Rússia quer paz temporária, diz Zelensky, mas a Ucrânia recusa. Porquê? A iniciativa de Kiev e o receio tremendo de Moscovo

19 nov 2022, 19:50
Volodymyr Zelensky

"Os compromissos amorais conduzirão a mais derramamento de sangue. Uma paz genuína e duradoura só pode resultar do completo desmantelamento de todos os elementos da agressão russa", afirmou o presidente ucraniano

O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse esta sexta-feira que rejeita qualquer proposta de “paz temporária” vinda da Rússia.

"Os compromissos amorais conduzirão a mais derramamento de sangue. Uma paz genuína e duradoura só pode resultar do completo desmantelamento de todos os elementos da agressão russa", disse Zelensky, que falava para um fórum de segurança no Canadá.

Mas porquê? À CNN Portugal, o major-general Isidro de Morais Pereira explicou o raciocínio que levou a esta tomada de posição.

“A Ucrânia alcançou uma coisa que é muito importante na guerra, a iniciativa. Um princípio-base da guerra é que, uma vez alcançada a iniciativa, nunca mais a devemos perder. Só a ofensiva conduz a resultados decisivos. A Ucrânia não tinha a iniciativa, estava na defensiva quando foi invadida. No entanto, com o apoio ocidental em armamento, formação militar e recursos económicos e financeiros, conseguiu organizar-se e alcançar a iniciativa. Primeiro, expulsou as forças russas de Kiev, depois afastou-as do oblast de Kharkiv e, agora, de parte significativa da região de Kherson. Um acordo de paz nesta altura não faz sentido absolutamente nenhum”, afirma.

“Neste momento, a paz interessa, sobretudo, a Putin, que percebeu que a Rússia não tem capacidade para anexar a Ucrânia, nem sequer conseguir aquele segundo objetivo, a Novorossiya, de Donetsk à Transnístria. Os russos têm tanto receio que estão a fortificar a região de Melitopol e, inclusive a Crimeia, que é a região mais vulnerável do ponto de vista militar. O Zelensky sabe perfeitamente disso, porque conhece a História Militar”, completa.

Segundo o major-general, a Rússia iria usar uma eventual trégua para ganhar tempo e “treinar novos efetivos e constituir unidades, bem como para construir posições defensivas, algo que já está a fazer a cerca de 60 quilómetros da frente de combate”.

“Moscovo já percebeu que vai perder ainda mais terreno e está com um receio tremendo de perder a Crimeia. Está consciente de que perdeu a iniciativa, da forma desastrada com que mobilizou 300 mil homens e do desgaste das unidades que estão a combater na frente, algumas há muitos meses e apenas com 10 a 20% dos efetivos”.

No entanto, mesmo conseguindo um acordo de paz temporário, a tarefa russa não seria simples. “Desde a formação como efetivo até à constituição de unidades, é preciso pelo menos um ano. Ainda tem outro problema grave, os quadros. Sargentos e oficiais levam anos a formar. A mobilização também tem corrido mal porque foi liderada pelos sargentos e oficiais, que compõem as estruturas em tempo de paz, só que têm sido levados para o campo de batalha.”

“Não é só no terreno que a Rússia tem problemas", diz Isidro de Morais Pereira. “A Rússia está com problemas em formar pilotos de caça, que levam pelo menos um ano a formar. Não é só construir mais aviões. Porque é que a Rússia não tem a supremacia aérea? Porque não se pode dar ao luxo de perder mais aviões e, sobretudo, mais pilotos. Nestes meses, já perderam mais aviões na Ucrânia do que em todos os dez anos da Guerra do Afeganistão. Os sistemas de defesa antiaérea fornecidos pelo Ocidente, como os IRIS-T, os NASAMS e os Flakpanzer Gepard, têm sido fulcrais”, conclui o major-general.

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