Zelensky diz que "chegou a hora de falar". Moscovo diz ter "esperança" num acordo. Afinal, quão longe estamos da paz?

19 mar 2022, 13:46

Não é fácil avaliar os progressos que têm vindo a ser realmente alcançados entre as duas partes ao fim de tantas rondas de negociações. Mas, para o especialista em diplomacia Tiago Lopes, há um ponto que mostra como as negociações estão "um pouco mais atrasadas" do que o desejado

A entrar na quarta semana de guerra, o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse na noite de sexta-feira que "chegou a hora de falar" sobre a paz e segurança no país, advertindo Moscovo de que este diálogo é a sua "única hipótese de minimizar os danos causados pelos próprios erros" na invasão da Ucrânia.

Os negociadores de Kiev e Moscovo têm feito esforços nesse sentido - ou, pelo menos, assim o anunciam - com uma série de rondas de negociações para a paz a prolongarem-se por várias horas, em formato digital ou presencial. Ambas as partes dizem estar disponíveis para um acordo, com o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, a admitir ter "alguma esperança" nas conversações, e o presidente ucraniano a falar em negociações "mais realistas" nos últimos dias.

No início desta semana, o jornal Financial Times divulgou o que designou por "acordo de paz provisório" entre as partes, assente em 15 pontos, citando informações de três pessoas envolvidas nas negociações. Segundo a publicação, ambos os países teriam alcançado “progressos significativos” num plano que incluirá um cessar-fogo e a retirada da Rússia de território ucraniano, desde que Kiev declarasse a neutralidade e aceitasse a desmilitarização.

Porém, horas depois da divulgação desta notícia, o conselheiro do presidente ucraniano, Mikhailo Podolyak, que tem participado nas negociações, esclareceu através de uma publicação na rede social Twitter que aquele plano apenas diz respeito às posições apresentadas pela Rússia, garantindo que a Ucrânia não mudou a sua posição nem fez quaisquer cedências.

Troca de prisioneiros

Não é fácil, por isso, avaliar os progressos que têm vindo a ser realmente alcançados entre as duas partes ao fim de tantas rondas de negociações. Mas, para o especialista em diplomacia Tiago Lopes, há um ponto que mostra como as negociações estão "mais atrasadas" do que o desejado.

"É normal, neste tipo de processos em conflito que, a certa altura, para ganhar confiança entre as partes, se faça a troca de prisioneiros. A verdade é que isso ainda não foi negociado, que é sempre um primeiro sinal de que um eventual cessar-fogo poderá estar no horizonte", explica, em entrevista à CNN Portugal.

E há um ponto na agenda das conversações entre as duas partes que "será mais difícil de negociar", diz Tiago Lopes: "A questão da Crimeia. A Rússia quer normalizar a tomada [da Crimeia] de 2014. Vimos ontem [sexta-feira] as celebrações massivas dos oito anos dessa tomada. Para a Rússia é um ponto essencial e, para a Ucrânia, também."

Para o também professor da Universidade Portucalense, esta disputa pela região anexada em 2014 pela Rússia pode obrigar a uma "solução mais criativa", nomeadamente "um modelo federal ou um modelo de gestão conjunta", à semelhança do que acontece em Andorra, que é gerida em simultâneo por Espanha e França.

"O modelo federal parece ter voltado para a mesa negocial, mas há muita resistência do lado ucraniano para introduzir o modelo federal, porque lhes parece que estão a ser obrigados a entrar nesse modelo", explica o especialista.

Putin acusa Kiev de atrasar negociações

Na sexta-feira, o chanceler alemão, Olaf Scholz, pediu ao presidente russo que decretasse rapidamente um cessar-fogo na Ucrânia, numa conversa telefónica que durou quase uma hora, e na qual Vladimir Putin considerou que Kiev está a “arrastar” as negociações sobre o conflito e tem “exigências irrealistas”.

Os dois responsáveis abordaram “a guerra que continua a evoluir na Ucrânia e os esforços para lhe pôr fim”, segundo um comunicado do porta-voz do chanceler alemão, Steffen Hebestreit.

“Foi notado que o regime de Kiev está a tentar, por todos os meios, arrastar o processo de negociação, apresentando novas propostas irreais”, disse a presidência russa (Kremlin) num comunicado que visou resumir as declarações de Vladimir Putin a Olaf Scholz.

Quase em simultâneo, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, tinha o mesmo discurso de Vladimir Putin, afirmando que a Rússia estava pronta para negociações, mas que a Ucrânia parecia não demonstrar a mesma disponibilidade.

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