"Temos muita gente que trabalha, mas que não tem rendimentos para suportar as despesas": aumento do custo de vida faz crescer pedidos de ajuda

Agência Lusa , BCE
30 out 2022, 11:37

Pedidos de ajuda vêm de famílias da classe média e média-baixa com dificuldades em pagar a renda de casa, a prestação da casa, a luz, a água ou outras contas importantes e na iminência de ficar sem esses serviços ou sem abrigo

O aumento do custo de vida está a provocar uma maior pressão junto das instituições de apoio alimentar como a Cáritas, que ajudam cada vez mais pessoas com emprego, mas cujo salário deixou de chegar para as despesas.

A presidente da Cáritas, Rita Valadas, disse à Lusa que a ajuda está a ser procurada por pessoas de classe média e média-baixa, uma vez que “o rendimento dá cada vez para menos coisas”.

Rita Valadas afirmou que esta é uma crise que se caracteriza por “um aumento brutal do custo de vida” e que tem sentido um acréscimo das dificuldades para dar resposta às solicitações.

É que, aos novos casos, juntam-se os que já eram anteriormente acompanhados desde a pandemia e que não conseguiram deixar de viver sem este apoio.

“As pessoas que se aproximaram de nós devido à pandemia não chegaram a conseguir autonomizar-se, porque, quando estavam a conseguir reprogramar a sua vida, veem-se confrontadas com a dificuldade decorrente do aumento do custo de vida, das taxas de juro, e não têm condições para fazer essa retoma”, explicou Rita Valadas.

A presidente da Cáritas lembrou ainda que no período da crise social motivada pela pandemia, existiam moratórias e o ‘lay-off’, ao contrário das atuais “situações avulsas [como o pagamento único de 125 euros], que não resolvem a situação das pessoas senão pontualmente”.

Quem está mais próximo de se aproximar do limiar da pobreza é quem fica em maior risco de ter de recorrer a este tipo de apoios, concluiu.

“Quando o rendimento se altera, altera-se o risco, mas, quando a esse risco se acrescenta uma pressão do custo médio de subsistência, as dificuldades afetam pessoas que estão deste risco para baixo e o que antes um salário mínimo dava para pagar, hoje não dá, e os custos estão a subir e não sabemos quando vão parar”, sublinhou Rita Valadas.

Os que “batem à porta” da Cáritas, organização que trabalha em rede pelo país, têm dificuldades em pagar a renda de casa, a prestação da casa, a luz, a água ou outras contas importantes e na iminência de ficar sem esses serviços ou sem abrigo.

“Depois, a situação agudiza-se e traz outras necessidades”, acrescentou a presidente da organização, que distribui alimentação e também outros tipos de ajuda.

Primeiro, elencou, as pessoas começam por deixar de comprar determinados produtos que não são de primeira necessidade, depois passam a comprar marcas brancas, até que chegam ao momento em que, mesmo fazendo os cortes possíveis, “não têm como comprar o básico”.

Além das famílias, as instituições que fornecem alimentos no seu espaço ou ao domicílio “também estão a sofrer uma pressão enorme com o aumento dos custos dos bens”, referiu.

Rita Valadas mencionou a rede alargada pelo país e exortou quem quiser dar o seu contributo a procurar a Cáritas, as paróquias ou dioceses, que têm as suas estruturas de apoio, distribuição, respostas sociais e conseguem fazê-lo “em proximidade”.

A Cáritas apoiou no ano passado 120 mil pessoas, a pandemia levou a um aumento de “18 mil famílias a mais” e Rita Valadas estimou que este ano já tenha sido prestado auxílio a mais 20 mil pessoas, entre as quais muitas estrangeiras, sublinhou.

Cada vez há mais pessoas e instituições a precisar de ajuda, alerta CNIS

O presidente da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS), Lino Maia, alertou que o aumento dos preços está a levar a que mais pessoas e instituições precisem de ajuda para enfrentar a crise.

“Com a inflação galopante, com o aumento de custos, temos muita gente que trabalha, mas que não tem rendimentos para suportar as despesas e, portanto, há mais gente a precisar de apoio”, disse à Lusa Lino Maia.

As dificuldades são extensíveis às instituições, realçou, enumerando “os significativos” custos crescentes com a luz, gás, combustíveis, alimentação e as consequências da inflação em geral.

 “As instituições estão hoje com dificuldades acrescidas”, acentuou Lino Maia, defendendo que esta realidade seja considerada nas negociações com o Governo, porque “já havia um défice muito grande em muitas instituições, que agora aumenta”.

Nesse sentido, o presidente da CNIS sugeriu que o Orçamento do Estado contemple 0% de Imposto sobre Valor Acrescentado (IVA) na alimentação para instituições, medida que considera essencial.

Lino Maia disse que existem instituições que apoiam diretamente as pessoas, por exemplo as que recorrem a cantinas sociais, através dos acordos de cooperação, e as que têm ao seu cuidado utentes com reformas e rendimentos “insuficientes para comparticipar condignamente os custos e despesas das instituições”.

O presidente da CNIS defendeu, por isso, apoios diretos às pessoas e às instituições para fazer face às necessidades.

O dirigente destacou o papel das instituições e as dificuldades com que se deparam, muitas apresentando “ano após ano resultados negativos”, correndo o risco de deixar de prestar os seus serviços, cenário que é “imperioso contrariar”.

“Gostaria que fosse arquitetado desde já um programa de emergência para estas novas situações que vão surgindo” na sociedade, com o intuito de “contrariar o aumento da pobreza”, enfatizou.

Afirmou ainda temer que 2023 “seja um ano muito difícil”, tendo em conta que “os rendimentos não são suficientes para fazer face ao aumento do custo de vida”.

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