O fotógrafo que "embrulha" famílias inteiras e as suas casas em plástico

CNN , Oscar Holland e Yuki Kurihara
20 mar 2022, 22:00

Ter um retrato de família tirado por Haruhiko Kawaguchi vem com uma condição invulgar: o artista vai embrulhar a sua casa com plástico. De seguida, vai selar tudo a vácuo, num saco hermético. A partir desse momento, o fotógrafo de Tóquio tem apenas alguns segundos para captar as imagens de que precisa, antes de libertar os indivíduos sem fôlego.

As imagens surpreendentes, que Kawaguchi descreve como uma "fotografia que homenageia a família", fazem parte da sua coleção "Flesh Love". Esta série de fotografias, de quase duas décadas, é uma missão para explorar a intimidade humana. O artista consegue isso ao embrulhar as pessoas com plástico.

"Quando comecei esta coleção de fotografias, pedi a alguns dos meus amigos mais próximos para testarem quanto tempo poderiam suster a respiração. Então, descobri que conseguiam fazê-lo durante 15 segundos", disse Kawaguchi, através de uma videochamada a partir de Okinawa, Japão.

“Então, estabeleci uma regra de 10 segundos. Após esse tempo, independentemente de ter tirado ou não a fotografia, eu abro aquele embrulho”, explica.

Kawaguchi mandou fazer sacos de plástico de grandes dimensões para cobrir casas inteiras, incluindo árvores e veículos

O fotógrafo começou por captar imagens íntimas de casais presos dentro de sacos selados, que antes eram usados para guardar sofás, No entanto, as suas fotografias evoluíram bastante. Na sua mais recente instalação da coleção "Flesh Love All", vê-se o fotógrafo a embrulhar casais, famílias e os lugares mais importantes para eles com os sacos de plásticos feitos por medida. Por norma, os locais que o artista mais embrulha são as suas casas, árvores, carros e motas.

Ao utilizar o nome Fotógrafo Hal, uma referência ao computador que fala no filme "2001, Odisseia no Espaço", de Stanley Kubrick, o fotógrafo Kawaguchi disse que as suas fotografias retratam sobretudo o amor. Apesar de o seu foco ter mudado do tipo de fotografias com cariz sexual para o género familiar, o seu objetivo manteve-se o mesmo. O artista pretende mostrar a ligação humana nas suas variadas formas.

Kawaguchi disse: “As fotografias mais recentes contêm uma mensagem de ligação com o mundo exterior. Contudo, estas expressam o amor por tudo.” No entanto, o artista acrescenta: "Nós embrulhamos tudo o que se encontra em segundo plano. Assim, há uma representação da ligação social que as pessoas têm com o mundo exterior e não apenas consigo mesmas."

Para a sua coleção anterior, "Flesh Love Returns", Kawaguchi pediu aos casais para serem fotografados em lugares que tinham significado para eles. Créditos: Fotógrafo Hal

Kawaguchi reconheceu que algumas pessoas "se sentem claustrofóbicas" ao olhar para as suas fotografias. O artista está ciente de como é sufocante estar fechado num dos seus sacos herméticos, uma vez que ele próprio fez essa experiência.

"Quando eu estava naquela espécie de saco, senti que a minha vida e a morte eram completamente controladas por outros", disse ele. "De facto, eu sinto que as pessoas que fotografo me confiam as suas vidas.”

Quando dois se tornam um

A coleção remonta à fase em que Kawaguchi tinha 20 anos e era fotógrafo comercial. Na época, o artista tinha pouco tempo livre para produzir o seu próprio trabalho. Então, ele levava a sua máquina fotográfica para concertos e discotecas, onde fotografava jovens casais.

Ele disse: "Achei os casais muito atraentes enquanto indivíduos. Eles eram alegres, mostravam raiva, tristeza e felicidade. Ao observá-los senti, de igual forma, que havia uma relação entre a distância física e emocional nas duas pessoas.”

Quando encontrou voluntários entre os seus amigos e nos amigos destes, Kawaguchi começou a coleção "Flesh Love" como uma maneira de "visualizar a intimidade e o amor entre os casais”, disse ele. O artista trabalhou com as pessoas que ia fotografar, de forma a encontrar posições que eliminassem os espaços entre os corpos lubrificados e, por vezes, completamente nus, antes de remover o ar do embrulho com um aspirador.

Os embrulhos personalizados podem levar até duas semanas a serem feitos. Depois disso, organiza-se tudo numa única imagem. Contudo, a sessão fotográfica final requer a ajuda de cerca de sete pessoas. Em caso de emergência, um assistente está presente. Ele está sempre pronto para abrir ou cortar os embrulhos, caso o fotógrafo não possa fazê-lo. O artista mantém, de igual forma, um tanque de oxigénio por perto, bem como um “spray” para refrescar as pessoas durante as sessões fotográficas feitas no verão.

O fotógrafo disse que fazer encaixar casais é "como um quebra-cabeças". Créditos: Fotógrafo Hal

"Peço às pessoas que vou fotografar que ensaiem as suas poses. Depois, vão recriá-las quando estiverem embrulhadas", disse ele. O artista disse, de igual maneira, que isto era uma forma de "juntar os casais como se se tratasse de um quebra-cabeças".

Kawaguchi disse que se inspirou no livro “O Banquete", de Platão. Nesta obra, o filósofo disse que homens e mulheres já tinham sido seres unos, com quatro braços, quatro pernas e duas caras, antes de o deus grego Zeus os ter divido a meio.

"Embrulhar pessoas era apenas um subproduto", disse o fotógrafo. "O objetivo principal da minha arte é transformar duas pessoas que se amam num só ser.”

"Ainda não sei o que é o amor, mas não acho que seja apenas sobre a distância", acrescentou. "Surpreendentemente, às vezes sinto que as pessoas não parecem muito íntimas, embora os seus corpos estejam próximos. O oposto também acontece."

As suas primeiras fotografias eram feitas num estúdio. No entanto, na coleção "Fresh Love Returns", Kawaguchi fotografou os casais nas suas casas e noutros locais. O fotógrafo disse: “Noutra coleção, intitulada "Zatsuran", embrulhei os casais com os seus pertences, tais como: instrumentos musicais e bicicletas. Pareciam bonecos numa embalagem.” Como já embrulhou casas inteiras, o artista espera fazer algo de uma dimensão maior. Kawaguchi deseja embrulhar um parque inteiro. Ele acrescentou que espera, de igual modo, explorar "novos estilos artísticos.”

“Eu também estou a fazer uma coleção intitulada “'Washing Machines'", disse o fotógrafo. “Nestas fotografias, eu ponho as pessoas nas máquinas de lavar roupa".

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