Hospital das Caldas da Rainha paga quatro vezes mais à hora para garantir médicos nas urgências

15 jun 2022, 18:04
Saúde

Sindicato Independente dos Médicos considera esta situação "inqualificável" e acusa o Estado de "promover a desregulação e precariedade do trabalho"

O Hospital das Caldas da Rainha, que está a preparar as escalas do serviço de ginecologia e obstetrícia para este mês, terá enviado um e-mail interno no qual afirma que o valor pago à hora será de 95 euros. 

No comunicado a que a CNN Portugal teve acesso, a unidade hospitalar propõe dois turnos de 24 horas - 18 e 19 de junho - e os profissionais que estiverem disponíveis devem responder ao e-mail.

De acordo com a tabela salarial referente a 2022, que está disponível no site do Sindicato Independente dos Médicos (SIM), um chefe de serviço - o topo da categoria - que trabalhe num domingo ganha à hora cerca de 30 euros. 

Em declarações à CNN Portugal, o secretário regional do SIM do Algarve, João da Silva Dias, salienta que "este valor é quatro vezes superior ao valor habitual".

"Os valores têm sido sempre na casa dos 50, 60 euros, e em alturas críticas chega-se a valores como este. Com dois bancos de 24 horas, ganha-se mais do que qualquer médico que esteja durante o mês inteiro a fazer 12 horas incluídas no seu horário, em horário normal, de segunda a sexta-feira", explica.

Mas esta situação resulta de uma má gestão do Serviço Nacional de Saúde (SNS), explica João da Silva Dias. "O que é certo é que os hospitais não se importam de continuar a pagar aos médicos contratualizados quatro vezes mais do que aquilo que pagam aos médicos da casa. Depois os médicos da casa acabam por não se disponibilizar a fazer horas extraordinárias, porque veem os outros que estão ao lado a receber quatro vezes mais."

Afinal, quem paga estes valores?

O secretário-geral do SIM, Jorge Roque da Cunha, explica que estes 95 euros "têm um tratamento fiscal diferente", na medida em que só se paga IRC. Mas nesta balança o Estado acaba por ser o prejudicado, adverte João da Silva Dias, uma vez que "a empresa contratada pelo hospital para colocar médicos nesse dia poderá estar a receber entre 100 a 120 euros pelo serviço do médico".

Ora, só "depois de descontada a percentagem da empresa, é que o médico recebe os tais 95 euros por hora". Deste modo, continua, "o hospital investe nos médicos tarefeiros, em vez de atualizar a remuneração dos médicos de carreira."

"Se o hospital pode pagar às empresas e aos externos estes valores, porque razão não atualiza as tabelas salariais e porque não paga às pessoas da casa, fora do seu horário, esses mesmos valores para ter gente disponível para fazer urgências?", questiona o também diretor do serviço de Ginecologia e Obstetrícia do hospital de Portimão.

O resultado? "Uma debandada de médicos da função pública, que se tem vindo a acentuar com este tipo de comportamento", resume.

Para Jorge Roque da Cunha, esta situação não tem qualquer justificação. "É inqualificável como é que o Estado não se organiza e planeia. Não se percebe que o Estado promova a desregulação e precariedade do trabalho", lamenta Jorge Roque da Cunha.

A CNN Portugal tentou contactar o hospital das Caldas da Rainha e, até à publicação deste artigo, ainda não obteve qualquer resposta.

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