O regresso dos Imagine Dragons a Portugal foi recebido com uma excitação que não tardou a passar a espanto: o bilhete mais barato para o concerto da banda de Las Vegas no Estádio da Luz é de 90 euros. Mas há bilhetes VIP - que "esgotam", garantem os promotores - a ultrapassar os seis mil euros. Quem organiza estes espetáculos diz que é cada vez mais "arriscado" trazer grandes nomes da música e aponta o dedo aos artistas por não adaptarem os preços à realidade do público que os assiste
Comecemos pelas contas: no último concerto em nome próprio que os Imagine Dragons deram em Portugal (em setembro de 2018 na ainda Altice Arena), o bilhete mais barato custava 36 euros. A banda de Las Vegas regressa a Portugal no próximo ano e o bilhete mais barato para assistir ao concerto no Estádio da Luz é de 90 euros, na bancada do terceiro piso. Falamos de um aumento de 150% para o bilhete mais barato e de 216% para o bilhete ‘não VIP’ mais caro (que passou de 59 euros para 155 euros). Mesmo quem opte pelo bilhete ‘mais em conta’, a realidade é que custa 11% do salário mínimo português.
Álvaro Covões, diretor-geral da Everything is New, promotora que irá trazer os Imagine Dragons a Portugal, reconhece que este é “um negócio de alto risco” e que as promotoras portuguesas tentam sempre “trazer para baixo” o preço dos bilhetes, adaptando-os o mais possível à realidade portuguesa. No entanto, apressa-se a dizer que “não podemos olhar para um determinado artista e achar que os custos deles sempre iguais”. E diz-nos isto quando falamos do aumento de 36 euros para 90 euros no preço mínimo do bilhete para Imagine Dragons, comparando o valor cobrado há seis anos com aquele que irá ser aplicado no próximo ano. Em 2022, a banda de Dan Reynolds tocou no festival NOS Alive, o custo preço do bilhete diário era de 69 euros e no mesmo dia foi possível ver também nomes como Da Weasel, Haim, Parcels, Phoebe Bridges e Two Doors Cinema Club, entre outros.
Mas os preços para ir ver Imagine Dragons à Luz não são caso único: nomes como Harry Styles e The Weeknd, ambos com bilhetes a começar nos 81 euros, e Taylor Swift praticaram preços semelhantes nos últimos concertos dados em Portugal, valores que as próprias promotoras criticam por não se adequarem à realidade salarial portuguesa.
Nuno Braamcamp, promotor da Ritmos & Blues diz até que esta não é uma discussão de agora. “Já várias vezes disse, e inclusive tive o azar de dizer de um espetáculo meu, o da Madonna, que os bilhetes foram caríssimos. E tive de me redimir dizendo que não sou eu que marco o valor dos bilhetes, e não sou”, vinca. O bilhete mais barato para o concerto da rainha da pop era de 40 euros e o mais caro de 300 euros, havendo ainda um pacote VIP de 1.040 euros.
Um concerto já não se faz apenas de música. E isso paga-se
Segundo a informação que consta na newsletter da Everything is New, os bilhetes para a Loom World Tour dos Imagine Dragons começam nos 90 euros para os lugares com mobilidade condicionada e bancada no piso 3 do estádio. No relvado o custo é de 95 euros e na bancada do piso 0 sul de 120 euros. A bancada do piso zero tem bilhetes a 135 euros e a bancada do piso 1 a 155 euros. Todos estes lugares são marcados. No que toca aos pacotes VIP, os preços vão dos 281 euros (lugar em pé e não marcado) e 6.920 euros (também sem lugar marcado).
Nuno Braamcamp diz que os artistas estão mais “caros” e que são eles quem tem a “faca e o queijo na mão”, contando que não são assim tão raras as vezes em que as promotoras contestam os preços pedidos e a resposta é “não queres fazer, não faças, há quem faça”. E lamenta que as agências das bandas não analisem melhor os públicos. “Não podem comparar o salário mínimo alemão com o português. Os preços estão super inflacionados neste momento, estão a subir demasiado, não se justifica”, argumenta, confidenciando: “Ao fim de 37 anos, estou desiludido. As pessoas não entendem que o nosso poder de compra não é igual aos dos outros países.”
