Uma noite não são noites. E a de 31 de dezembro renova a esperança, num setor onde o mês de dezembro ficou marcado por um revés: menos reservas e mais cancelamentos. A culpa, dizem os hoteleiros, está nos receios da nova variante. Enquanto o mundo se volta a fechar, os portugueses vão segurando o negócio
Imagine-se a entrar em 2022 num ambiente inspirado pelo agente secreto mais famoso do mundo. Bond, James Bond. Na mesa, iguarias como lavagante, trufa, vieiras ou “foie gras”. Em dose dupla, ao jantar e à ceia. A bebida, essa, sempre à discrição.
E, quando tocarem as doze baladas, um fogo de artificio que quase dispensa apresentações. Uma vista privilegiada sobre a Madeira, iluminada pelas cores de um novo ano. Imaginou este cenário? Se sim, saiba que tem um preço: 745 euros por pessoa, no Savoy Palace, no Funchal. Se não quiser voltar a casa, ou o álcool não recomendar, a noite de sono pode mesmo duplicar a fatura.
Mas se o seu plano de “réveillon” de sonho passa por um palacete renovado numa das colinas mais bonitas de Lisboa também há pacotes com tudo incluído. As preocupações ficam à porta do Torel Palace. Ao alojamento, junta-se o jantar de passagem de ano e o primeiro pequeno-almoço de 2022. O preço? 650 euros para duas pessoas.
Começar o ano em grande pode não ser para todos os bolsos. Mas nem isso tem afastado a procura. Para a noite em que todas as esperanças se renovam, as cadeias hoteleiras contactadas pela CNN Portugal dizem ter ocupações garantidas entre os 70 e os 100%. Sem descontos, apenas com ‘atenções’ no preço a quem reservou mais cedo.
Mesmo que a carteira não seja tão folgada como nos dois exemplos dados, quem quer experimentar um início de ano num hotel tem de estar disposto a investir. Nos grupos ouvidos, e já a pensar num cliente de perfil médio, os menus de jantar podem variar entre os 100 e os 200 euros. O quarto, para uma noite, pelo menos o mesmo.
A CNN Portugal pediu o contributo das cadeias Amazing Evolution, Bensaúde, Hóti, Montebelo, Natura IMB, PortoBay, Savoy Signature, Torel Boutiques e Unlock Boutique. Os cenários foram traçados antes das últimas restrições anunciadas pelo Governo a 21 de dezembro.
A variante estraga-festas
Ómicron: bastou que ela surgisse para, a nível mundial, voltarem a tocar as campainhas de alerta. Perante uma variante mais contagiosa, multiplicaram-se as novas restrições. E, com elas, os receios de quem viaja.
Nos hotéis portugueses, por muito animadora que seja a noite de “réveillon”, as contas ficaram subitamente mais difíceis de fazer. Não há, nas empresas contactadas, quem não tenha sentido os efeitos: menos reservas, mudanças de datas, cancelamentos.
“Sentimos alguma retração do mercado, especificamente no segmento de grupos estrangeiros, não só pelas novas medidas anunciadas, mas pelo impacto do surgimento da nova variante Ómicron”, conta Margarida Almeida, presidente executiva da Amazing Evolution.
Já Ingrid Koeck, sócia e porta-voz do grupo Torel Boutiques, confirma o cenário deste final de ano no setor: “o grande problema são as quebras de ocupação registadas durante o mês de dezembro, fruto das políticas restritivas à mobilidade observadas na Europa desde o final de novembro”.
Nos hotéis PortoBay, por exemplo, o presidente executivo António Trindade viu, em duas semanas, “quebrar as reservas existentes para o Natal e fim do ano em cerca de oito pontos percentuais”. De norte a sul do país, ilhas incluídas, os hoteleiros perderam um outro negócio importante nesta época do ano: as festas de Natal das empresas.
2021 foi melhor (mas ainda não chega)
Mesmo com o percalço da nova variante da covid-19, o setor está a conseguir cobrar valores acima do que praticou no período festivo de 2020. Em alguns casos, com subidas a dois dígitos. “Face a 2020 procedemos a um aumento dos preços base, visto que a procura é também superior ao ano passado”, justifica Bruno Freitas, presidente executivo da Savoy Signature.
À CNN Portugal, outras cadeias hoteleiras destacam que nos preços de 2021, além da procura, a subida visou responder a aumentos na própria operação: nas matérias-primas, na energia e nos salários dos trabalhadores, agora mais caros. Ainda assim, aliados à maior flexibilidade ditada pela pandemia, os descontos continuam a ser decisivos.
“Estamos a praticar políticas de cancelamento e, infelizmente, somos obrigados a promoções, muito embora os serviços sejam os mesmos e os custos mais altos”, reage Miguel Velez, à frente da Unlock Boutique Hotels.
Para chegar aos preços por noite anteriores à pandemia – de 2019, quando a hotelaria nacional vivia um período áureo -, o setor fala a uma só voz: o melhor será mesmo esperar pelo novo ano.
Brindar em segurança
Com a alta procura na última noite de 2021, e uma variante mais contagiosa na equação, ter mais gente reunida em clima de festa poderia ser um problema. Até porque álcool e distanciamento físico não costumam andar de braço dado. Os grupos hoteleiros ouvidos pela CNN Portugal dizem confiar nos seus protocolos internos de segurança, alinhados com as orientações das autoridades de saúde.
Para os quartos ainda por preencher, depositam as esperanças nas marcações de última hora dos portugueses. Por si mesmos, os nacionais com reservas feitas já mostraram que querem, o mais possível, fugir a confusões e ajuntamentos com desconhecidos. As unidades no campo, longe das maiores cidades, são as que estão com melhores desempenhos, dizem os empresários.
Além da cueca azul, para dar sorte, convém não esquecer o certificado de vacinação válido e o teste negativo antes de sair de casa. Ainda antes da decisão do Governo, já havia unidades - como os hotéis Torel Boutiques - a exigir o teste negativo, para garantir uma segurança ainda maior na hora de celebrar.
Tudo para evitar surpresas desagradáveis numa noite que se quer memorável, mas pelos melhores motivos.