Rússia ameaça com armas nucleares? É teatro, propaganda e manipulação, explicam três generais

27 fev 2022, 17:25
Vladimir Putin (AP Images)

Generais Leonel de Carvalho, Garcia Leandro e Agostinho Costa analisam decisão russa de pôr forças de dissuasão nuclear em estado máximo de alerta

A notícia chegou durante a tarde deste domingo: Vladimir Putin deu ordem ao comando militar russo para colocar as forças de dissuasão nuclear em estado máximo de alerta. A etapa está prevista na organização militar e coloca o mundo em alarme: os militares russos dizem-se a postos para ativar cabeças ou ogivas nucleares com diferentes alcances.

Há motivos adicionais para preocupação? Três generais portugueses dizem à CNN Portugal que não.

“Não estou a ver a Rússia a tomar a iniciativa de tomar qualquer ação nuclear. Faz parte da propaganda russa, para dar um sinal de que está disposta a ir até à última instância”, analisa o general Leonel de Carvalho.

“Isso quer dizer que [a Rússia] pode utilizá-las. Mas é evidente que é um bocado teatro. Porque isso daria origem a uma guerra mundial. Não estou a imaginar que venha a utilizá-las. É elevar o nível da gravidade”, explica por sua vez o tenente-general Garcia Leandro.

Já o major-general Agostinho Costa lembra que, num conflito como o russo-ucraniano, a comunicação e a opinião pública são uma arma importante. “Esta posição não significa nada", responde. "Estamos no campo da ‘emotional politics’ [política emocional]. O centro de gravidade desta guerra é a comunicação, é a estratégia comunicacional. Isto serve para acrescentar mais emoção”.

Trata-se de mostrar força aos adversários ante as dificuldades sentidas pelos militares russos em território ucraniano. Não necessariamente para impressionar a Ucrânia, mas sim a NATO, em especial os Estados Unidos da América.

Especialistas avisam que Putin quererá 'assustar' os rivais da NATO (AP)

A nova "guerra fria"

Os parâmetros do clima de guerra fria voltam assim a impor-se. Se é um facto que a Rússia tem armas nucleares, afirmam os três generais portugueses, só faria sentido usá-las se recebesse ameaças ou se fosse atacada por aliados da NATO.

“Usar armas nucleares contra quem? Contra o exército ucraniano? É mera manobra. Só seria viável em circunstâncias em que a NATO interviesse no conflito, em particular os americanos, que já mostraram que não querem entrar [nesta guerra]”, traça o major-general Agostinho Costa. O general Leonel de Carvalho posiciona a questão: “Ninguém os ameaçou”.

O tenente-general Garcia Leandro explica que seria possível fazer o ataque nuclear a partir de território russo, controlando o itinerário dos mísseis nucleares. Mas outros países com arsenal nuclear, como os Estados Unidos da América, também têm tecnologia que permite bloquear este tipo de ataques por parte de inimigos.

Forças ucranianas na base militar de Vasylkiv, em Kiev (Reuters)

Da invasão aos crimes de guerra

Há, para o general Leonel de Carvalho, outro motivo para Putin se conter num ataque nuclear: a possibilidade de ser acusado de um crime de guerra. “Uma guerra química é altamente condenada pelas convenções internacionais”, relembra.

A Convenção de Genebra define como crimes de guerra as ações que ultrapassem os propósitos militares, como ataques propositados a civis, genocídios, torturar prisioneiros de guerra ou o uso de armas químicas.

“Mesmo que se considere uma guerra injusta, [a invasão da Ucrânia] não é um crime de guerra. A utilização de armamento nuclear de guerra, isso sim, é”, resume o especialista. Seria, segundo este enquadramento, um ato de agressão, por não ter sido respeitada a soberania russa.

Já o major-general Agostinho Costa argumenta que, a avançar uma disputa nuclear, esta seria uma “guerra nuclear tática, contra alvos militares e não civis”, não sendo por isso enquadrável no conceito de crimes de guerra. O militar recorda os casos de Hiroshima e Nagasaki, onde foram detonadas bombas nucleares da Segunda Guerra Mundial, eles “não eram bases militares”. Estes ataques nucleares norte-americanos nunca foram julgados como crimes de guerra, mas são frequentemente classificados como tal pela opinião pública.

A Ucrânia já entrou oficialmente com uma ação contra a Rússia no Tribunal Internacional de Justiça da ONU em Haia. Numa publicação no Twitter, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky exige que a Rússia seja considerada responsável por distorcer o conceito de genocídio para justificar uma agressão ao seu país.

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