Ja Morant, em nome do pai e do filho

4 fev 2022, 22:51
Ja Morant

O base dos Grizzlies tornou-se, aos 22 anos, uma das maiores estrelas da NBA, a ponto de ter sido escolhido para o cinco inicial do All Star. O miúdo tem, aliás, uma história curiosa: por causa dele, o pai abandonou uma carreira promissora no basquetebol e tornou-se barbeiro. Por isso Morant vive o sonho dele e o sonho pai através dele.

A vida apareceu a correr na história de Ja Morant. De uma universidade pequena e sem tradição no basquetebol o base passou a segunda escolha no draft de 2019. Na estreia foi o rookie do ano e agora, na terceira temporada, foi escolhido para o cinco inicial do All Star Game.

Tudo começou a mudar numa tarde em que o assistente James Kane, da Universidade de Murray State, foi a um acampamento de basquetebol ver um miúdo em que estavam interessados. No intervalo de um jogo, enquanto procurava onde comprar comida, viu Ja Morant a jogar num campo de 3x3. James Kane ficou entusiasmado e ligou ao treinador Matt McMahon.

Perante o entusiasmo do assistente, a Murray State ofereceu uma bolsa a Ja Morant e convidou-o a ir jantar a casa do treinador Matt McMahon. Entretanto também surgiram convites de outras universidades, inclusivamente da South Carolina State, mas Ja Morant preferiu ir para o Kentucky.

«Qualquer pai quer que o seu filho jogue numa grande universidade, mas o que percebi é que não devemos ir para onde queremos, mas sim para onde nos querem», disse o pai no final do jantar.

Ora o pai, precisamente, é uma peça fundamental na história de Ja Morant.

Tee Morant foi também ele jogador de basquetebol. Chegou a ser colega de Ray Allen na universidade, por pouco não conseguiu entrar na NBA e recebeu convites para jogar no estrangeiro, quando a esposa descobriu que estava grávida. De Ja Morant, precisamente.

Tee teve de abandonar o sonho do basquetebol e ir para casa ajudar a mulher. Tornou-se barbeiro na pequena cidade de Dalzell, na Carolina do Sul.

A partir daí o pai projetou todos os sonhos no filho. O único filho rapaz que teve. Por isso se diz que, mesmo antes de saber o que era o basquetebol, Ja Morant já tinha um treinador.

Começou a treinar muito novo no quintal de casa com o pai, que o ensinou a fazer lançamentos de salto para trás e até comprou pneus de trator para ele praticar os saltos e ganhar impulsão. Tee Morant assumiu como missão de vida incutir mentalidade competitiva no filho, sem os defeitos mentais que prejudicaram a sua própria carreira.

«As coisas negativas que havia em mim, eu quis mantê-las longe dele, tais como sair à noite e tudo isso. Quis que ele se concentrasse no seu sonho. Eu não me concentrei a cem por cento no meu.»

A exigência do pai era tão grande que Ja Morant costuma dizer que ele foi o primeiro hater que teve na vida. Mas Tee Morant apenas não queria permitir que o filho ficasse satisfeito com a mediocridade. Ele sabia o que era preciso para chegar ao próximo nível: ao sonho da NBA.

«Eu sempre lhe disse que ele que ele não tinha feito nada. Se lhe perguntarem, ele vai lembrar que eu até o chamava de sobrevalorizado. Porquê? Porque queria mantê-lo com fome de mais.»

Foi essa fome de mais que lhe deu a motivação para não desistir quando, apesar de ser o melhor a nível liceal no país ano após ano, os convites das grandes universidades não chegavam. Ao ponto, aliás, se só ter surgido um, da South Carolina State, e mesmo esse não ter convencido o jovem, que preferiu seguir para um pequena e desconhecida universidade do Kentucky.

Na Murray State, o miúdo continuou a brilhar e conseguiu apurar uma universidade sem tradição para a NCAA. Foi convidado para a Elite Guard Camp, de Chris Paul, e no segundo ano já era considerado uma das cinco melhores escolhas para o draft. Foi a escolhido em segundo lugar, sem surpresa, pelos Memphis Grizzlies, depois de Zion Williamson, com quem tinha jogado numa equipa do liceu, ter sido eleito como primeira escolha pelos New Orleans Pelicans.

Num par de anos, o base deixou de ser um miúdo da pequena cidade de Dalzell, na Carolina do Sul, que frequentava uma pequena universidade como Murray State, para se tornar um milionário, com um contrato em torno de seis milhões de euros por temporada.

Curiosamente, e com o primeiro dinheiro que recebeu, foi comprar um carro de 60 mil euros para o pai. Uma forma de agradecer todo o empenho e dedicação do pai, que desde que Ja Morant começou a jogar basquetebol com seis anos, aliás, só falhou um jogo dele.

A chegada à NBA não foi, porém, o ponto final. Logo na primeira época, o base terminou com uma média de 17,8 pontos por jogo e 7,1 assistências, para ser eleito o rookie do ano.

Na segunda época conduziu os Grizzlies no regresso aos play-off, mas foi este ano que Ja Morant explodiu definitivamente. Tornou-se uma máquina de jogadas espetaculares, com uma impulsão absurda e um poder atlético fora do normal. Muito naturalmente foi escolhido para o cinco inicial da Conferência Oeste, ao lado de LeBron James, Nikola Jokic e Stephen Curry.

Ele que não tem, nem nunca teve, um ídolo na NBA. Apenas tenta jogar em nome do pai.

«É essa a minha motivação», disse Morant. «É como se eu estivesse a viver o meu sonho e o sonho dele através de mim agora.»

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