Sanções máximas para a Rússia, reconstrução da Ucrânia e os cinco mil milhões por mês. O que disse Zelensky aos ultra-ricos

23 mai 2022, 12:49

Presidente da Ucrânia interveio em Davos, no Fórum Económico Mundial, onde pediu um mecanismo preventivo para desencorajar invasões e sanções mais duras para Moscovo

O presidente da Ucrânia dirigiu-se esta segunda-feira aos mais poderosos e ricos do mundo, numa intervenção virtual no Fórum Económico Mundial, que voltou este ano a realizar-se presencialmente em Davos, na Suíça.

Apresentado por Klaus Schwab, o presidente executivo e fundador do Fórum, como um "corajoso líder" envolvido num conflito contra a sua vontade, Volodymyr Zelensky foi convidado a explicar como poderão os líderes mundiais ajudar Kiev - dois anos depois de uma intervenção em que declarou que a preocupação mundial com a Ucrânia não era suficiente e numa altura em que já havia guerra entre separatistas pró-russos e forças ucranianas nas regiões de Donetsk e Lugansk e a Rússia anexara a Crimeia.

Zelensky começou por agradecer a honra de participar naquele fórum - de onde a Rússia foi excluída - e cujo tema este ano é a história num momento de mudança. E foi precisamente por aí que o presidente ucraniano começou, dizendo que o mundo enfrenta um momento em que as sanções à Rússia permitirão perceber se outros países foram desencorajados de invasões iguais à de Moscovo em território de Kiev.

"Este é, realmente, o momento em que se decide se a força bruta vai dominar o mundo", frisou Zelensky, dando como exemplo a Casa dos Crimes de Guerra Russos que foi esta segunda-feira inaugurada em Davos, prova da má conduta russa durante a invasão à Ucrânia

Referindo que a História não esquece como os países e instituições responderam a episódios de violência - recordando, nomeadamente, Sarajevo em 1994 ou Munique em 1938 - Zelensky admitiu que a Ucrânia já lutou mais tempo do que o esperado e destacou que não precisaria de perder tantas vidas, durante tanto tempo, se as sanções mais duras à Rússia tivessem sido impostas antes. E disse mesmo que, se tivesse havido unidade em 2014, quando a Rússia anexou a Crimeia, provavelmente não estaríamos perante a invasão que começou no passado mês de fevereiro.

Zelensky pediu assim "sanções máximas" à Rússia, para que o Kremlin e outros países que considerem atacar outras nações possam ser parados por este "precedente". Defendeu um embargo total ao petróleo russo, a retirada de todos os bancos russos dos sistemas globais, que o sector das tecnologias de informação abandone a Rússia e também o fim do comércio com a Federação Russa, explicando que é necessário definir um precedente que resulte na saída de todos os países estrangeiros da Rússia, para que não sejam usados em favor dos "interesses sangrentos" de Moscovo. 

“Isto é o que as sanções devem ser: devem ser máximas, para que a Rússia e qualquer outro agressor potencial que queira travar uma guerra brutal contra o seu vizinho saiba claramente as consequências imediatas das suas ações”, disse o presidente da Ucrânia.

 

Ucrânia precisa hoje de cinco mil milhões de dólares por mês

Às empresas que saiam da Rússia, Zelensky deixou ainda uma mensagem: que serão bem-vindas na Ucrânia e que poderão tomar parte na reconstrução do país. O presidente ucraniano defendeu ainda que a reconstrução da Ucrânia poderia ser feita, nomeadamente, através do congelamento de bens e capitais russos, alocando-os a um fundo especial que garantiria apoio imediato a um país sob ataque. 

O presidente ucraniano frisou ainda que, quanto mais rápido for o apoio a um país em guerra, mais valioso será, garantindo que se a Ucrânia tivesse recebido em fevereiro todas as armas que pediu e apoio político, e se a Rússia tivesse recebido sanções imediatas, muitas vidas poderiam ter sido poupadas.

Zelensky também disse que a Ucrânia precisa de todas as armas que pediu e financiamento, muito: precisou mesmo que são cinco mil milhões de dólares (cerca de 4,7 mil milhões de euros) por mês.

A encerrar o discurso, que terminou com uma longa salva de palmas - e uma plateia em pé, que não é habitual no Fórum Económico Mundial - Zelensky citou George Marshall, o ideólogo do plano Marshall para reconstrução da Europa no pós-Segunda Guerra Mundial, que dizia que não se opunha a nenhum país, apenas à fome, pobreza, desespero e caos. 

Novos canais de exportação

O presidente executivo e fundador do Fórum Económico Mundial, Klaus Schwab, questionou Zelensky, no final da intervenção do ucraniano, sobre a forma como vê o futuro da Ucrânia. E o presidente ucraniano disse que o país está a perder muito todos os dias, revelando que começa o dia a receber informação sobre as vítimas de guerra. Mas reforçou que a Ucrânia sairá fortalecida da invasão russa, admitindo que o futuro do país dependerá de novas prioridades de segurança, uma vez que tudo pode acontecer com a Rússia tão próxima.

"Temos de criar condições para que os empresários não tenham medo de existir neste país", sublinhou.

Klaus Schwab perguntou ainda a Zelensky como é que a comunidade global poderá ajudar a Ucrânia, que tem um papel "crucial" no sistema de alimentação mundial, e que tem as exportações bloqueadas pela Rússia, o que poderá desencadear uma grave crise alimentar.

Zelensky acusou a Rússia de roubar cereais e de bloquear os seus portos do Mar Negro, garantindo que o Ministério dos Negócios Estrangeiros de Kiev está a trabalhar com outros líderes para encontrar soluções até ao nível dos canais diplomáticos. O presidente ucraniano pediu também em Davos que seja estabelecido um corredor que permita as exportações, nomeadamente de trigo e óleo de girassol, caso contrário haverá escassez destes produtos a nível mundial. 

"Precisamos de acordar um corredor e a Rússia não será capaz de enfrentar os países mais poderosos do mundo", disse Zelensky, admitindo que não há soluções simples mas que as linhas férreas ou os portos no Mar Báltico poderão ser uma alternativa para escoamento da produção ucraniana.

Klaus Schwab perguntou ainda a Zelensky qual seria a sua mensagem pessoal para cada um dos líderes presentes em Davos. Primeiro, o presidente ucraniano brincou, dizendo que não teria tempo para se dirigir a cada um, mas rapidamente mudou o tom do discurso. "A Ucrânia tem pouco tempo e tenho a certeza de que ninguém sabe quanto tempo a Europa ou o mundo têm", disse. "Desejo que não se perca este sentido de unidade", acrescentou, referindo que é esta unidade que preocupa mais a Rússia.

"Desejo que cada um de vós acorde de manhã com este sentimento: 'o que fiz pela Ucrânia hoje?'", terminou o presidente ucraniano, debaixo de nova salva de palmas.

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