Vento forte, temperatura elevada, humidade baixa: um "barril de pólvora" que pôs em risco habitações em Albergaria-a-Velha

16 set, 18:00

Mais rápido que os veículos dos bombeiros, o vento foi um fator-chave para o desenrolar de uma situação de catástrofe

Vento forte, temperaturas elevadas, humidade baixa - estes são os três fatores que tornaram o incêndio de Albergaria-a-Velha incontrolável, permitindo que esta manhã entrasse na localidade e atingisse algumas habitações, afirma Luís Araújo, comandante regional do Norte do Comando Nacional de Bombeiros.

"Quando a regra dos três acontece, é como se fosse um barril pólvora", confirma Paulo Severino, especialista em Proteção Civil, falando sobre um incêndio que provocou a morte a uma pessoa. "Basta uma faísca para começar um incêndio e depois a projeção de partículas incandescentes vai provocar novos focos de incêndio."

O comandante Emanuel Santos, vice-presidente da Liga de Bombeiros Portugueses, não tem dúvidas de que o facto de o fogo ter atingido as habitações é uma situação excecional causada, principalmente, pelos "ventos de leste, com rajadas muito quentes e fortes": "O vento é mais rápido do que os veículos dos bombeiros. Isto significa que as fagulhas são projetadas e essas projeções estão sempre a andar mais rapidamente do que nós".

Para além de fazer com que as chamas progridam de forma rápida, "o vento quente também faz com que a terra fique quente", diz Luís Araújo, sublinhando que neste momento a humidade dos combustíveis [a vegetação] está nos 30%, quando o normal seria 80%. A vegetação está demasiado seca e arte a grande velocidade.

Numa situação destas, quando, como aconteceu, é emitido um aviso à população, é muito importante que todos sigam as indicações. "Temos que levar isso a sério. Já sabemos que há uma alta suscetibilidade de acontecer um incêndio. E quando existe algum tipo de fonte de ignição - e na esmagadora maioria das vezes isto acontece devido a negligência humana (um cigarro, uma fogueira, uma máquina que não deveria estar ligada) - a probabilidade é muito maior", afirma Paulo Severino. 

Por fim, "o vento faz com que os fogos fiquem arranquem com muita força e fiquem descontrolados, no espaço e no tempo. Isso retira capacidade atuação aos bombeiros", explica Luís Araújo. "Meios aéreos também estão com muita dificuldade, por causa do vento e do fumo."

O risco agravado dos incêndios urbano-florestais

Este é um incêndio na "interface urbano-florestal", ou seja, incêndios que afetam zonas de transição entre a floresta e outras ocupadas e modificadas pela urbanização. Estes espaços e comunidades envolvidas pela floresta estão sujeitos a riscos agravados em caso de incêndios. As vegetações existentes entre as habitações são "combustíveis finos, que ardem muito mais rapidamente do que a floresta", explica Luís Araújo. 

O facto de haver pequenos aglomerados populacionais e casas isoladas na mancha florestal; e a desertificação das zonas do interior, com a consequente falta de manutenção dos espaços rurais são também fatores que contribuem para um maior risco de incêndio florestal. 

Por isso, diz Emanuel Santos, um dos problemas é a falta de limpeza junto às habitações: "Normalmente as câmaras pedem para essas limpezas serem feitas até 15 de maio. Quando isso não é cumprido, o risco é muito maior."

Incêndios urbanos são mais difíceis de combater

O objetivo dos bombeiros é a proteção de vidas, de bens e depois da natureza. "Esta é a sebenta do bombeiro. Sempre que houver população ou habitações em risco, essa é a nossa prioridade", explica Emanuel Santos. Neste momento, temos "muitos incêndios ativos e todos estão a entrar em áreas urbanas", por isso estamos a viver um momento complicado, afirma.

Quando o fogo entra numa localidade, o combate tem de ser diferente. "O combate a um incêndio urbano precisa sempre de mais meios porque há que proteger as habitações, há muito mais solicitações", explica Luís Araújo.

Mas, por outro lado, não são precisos os veículos com tração, específicos para andar na zona florestal. Os veículos urbanos são, de uma maneira geral, mais novos e têm mais capacidade de água. 

"Quando os fogos ficam descontrolados são de difícil combate ou até mesmo impossíveis de combater em segurança", diz Luís Araújo. "Resta-nos fazer a proteção das pessoas e dos bens, neste caso das habitações."

"A maior preocupação é que os bombeiros se revessem porque as corporações locais já estão a ficar cansadas. Os bombeiros dão sempre o máximo, não há nenhum bombeiro que vire as costas à luta, mas é preciso parar, se não ficam exaustos", alerta Emanuel Santos. "Incêndios desta envergadura obrigam a uma movimentação de bombeiros de todo o país e isso está a acontecer. Mas o país está quase todo em alerta vermelho e em qualquer altura pode acontecer um incêndio de grande gravidade, por isso não podemos deixar zonas desprotegidas.

Paulo Severino deixa ainda mais um alerta para a falta de bombeiros na maioria das corporações: "São cada vez menos e estão envelhecidos".

O que devem as pessoas fazer quando um incêndio atinge a sua casa?

O mais importante, afirmam os bombeiros, é que as pessoas sigam as instruções das autoridades e atuem em consonância com que o que os bombeiros estão a fazer. "Uma pessoa com um balde de água até pode ajudar, mas uma pessoa com um telemóvel a filmar só atrapalha", exemplifica Emanuel Santos.

"Não aconselho a população a fazer combate direto ao incêndio, porque se podem se magoar. Esse trabalho deve ser feito pelos bombeiros", afirma o comandante. Já na altura do rescaldo, a população onde ajudar a vigiar eventuais reacendimentos e até pode ajudar a extinguir esses pequenos reacendimentos, impedindo que ganhem dimensão. "Mas é preciso trabalhar com segurança e não correr riscos. Nada justifica a perda de vidas", alerta Emanuel Santos.

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