“O que se passa é que os artistas estão a pedir valores demasiado elevados. As principais agências de artistas, que têm os principais [músicos], marcam praticamente o valor dos bilhetes. Nós não temos esse poder”, esclarece ainda o promotor da Ritmos & Blues.
Apesar de os preços serem elevados e muitas vezes contestados, o certo é que os concertos de grandes artistas tendem a esgotar. Álvaro Covões diz que tal se deve, em parte, à “experiência”, ou melhor, ao facto de um concerto não ser apenas um concerto, ser agora uma “experiência”, dando como exemplo o espetáculo de três horas de Taylor Swift e os concertos em Coimbra dos Coldplay. E, garante, as pessoas pagam por “toda a experiência”. E essa experiência é também destacada por Luís Montez, organizador do Super Bock Super Rock, que considera que “os artistas, neste momento, vivem de concertos, não de discos, é um mundo inteiro a querer ver o mesmo artista”.
Mas luzes e foguetes à parte, um dos fatores que dita o custo total de um concerto é o local onde se realiza e os estádios acabam por ser os mais dispendiosos, mesmo levando mais público e diluindo, por isso, o custo total por cada espectador. No caso dos dois concertos da Taylor Swift, o Benfica terá encaixado um milhão de euros - e um relvado novo - à boleia dos dois espetáculos da norte-americana, segundo O Jogo.
“Um concerto de estádio não é comprável com um concerto de arenas ou coliseus ou clubes”, vinca Covões, dizendo que o preço dos bilhetes “torna-se elevado por um conjunto de circunstâncias, nomeadamente o custo de produção”, sobretudo em estádios. “As pessoas não sabem, mas o custo de substituição de um relvado é muito caro. Os estádios portugueses não foram feitos, como um de Madrid, para isto, em que o relvado sai.”
“O Estádio da Luz está uma fortuna”, destaca Luís Montez, que se apressa a dizer que há outros “custos” a entrar na equação de um espetáculo e que, depois, se fazem pagar, nem que seja em parte, no preço dos bilhetes. “Os custos com a segurança aumentaram, os geradores e os palcos aumentaram, todos os custos de infraestruturas também aumentaram. É natural que isso [preço dos bilhetes] acompanhe [estes aumentos]”, frisa Montez.
Também Álvaro Covões sublinha que “os custos de produção de agora não tem nada a ver” com os de outros tempos. “Existe um movimento mundial para fazer com que os espetáculos tenham um grande grau complexidade, no sentido positivo, e isso faz encarecer as tours [digressões]. Uma coisa é um artista sozinho num palco com uma viola, outra coisa é com 300 pessoas a trabalhar e com tecnologia”, aponta o diretor-geral da Everything is New.
Um negócio de "alto risco", mas que ainda rende
Tanto Braamcamp, como Covões e Montez dizem que este é um negócio de “alto risco”. “Só anda nisto quem gosta”, brinca o diretor-geral da Everything is New. Já Luís Montez prefere nem sequer arriscar: “É muito arriscado fazer este tipo de concertos, é cada vez mais arriscado, por isso é que prefiro fazer festivais”, diz-nos, explicando que neste tipo de eventos há um “orçamento” e que o poder de escolha e organização acaba por estar, sobretudo, na promotora e na empresa de organização e não tanto no artista.
Braamcamp admite que o negócio “ainda é rentável”, mas que é “muito difícil em Portugal pagar preços tão elevados por bandas, que não estamos a discutir se valem [esses valores] ou não, estamos a discutir se temos poder de compra ou não”. Mas “no fim”, tudo acaba por se vender, atira. “Quem acaba por pagar os bilhetes são os paizinhos.” E Braamcamp diz que até os pacotes VIP (que custam milhares de euros) esgotam. “Sei que a bebida e comida é de borla, mas como é possível esgotar?”, questiona.
Mas as promotoras ganham mais? Nem por isso. Para quem organiza, o lucro não é o maior, dizem. Oscila entre os 5% e os 15%, dependendo do artista.
“Podemos beneficiar da subida dos preços mas é mínimo. O promotor ganha percentagem sobre o lucro, sendo que a grande maioria é para o artista”, garante Braamcamp. E Montez corrobora: “Quando se contrata o artista para um concerto, o artista, para além do cachê, ganha os resultados dos concertos. 85%, 95% é para o artista.”