Modi na Ucrânia depois de estar na Rússia com o objetivo de "obter o melhor de dois mundos"

23 ago, 18:50
Modi e Zelensky

O caminho para a paz "terá que ser construído através da diplomacia, já que o tempo militar passou"

Interesses económicos acima de tudo. Esta é, na visão do major-general Isidro de Morais Pereira, a razão da visita do primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, à Ucrânia, apenas dois meses de ter feito uma viagem semelhante, mas à Rússia.

Isidro de Morais Pereira realça que a visita acontece "principalmente por interesses económicos, já que a Índia não quer perder o mercado nem da Rússia, nem muito menos do Ocidente", acrescentando que "a Índia, considerada a maior democracia do mundo, quer ter um papel neutro nesta guerra, para obter o melhor de dois mundos, de forma a não perder nenhum tipo de mercado como já aconteceu à China".

De relembrar que, desde a invasão russa à Ucrânia, 70% das empresas norte-americanas presentes em território chinês já abandonaram o país.

A Índia faz diferente, tentando jogar com os dois lados. Prova disso é o facto de ter ultrapassado a China e ter passado a ser o maior importador mundial de petróleo russo.

Nova Deli tem apelado consecutivamente a um cessar-fogo e à paz na Ucrânia, mas não se compromete com uma condenação da invasão russa. Esta ausência de posição pode ser justificada pela importância que a Rússia desempenha no fornecimento de armas e na ajuda que tem desempenhado no estreitamento de relações com a China, mas não só.

Isidro de Morais Pereira apresenta outra justificação: "A Índia nunca condenou de forma pública a guerra na Ucrânia, pois nunca foram utilizadas armas maciças durante a invasão, ou seja, armas capazes de matar um maior número de pessoas como as armas nucleares nucleares ou químicas. Caso isso acontecesse, a Índia teria adotado outra atitude".

Ainda assim, a Ucrânia acredita que, com esta visita, pode ser possível desenhar um caminho para a paz, algo que para o major-general acredita que pode ser possível. "Esta é um esperança fundada para Zelensky, já que a Rússia depende principalmente de dois importantes aliados: a China e a Índia. Obviamente que se Putin perder algum desse apoio ou sentir-se pressionado, poderá repensar esta guerra", nota.

Índia quer vencer o "jogo de oportunidade"

Para o major-general Agostinho Costa "o que estamos a ver é uma nova Guerra Fria 2.0, embora não seja igual à anterior porque a tutela das partes não é tão grande. Por exemplo, a União Soviética tinha uma tutela sob os seus satélites que a Rússia hoje não tem".

Com visitas ao Vietname e à Coreia do Norte ainda este ano, Vladimir Putin tinha como objetivo mostrar que a Rússia não estava sozinha. Ainda assim, depois de todas as sanções de que tem sido alvo, o apoio não é muito e depende dos poucos aliados que ainda restam, e a Índia poderia ser uma ajuda crucial embora nunca tenha tomado uma posição sobre a guerra. 

Para Agostinho Costa, a Índia beneficia agora de ser considerada a maior democracia do mundo e tenta aproveitar o "jogo de oportunidade para desempenhar o papel de mediador". Segundo a contagem feita pela Organização das Nações Unidas, desde 2023 que a Índia ultrapassou a China em tamanho de população.

O comentador da CNN Portugal considera que a visita de Modi tem um objetivo claro que não o económico: "Ser um país neutro que pode negociar com ambas as partes para alcançar um acordo de paz, sobretudo através de pressões que pode fazer à Rússia, já que favorece da proximidade que têm. Zelensky também saberá perfeitamente disso pela forma como recebeu Modi em Kiev".

O último membro dos BRICS capaz de desempenhar o papel de mediador

A par de grandes países como a Rússia, o Brasil ou a África do Sul, a Índia integra o grupo dos BRICS - cujo objetivo passa pela cooperação económica e pelo desenvolvimento conjunto dos membros. Muitos desses já se ofereceram como mediadores do conflito, mas sem qualquer sucesso.

Agostinho Costa acredita que a Índia "olhou para uma janela de oportunidade de ser o último membro ainda capaz de chegar a um consenso entre as partes, tal como beneficiar de fatores importantes como a relação económica que tem com a Rússia e, dessa forma, alcançar o objetivo de se afirmar frente à China, um antigo inimigo". Através desse possível papel no entendimento entre ambas as partes, a Índia pretende ser vista como "uma grande potência mundial como os Estados Unidos, a China e a Rússia, que são capazes de definir as linhas da política externa e as relações internacionais".

Depois de dois anos de conflito armado, Agostinho Costa acredita que o caminho para a paz "terá de ser construído através da diplomacia, já que o tempo militar passou", acrescentando ainda que "esperar e adiar esse entendimento só vai beneficiar a Rússia, já que tem a capacidade de produzir meios, enquanto a Ucrânia depende sempre do Ocidente".

É importante referir que o apoio do Ocidente pode ser incerto, tendo em conta que os Estado Unidos dentro de dois meses vão a eleições. 

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