O que já se sabe, o que se desconhece, os sintomas a que devemos estar atentos e como prevenir
Começou por surgir no início de abril, com os primeiros casos a serem detetados no Reino Unido. Depois da identificação de um caso suspeito em Portugal (que acabou por se revelar um caso de gripe A), a Direção-Geral da Saúde (DGS) anunciou a 28 de abril a criação de uma ‘task force’ de “acompanhamento e atualização” do surto mundial de hepatite aguda de origem desconhecida em crianças.
Desde então, Portugal conta já com seis casos suspeitos e, de acordo com o Centro de Emergências em Saúde Pública, "todas as crianças que têm sido identificadas com casos suspeitos em Portugal têm tido uma evolução rápida e estão todas muito bem recuperadas". Na Europa e no resto do mundo já foram identificados pelo menos 300 casos suspeitos da doença, dos quais 10% necessitaram de um transplante de fígado. A OMS indica ainda que pelo menos uma criança morreu na sequência deste tipo de hepatite aguda.
O que já se sabe sobre a hepatite aguda infantil
Ainda se sabe muito pouco sobre esta doença que atinge crianças até aos 16 anos e cuja causa ainda é desconhecida. O Centro de Prevenção e Controlo de Doenças (ECDC) está a estudar a possibilidade de esta hepatite aguda infantil ser causada por um adenovírus que, de acordo Pedro Gomes de Sena, médico de medicina geral e familiar, “é um tipo de vírus que provoca habitualmente infeções respiratórias ligeiras” e alguns quadros de gastroenterite.
Na verdade, os adenovírus são um tipo de vírus com uma circulação muito frequente e que “não têm grandes particularidades nem causam patologias normalmente graves”, estando normalmente associados a constipações, explica à CNN Portugal o virologista Celso Cunha. “O facto de causarem este tipo de hepatites nas crianças é uma novidade porque o adenovírus não costuma causar uma doença hepática assim”, refere o médico do Instituto de Higiene e Medicina Tropical da Universidade Nova de Lisboa.
Uma vez que os adenovírus estão associados a doença ligeira, o médico Pedro Gomes de Sena considera que a maior gravidade da doença - “que nalguns casos [10%] avançou para a falência do fígado com necessidade de transplante” - poderá estar associada a um outro fator “que ainda não está identificado”.
Quais os sintomas a que os pais devem estar atentos?
Os principais sintomas da hepatite aguda infantil são geralmente quadros de gastroenterite, nomeadamente vómitos, diarreia ou perda de apetite. Mas, tendo em conta que estes quadros são frequentes em crianças, sobretudo nesta altura em que, de acordo com a médica Ana Sofia Baptista, estamos “a aproximar-nos do tempo por excelência das gastroenterites”, há dois sinais a que os pais devem estar particularmente atentos. “Quando estes quadros se arrastam podem desenvolver a icterícia [o tom amarelado da pele e dos olhos] e também alguma alteração da cor da urina e das fezes, isto é, fezes brancas e urina da cor do vinho do porto”, esclarece à CNN Portugal, acrescentando também que o facto de as crianças estarem “muito prostradas”, sem energia, pode ser também um “motivo de preocupação”.
Caso os pais verifiquem estes sintomas nas crianças, o pediatra Jorge Amil Dias, especialista na área da gastroentereologia, recomenda que contactem o médico assistente a indicar os sintomas e, mediante a avaliação do clínico, "combinar com o médico quando é o momento adequado para a criança ser observada".
Já perante “sinais de gravidade”, como é o caso de “criança com olhos amarelos, muito prostrada e a vomitar muito, pode fazer sentido ir à urgência”, acrescenta o especialista em declarações à CNN Portugal. No caso de dúvidas, Mariana Capela, pediatra no Hospital Lusíadas Porto, salienta que “ligar para a Saúde 24 é sempre uma via recomendada". "É importante dizer aos pais que, neste momento, não há nenhum tratamento específico para esta hepatite e, por isso, não vale a pena irem a correr para os hospitais quando a criança vomita ou tem febre", acrescenta.
Como prevenir?
Uma vez que a causa da doença ainda não é conhecida, também não é possível determinar a melhor forma de prevenção. Contudo, a médica Ana Sofia Baptista considera que “a transmissão provável aqui é fecal-oral”, logo é importante ter especial atenção à higiene das mãos e das superfícies - uma indicação que vai ao encontro da recomendação da DGS quanto “a medidas de higiene das mãos e a etiqueta respiratória”.
Uma vez que se trata de uma “hepatite de etiologia desconhecida”, a Organização Mundial da Saúde (OMS) garantiu que está a dar "prioridade absoluta" à investigação desta doença, que considera "muito urgente". Nesse sentido, o diretor regional para emergências daquela agência disse estar a "trabalhar muito de perto com o ECDC e com o Reino Unido, onde está a grande maioria dos casos", nomeadamente 145 casos suspeitos.
Em Portugal, a DGS já criou uma 'task-force', em articulação com o Programa Nacional para as Hepatites Virais e com a Sociedade Portuguesa de Pediatria, que tem como objetivo "acompanhar e atualizar a situação internacional, a avaliação de risco a nível nacional e a elaboração de orientações técnicas para a deteção precoce de eventuais casos que venham a ser identificados no país".