Realidade ou ficção científica? As armas com lasers chegaram à guerra na Ucrânia?

20 mai 2022, 10:12
Vladimir Putin com arma para destruir drones (Mikhail Svetlov/Getty Images)

O Peresvet foi apresentado em 2018 por Vladimir Putin, mas agora a Rússia dá conta do Zadira. Um serve para "cegar", o outro para "destruir", dizem

O vice-primeiro-ministro da Rússia veio falar esta quinta-feira pela primeira vez numa arma até agora desconhecida. Chama-se Zadira, e Yuri Borisov garantiu, em direto na televisão russa, que funciona a laser, conseguindo destruir alvos a uma distância de cinco quilómetros. Nos testes conduzidos, referiu o responsável, a arma conseguiu destruir um drone, que será o seu grande propósito.

Esta arma levou a algum ceticismo por parte do Ocidente e o primeiro a desacreditá-la foi o presidente da Ucrânia: “wunderwaffe”, chamou-lhes Volodymyr Zelensky, referindo-se a “armas fantasia” que fizeram parte da propaganda nazi e que nunca existiram na realidade.

“À medida que ficava mais claro que [os nazis] não iam vencer a guerra, mais propaganda existia sobre armas fantasiosas. A Rússia está a tentar encontrar as suas wunderwaffe. Alegadamente são lasers. Tudo isto indica um claro e completo falhanço da invasão”, referiu o chefe de Estado ucraniano.

Há vários exércitos que já testam sistemas de laser para alvejar drones inimigos, mas, que se saiba, todos estão ainda em fase de teste ou de construção, sendo que a sua eficácia em contexto de combate nunca foi testada. A Rússia terá pelo menos dois sistemas.

Peresvet, para cegar

Yuri Borisov não foi o primeiro a falar do Peresvet, o tal laser que diz ser para cegar, algo que até já foi proibido por uma convenção das Nações Unidas que foi assinada por 109 países, entre os quais estão Ucrânia e Rússia. A convenção, curiosamente, proíbe de forma expressa a utilização de lasers para cegar soldados e civis.

Já em 2018, e num discurso de Estado da Nação em que comparava o poderio militar da Rússia com o da NATO, Vladimir Putin falou pela primeira vez nos Peresvet. A acompanhar estava um vídeo, e Yuri Borisov garante que esta arma já foi utilizada, dizendo mesmo que pode servir para cegar satélites de reconhecimento a 1.500 quilómetros de distância da terra.

“Não é apenas um conceito ou um plano. Não está sequer na fase inicial de produção. Desde o ano passado as nossas tropas estão armadas com armas a laser. Não quero revelar mais detalhes, ainda não é a hora”, disse na altura o presidente da Rússia, afirmando assim que o poderio de defesa do país se tinha multiplicado.

Nessa altura nem sequer tinha um nome, era apenas um sistema terrestre de laser. Foi após consulta popular que a inovadora arma foi assim batizada, em homenagem a um monge ortodoxo que teve um papel importante na Batalha de Kulikovo, em 1380, um dos grandes feitos do povo russo, no qual, apesar do menor número, conseguiram vencer tártaros e mongóis.

Zadira, para destruir

Para validar o que acabava de dizer, Yuri Borisov explicou no estúdio do Channel One que tinha acabado de chegar de Nizhny Novgorod, local onde fica um centro de investigação nuclear para fins bélicos.

“Se o Peresvet cega, esta nova geração de armas laser leva à destruição física dos alvos – a destruição térmica, e depois ardem”, concluiu o governante russo, numa comparação com outra arma laser que fará parte do arsenal russo.

Experiência francesa com lasers para destruir drones (Getty Images)

Segundo Yuri Borisov, o sistema Zadira, além de ser “mais avançado”, serve para derrubar vários tipos de veículos aéreos não tripulados, como os drones, o que “evita o gasto de mísseis caros como o Pantsyr e o Tor”.

Deste último sistema pouco mais se sabe do que o que foi dito pelo vice-primeiro-ministro, que garantiu que ambas as armas já estão a ser utilizadas na Ucrânia: “Já começaram a chegar ao exército no terreno”, garantiu.

Ao contrário do Peresvet, para já ainda não foram divulgadas quaisquer imagens do sistema Zadira.

EUA não confirmam lasers no terreno

As palavras de Yuri Borisov fizeram aumentar o burburinho, nomeadamente nos Estados Unidos. Questionado sobre a possibilidade de estas armas já estarem a ser utilizadas na Ucrânia, um alto funcionário do Departamento da Defesa afirmou que não existem provas que corroborem tais afirmações.

"Temos visto relatos na imprensa sobre isso, mas não vimos nada que o corrobore", referiu o responsável do Pentágono.

Ficção científica? Israel garante que não

Já em plena guerra, o primeiro-ministro de Israel, um dos países com tecnologia de guerra mais avançada, afirmou que tinha sido testado, com sucesso, um sistema de lasers chamado Iron Beam: “Pode soar a ficção científica, mas é real”, disse Naftali Bennett no Twitter.

A acompanhar as palavras do governante, um vídeo mostrava lasers a mirarem e a abaterem mísseis, morteiros e drones de grande dimensão, semelhantes aos modelos turcos TB2, que têm sido utilizados em larga escala pela Ucrânia na guerra como armas defensivas.

O Iron Beam, tal como se espera que venha a acontecer com outras armas do género, funciona por via de um raio que atinge um determinado alvo com o objetivo de o incinerar, utilizando uma grande quantidade de eletricidade no processo. No caso dos drones dá-se a destruição do exterior do aparelho até um ponto em que o mesmo deixa de conseguir voar.

Naftali Bennett sugeriu ainda que a utilização deste tipo de armas poderia sair muito mais barato aos exércitos do que sistemas anti-aéreos com mísseis. As contas do primeiro-ministro israelita apontam para 3,50 dólares (perto de euros) por disparo, mas não foi divulgado com clareza quanto poderá custar todo o equipamento que envolve a arma, nomeadamente aquele que lhe dá o poder elétrico.

No Reino Unido também se tem avançado para estes projetos. Em 2021, o ministro da Defesa anunciou três contratos no valor de 72,5 milhões de libras (cerca de milhões de euros), dois dos quais destinados ao desenvolvimento de sistemas de lasers destinados ao ataque a fragatas e a veículos terrestres. Mas o mesmo projeto só deve entrar na fase de experimentação entre 2023 a 2025.

Estados Unidos e China também estão a tentar desenvolver os seus próprios sistemas de laser.

Marinha dos EUA em demonstração de sistema laser (AP)

Em declarações ao jornal The Guardian, o investigador Dmitry Stefanovich, que trabalha no Centro de Segurança Internacional, com sede em Moscovo, admite a existência destas armas, mas refere que, “para ser eficaz, a Rússia terá de aumentar a escala de produção de lasers Zadira”.

“De momento não existem suficientes para fazer uma diferença real”, acrescentou, levantando ainda questões sobre como a Rússia conseguiria transportar ou fornecer as quantidades de energia necessárias para a utilização desta arma em solo ucraniano.

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