humana continuará a ser valorizada, mas passa a haver um maior ênfase noutro tipo de qualidades. O responsável da OutSystems defende que capacidades como a análise crítica, conhecimento e entendimento das bases e conceitos vão ser cada vez mais reconhecidas. Em paralelo, os programadores devem ainda ter a capacidade de validar o que é criado, bem como saber o que querem fazer.

Neste sentido, Miguel Baltazar garante já haver empresas à procura de pessoas capazes de olhar para algo criado pela IA que consigam dizer o que está mal ou deve ser melhorado. Por outro lado, há um menor foco no desenvolvimento de soluções de raiz. “O que se espera dos programadores é que não apresentem o mais comum mas sim o mais diferente.”

João Magalhães, por sua vez, diz que as empresas vão recrutar para funções mais criativas, não relacionadas com tarefas de rotina. Sublinha ainda que devem ser desenvolvidas competências relacionadas com a IA, aliadas a uma formação contínua em programação, mas também em competências humanas como a colaboração e o trabalho em equipas diversas. Isto é, equipas compostas não exclusivamente por programadores.

Esta procura por competências mais diversas vai aumentar a diversidade do sector, tornando-o mais equitativo, defende Miguel Baltazar, já que estas funções se podem tornar mais atrativas para as mulheres. Além disso, continua, a procura por programadores vai aumentar, já que com estas evoluções os profissionais podem fazer mais e ter um impacto maior.

Ensino tem de ser ajustado à realidade

Embora o cofundador da Academia de Código veja a IA como uma oportunidade para criar um ensino mais completo e eficaz, o ChatGPT já foi confrontado com o currículo da instituição e as conclusões não convenceram. João Magalhães destaca que o output da ferramenta é pouco complexo e com baixa profundidade, não respondendo ao nível de exigência esperado. Como tal, refere que a IA é apenas um aliado da educação, uma ferramenta útil para ajudar os alunos a encontrar respostas, mas não a aceita ainda como uma resposta final.

“Exigimos que os nossos alunos vão mais além e acrescentem valor ao que é dado pela IA, bem como a coloquem sempre em causa. Isto porque ainda existem muitas lacunas na fiabilidade da resposta que estas plataformas apresentam”, refere João Magalhães.

Já Miguel Baltazar sublinha a necessidade de se ajustar o ensino da programação, de modo a que se centre na análise e interpretação, ensinando os alunos a compreender o que aplicam. “É preciso ensinar os humanos a fazerem o que a IA não consegue - encontrar padrões que não são os comuns e ao mesmo tempo, pegando em algo que é gerado pela IA, interpretarem e entenderem o contexto, a razão e a forma de analisarem o que é criado.”

Também neste âmbito, João Magalhães refere que se estão a alterar alguns dos processos na Academia de Código, tanto nos bootcamps como no próprio processo de candidaturas. Ao longo do processo de candidatura, explica, os alunos passam por questões teóricas e práticas que ficam agora facilitadas pela IA. Como tal, parte do processo foi reestruturado de forma a dar mais valor à própria análise e interpretação de resultados: “Assim os alunos deixam de apenas apresentar os seus resultados e exige-se também que os expliquem.” Vai mais longe e partilha mesmo que na Academia de Código também já se utiliza o ChatGPT no marketing, permitindo automatizar processos como na definição de palavras-chave para SEO (search engine optimization), criação de textos para redes sociais ou ainda na criação de anúncios digitais.

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