A taxa de inflação em Portugal voltou a desacelerar em julho, segundo o Instituto Nacional de Estatística. Mas isso não quer dizer que os preços fiquem mais baixos. Apenas estão a crescer menos. Ainda assim há produtos cujo preço está mesmo a cair. Saiba quais
A taxa de inflação em Portugal, apesar de algumas oscilações, tem vindo a desacelerar desde outubro de 2022 quando o ritmo de aumento dos preços atingiu um pico de 10,14%. Mas esta desaceleração não quer dizer que os mais diversos produtos tenham vindo a ficar mais baratos. Antes pelo contrário. Na maioria dos casos continuam a aumentar, mas a um ritmo menos intenso.
Os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) divulgados esta semana mostram, por exemplo, que a taxa de inflação voltou a abrandar em julho, passando de um ritmo de crescimento de 2,79% em junho para 2,53%. Estes dados, como explica o INE, medem “a evolução temporal dos preços de um conjunto de bens e serviços representativos da estrutura de despesa de consumo da população residente em Portugal”. Ou seja, o Instituto, com base nos dados que recolhe em variadas fontes, calcula qual é o padrão de consumo de bens e serviços tipo para as famílias portuguesas, calcula qual o peso de cada produto e serviço nesse cabaz e, a partir daí calcula a evolução desses preços, chegando a uma taxa de inflação.
Quando o INE calcula o IPC, faz esses cálculos através de um enorme conjunto de produtos. O IPC resulta de 12 classes de preços, cada uma com o seu peso no orçamento das famílias. Os bens alimentares e bebidas não alcoólicas, por exemplo, é uma dessas classes e tem um peso ligeiramente superior a 22%. É a classe com maior peso no IPC. A classe que se segue é a dos transportes, com um peso de 14,8%.
Estrutura de ponderação do IPC para 2024
Produtos alimentares e bebidas não alcoólicas 22,1%
Transportes - 14,8%
Restaurantes e hotéis - 10,4%
Bens e serviços diversos - 9,8%
Habitação, água, eletricidade, gás e outros combustíveis - 8,7%
Saúde - 6,8%
Acessórios para o lar, equipamento doméstico e manutenção corrente da habitação - 6,6%
Vestuário e calçado - 6,4%
Lazer, recreação e cultura - 6,1%
Bebidas alcoólicas e tabaco - 3,6%
Comunicações - 2,9%
Educação - 1,9%
Quando se olha para os dados desagregados desse cabaz de bens e serviços, verifica-se, no entanto, que a evolução dos preços é diferente.
As 12 classes de bens e serviços analisadas pelo INE são depois divididas num total de 145 grupos e subgrupos de produtos e serviços e os dados de julho mostram que desses grupos e subgrupos, apenas em 41 é que os preços efetivamente desceram face ao valor a que eram vendidos há um ano.
Analisando, por exemplo, a classe que mais peso tem para as famílias, a relativa aos bens alimentares e bebidas não alcoólicas, verifica-se que dentro desta há 13 grupos e subgrupos de produtos. E nestes 13 apenas em dois é que se registou uma descida dos preços face há um ano. No subgrupo referente à “Água mineral, refrigerantes e sumos de frutas e de produtos hortícolas”, em que os preços recuaram 0,5%, e o subgrupo das “Frutas” em que o recuo foi de 0,4%. E mesmo aqui não há certeza de que todos os consumidores tenham sentido esta descida de preços uma vez que os valores apresentados pelo INE correspondem a médias.
Ainda na classe dos bens alimentares e bebidas não alcoólicas, nos restantes grupos e subgrupos os preços continuaram a aumentar e nalguns casos o ritmo de crescimento até foi maior que o verificado no total do IPC. No subgrupo “Peixe, crustáceos e moluscos”, por exemplo, a subida dos preços ultrapassou os 5,5% e no subgrupo “Leite, Queijo e Ovos” a subida registou uma taxa de 4%.
Quando se olha, depois, para a Classe dos Transportes, dos 15 grupos e subgrupos que a compõem, verifica-se que houve seis em que registou mesmo uma descida dos preços, a mais significativa das quais no subgrupo das “Transportes aéreos de passageiros”, como o preço a recuar 7,5%. Em sentido contrário, dentro da classe dos Transportes, o destaque vai para o subgrupo “Transportes de passageiros por mar e vias interiores navegáveis” com os preços a subirem a um ritmo superior a 7,3%. Na classe dos transportes há ainda um caso, o do subgrupo dos “Transportes combinados de passageiros” em que a taxa de variação do preço se manteve inalterada.
Nota: Pode consultar a lista de todos os grupos e subgrupos de produtos no final do texto.
Esta subida e descida de preços é, como explica o economista Ricardo Ferraz, uma das marcas de uma economia de mercado. “Os preços dos bens e serviços variam ao longo do tempo. Uns descem e outros sobem, sendo que falamos em inflação quando se verifica um aumento generalizado dos preços”, explica o professor universitário, recordando que, em Portugal o indicador mais utilizado para medir a inflação é o Índice de Preços no Consumidor (IPC) “que tem por base um cabaz de bens e serviços que são considerados como sendo representativos do consumo das famílias portuguesas”.
O economista recorda que em outubro de 2022, a taxa de inflação medida pelo IPC foi de 10%, e que este número “significa, portanto, que o preço desse cabaz de bens e serviços (média ponderada de um conjunto de preços) aumentou 10% em outubro de 2022 face a outubro de 2021. E quando se disse, há poucos dias, que a taxa de inflação em julho foi de 2,5%, isto significa que esse cabaz estava 2,5% mais caro do que em julho do ano passado”. Isto é, prossegue o economista, “embora a taxa de inflação esteja a desacelerar, tal não é sinónimo de que esse cabaz de bens e serviços esteja a ficar mais barato, mas sim que o preço desse cabaz continua a aumentar, mas agora a um menor ritmo”.
Ricardo Ferraz lembra, por exemplo, que se analisarmos a evolução do preço do cabaz alimentar da DECO (composto por 63 bens essenciais), “vemos que está hoje 16 euros mais caro do que há um ano. E se compararmos com o início de 2022, vemos que está 40 euros mais caro”.
Ainda segundo o economista, os indicadores limitam-se a refletir o que todos sentimos no dia a dia: “as coisas estão bem mais caras do que num passado recente. Sentimos isso quando vamos aos supermercados, quando vamos aos restaurantes, etc.” Uma realidade que, aliado ao facto de também as prestações do crédito à habitação, para quem tem taxas variáveis, ter vindo a aumentar, leva o economista a concluir que não ficou “surpreendido com as notícias desta semana que relatam que este ano há menos portugueses a passar férias no Algarve”.
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