O documentário da Netflix em que os duques contam por que motivo fugiram continua a causar divergências e estupefações
A história foi mesmo assim? Estão Harry e Meghan a inventar factos? Terá William gritado mesmo com o irmão enquanto a avó, a rainha Isabel II, assistia a tudo sem dizer nada? As informações dadas pelos duques de Sussex no documentário da Netflix são muitas e, como era esperado, dividiram opiniões. Mas, com o casal a viver na Califórnia, a divisão foi ainda mais visível. Com um oceano pelo meio, Harry e Meghan viram-se abraçados pelos EUA, o país que os acolheu assim que escolheram abandonar o Reino Unido - que, por sua vez e perante críticas à monarquia e à imprensa britânica, não tardou a responder.
Foi o caso de dois conhecidos do casal Sussex, Jeremy Clarkson e Piers Morgan, que não pouparam nas críticas. Colunista da direita conservadora, Clarkson escreveu na sua coluna no The Sun que "odiava Meghan Markle a nível celular" e que sonha com o dia "em que ela é obrigada a desfilar nua pelas ruas de todas as cidades da Grã-Bretanha enquanto as multidões lhe cantam, 'Vergonha!" (numa referência a um episódio da "Guerra dos Tronos" em que uma das personagens faz o walk of shame - nua e a ser gozada pela população). Morgan, que chegou a ser despedido por não se conter na maneira como se referia à duquesa de Sussex, chama a Harry "traidor frio ao seu país" e Meghan "vírus".
Mais tarde, ainda que não tenha pedido desculpas, Clarkson recuou nas suas declarações, que, de acordo com o The Guardian, refletem o que foi escrito um pouco por todos os meios de comunicação britânico. Mas a cooluna de Clarkson foi retirada do site do jornal.
Oh dear. I’ve rather put my foot in it. In a column I wrote about Meghan, I made a clumsy reference to a scene in Game of Thrones and this has gone down badly with a great many people. I’m horrified to have caused so much hurt and I shall be more careful in future.
— Jeremy Clarkson (@JeremyClarkson) December 19, 2022
A posição conservadora levou a que os americanos se questionassem se as reações não provariam que o que Meghan e Harry disseram no documentário é verdade, como foi o caso de Roxane Gay. Num tweet, a escritora que acompanhou a série para um artigo de opinião no New York Times afirma que "a forma como estes britânicos estão obcecados com Meghan Markle é selvagem" porque "sabem que tudo o que a Meghan e o Harry disseram no documentário é verdade".
The way these British folks are obsessed with Meghan Markle is wild. You just know every damn thing Meghan and Harry said in their doc was true. I would bet they held back. https://t.co/lC9GVnSiWa
— roxane gay (@rgay) December 17, 2022
Mas nem tudo foi ódio no Reino Unido. Ayesha Hazarika, jornalista que se tornou conselheira do governo, considerou que os duques de Sussex mostraram que representam uma nova geração que é oprimida pelo racismo disfarçado de valores tradicionais.
"Meghan e Harry tornaram-se a pouco e pouco num pára-raios para muita raiva de muitas destas pessoas que estão agarradas ao passado", afirmou à CBS News.
O esforço de Meghan reconhecido nos EUA
No documentário, Meghan recorda o momento em que abandonou o Reino Unido depois das comemorações do dia da Commonwealth a 9 de março de 2020 e, no avião, um membro da tripulação se ajoelhou ao lado do seu lugar, tirou o chapéu e lhe agradeceu "tudo o que fez" pelo o Reino Unido.
"Foi a primeira vez que senti que alguém viu o sacrifício, não pelo meu próprio país, mas por este país", afirmou a duquesa, acrescentando que assim que desembarcou no Canadá caiu nos braços de um dos seguranças do príncipe Harry a chorar. "Eu estava, tipo, 'esforcei-me tanto' e ele disse 'eu sei que o fez, eu sei que o fez, minha senhora, eu sei que o fez'. Esforcei-me tanto", acrescentou ela.
Meghan Markle garante que sentiu que deu tudo de si e que não foi suficiente. Bryndis Roberts, seguidora de longa data da família real, confessou à BBC que assistiu à série "de lágrimas nos olhos", tal como a ativista Salamishah Tillet, por a duquesa "se ter esforçado tanto" para se encaixar no molde real e não ter conseguido.
Mas a empatia com os duques também não chega à ala conservadora mesmo do outro lado do Oceano, onde comentadores como Megyn Kelly, do programa SiriusXM, apelidou Meghan "chorona e irritante" e acusa o casal Sussex de serem as "pessoas menos conscientes à face da terra".
"Enquanto ele desfila pela mansão de 14 milhões de dólares e 9 quartos em Montecito com jardins enormes, cocktails iluminados de branco e vista para a montanha do seu quintal de 7 hectares, Harry lamenta como tudo o que ele sempre quis foi esta 'vida normal'. Estas são as pessoas menos conscientes da terra".
As he prances around the $14m, 9-bdrm mansion in Montecito w/massive gardens, white lighted-cocktail parties & mountain views from his 7-acre yard, Harry laments how all he ever wanted was this “normal life!” These are the LEAST SELF-AWARE PEOPLE ON EARTH. #HarryandMeghanNetflix
— Megyn Kelly (@megynkelly) December 15, 2022
Uma posição seguida pela conservadora Alyssa Farah Griffin, apresentadora do The View e comentadora política da CNN, que afirmou que o casal não podia estar "realmente a sofrer", uma vez que vivem numa mansão de 30 milhões de dólares.
No entanto, Sunny Hostin, coapresentadora de Griffin no The View, contestou as declarações da colega, afirmando que Harry e Meghan "têm todo o direito de assumir a sua narrativa" porque "estão a sofrer".
IS THERE ANY COMING BACK FROM ROYAL RIFT? #TheView panel reacts to the latest episode of the docuseries #HarryandMeghanNetflix, where Prince Harry details a heated family meeting after the couple decided to step away from their royal duties. https://t.co/cVclFZQmjA pic.twitter.com/pUvCMvjWMb
— The View (@TheView) December 15, 2022
"Eles estão a sofrer e assumiram a sua narrativa e têm todo o direito de o fazer. Penso naquilo que passaram em termos de quão racista aquela família era contra a Meghan, em termos de quão racista aquele país era contra ela. Isso é algo com que o rei Carlos III pode lidar e pode cuidar - e que parece não ser capaz de o fazer", disse Hostin.
O documentário da Netflix teve dois volumes, nos quais Harry e Meghan contam como foram alvo de perseguição pela imprensa britânica, que invadia constantemente a privacidade da família, com a duquesa a ser alvo de racismo e discriminação. Depois da exibição dos seis episódios, Harry e Meghan foram alvo de críticas, acusados de criarem uma "narrativa distorcida" e de causarem "quebra de laços" com a família real.