Escândalo no Santa Maria: diretor de Dermatologia demite-se

24 jun, 09:38

EXCLUSIVO: Paulo Filipe, que é também presidente da Sociedade Portuguesa de Dermatologia, será substituído no maior hospital do país por uma diretora interina

O diretor da unidade de Dermatologia do Hospital de Santa Maria apresentou a demissão, ontem ao final do dia, depois de ter sido confrontado com os resultados preliminares do relatório interno solicitado pelo presidente do Conselho de Administração às cirurgias adicionais, na sequência da investigação do Exclusivo da TVI (do mesmo grupo da CNN Portugal) aos gastos abusivos praticados por médicos daquela unidade aos fins de semana.

As chamadas cirurgias adicionais, criadas para diminuir as listas de espera, foram aproveitadas por vários dermatologistas do maior hospital do país para faturar milhares de euros.

O primeiro caso, e até agora o mais grave, envolve o médico Miguel Alpalhão, responsável pela codificação do serviço. Só este médico ganhou 400 mil euros em apenas 10 sábados. 50 mil num único dia.

Este médico operou os próprios pais e, em entrevista ao Expresso, depois de ter recusado sempre falar com a TVI, disse ter seguido todas as regras.

Só que Miguel Alpalhão estava longe de ser caso único.

Na passada sexta-feira, o Exclusivo noticiou um novo escândalo no serviço de dermatologia do Santa Maria.

A médica Rita Travassos registou a realização de cirurgias em seu nome, que foram afinal feitas por médicos internos, enquanto a clínica se encontrava num congresso em Itália, a mais de dois mil quilómetros de distância. Só em 2024, esta médica encaixou 113 mil euros em apenas sete sábados.

Em declarações à TVI, um dermatologista que solicitou anonimato, com medo de represálias descreveu desta forma a situação do serviço:

“Atualmente, a Dermatologia do Santa Maria é uma anarquia completa. O serviço está ao abandono. Temos uma urgência que funciona das 09:00 às 21:00. Todos os dias é garantida, na maioria, por médicos internos, médicos em formação que estão escalados sozinhos, sem qualquer apoio, sem qualquer supervisão, e são eles os responsáveis pelos doentes mais complexos”. Este médico explica ainda que são vários os colegas que entendem que os valores pagos por estas cirurgias são “obscenos”. “Algo não está correto e não faz sentido, tendo em conta a complexidade dos procedimentos que são feitos”, aponta.

Depois desta entrevista, emitida no sábado passado, o presidente do Conselho de Administração do Santa Maria chamou o diretor da dermatologia, Paulo Filipe.

Tal como a TVI já tinha também noticiado, foi ele que delegou em Miguel Alpalhão a responsabilidade de completar as escalas das cirurgias adicionais.

Em entrevista ao "Expresso", Miguel Alpalhão acrescentou também que apenas cumpriu ordens.

A TVI/CNN Portugal apuraram que Paulo Filipe foi confrontado com as irregularidades e colocou o lugar à disposição.

O presidente do Hospital, Carlos Martins, aceitou de imediato e prepara-se para nomear uma diretora interina durante a reunião do Conselho de Administração marcada para esta manhã.

Esta é a primeira baixa num caso onde são aguardadas várias consequências.

As primeiras ocorreram logo após a emissão da primeira reportagem do Exclusivo, a 21 de maio: envio do caso para a IGAS, suspensão das cirurgias adicionais ao fim-de-semana e várias auditorias internas.

Uma delas contribuiu decisivamente para o afastamento de Paulo Filipe da direção do serviço.

O relatório da auditoria extraordinária à produção adicional da Dermatologia concluiu pela existência de várias irregularidades graves.

A rede de cumplicidades no maior hospital do país

Paulo Filipe era, até ontem, o responsável pelo serviço de dermatologia do Santa Maria e quem aprovou as cirurgias adicionais ao sábado, porque tudo o que envolve este serviço hospitalar passava por ele.

Em simultâneo, Paulo Filipe é também consultor da Comissão de Farmácia e Terapêutica do Santa Maria, na área da dermatologia. Quer isto dizer que um médico que precise de um medicamento inovador faz um pedido a esta comissão, que, por sua vez, autoriza ou não a dispensa do fármaco na farmácia hospitalar e, como responsável, era Paulo Filipe quem decidia o que era ou não aprovado.

A TVI tentou contactar Paulo Filipe, mas até ao momento sem sucesso.

Apurámos, no entanto, que o clínico já contratou um advogado.

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