Kherson, Mykolaiv e não só. Como a Ucrânia está a contra-atacar no sul

12 jul 2022, 15:57
Soldado ucraniano numa fronteira entre as cidades de Mykolaiv e Kherson (Genya Savilov/Getty Images)

Ucrânia resiste a norte, mas a sul avança, tentando reconquistar cidades importantes no acesso ao Mar Negro

Com praticamente toda a região do Donbass perdida (Donetsk ainda tem alguns pontos de resistência), a Ucrânia virou a postura na guerra para duas vertentes: a norte, continua a tentar resistir aos avanços em Kharkiv, a segunda maior cidade do país, enquanto que a sul avançou com uma larga operação para reconquistar cidades perdidas para a Rússia.

Isso mesmo tinha sido anunciado por vários responsáveis, entre eles a vice-primeira-ministra, Iryna Vereschchuk, que no domingo já havia pedido aos civis de várias cidades do sul, como Kherson, que abandonassem esses locais. O que se perspetivava começou a ver-se em força esta terça-feira, com a Ucrânia a avançar em múltiplas direções para empurrar as forças russas para trás, tentando libertar o máximo de território possível.

Foco de avanço

É o que está a acontecer em Kherson, mas também em Mykolaiv ou Zaporizhzhia, ainda que em dimensões diferentes. Destas, a primeira região parece ser o foco de maior atenção, talvez por ser um ponto estratégico importante, sendo uma cidade portuária que permite o acesso ao estuário do rio Dniepre, que vai desaguar ao Mar Negro.

Um dos grandes objetivos da Ucrânia, como admitiu Iryna Vereschchuk, passa por ter um maior controlo do Mar Negro, onde os portos de Mariupol ou Kherson estão tomados pelos russos, que vigiam ainda todas as outras localidades portuárias, como Odessa.

As Forças Armadas ucranianas afirmam que a capacidade desta ofensiva a sul está a ser de tal forma que “o inimigo está a concentrar esforços para conseguir manter as posições nas zonas ocupadas e prevenir a ofensiva das unidades ucranianas”. Na prática, ao contrário do que pretendia, e segundo a Ucrânia, a Rússia luta para não perder terreno, quando o objetivo seria conquistá-lo.

Um objetivo que o coronel Carlos Mendes Dias afirma que deverá passar pela criação daquilo a que chama a “nova Rússia”, um traço de terreno que acrescentaria àquele país a zona que vai desde a Rússia até Odessa, passando pelas cidades já dominadas de Mariupol e Kherson, e que poderia ligar o território russo à Transnístria, região separatista pró-russa da Moldova.

Os avanços ucranianos no sul fazem-se em cidades como Pravdyne, Oleksandrivka ou Snigurivka, sendo que a Ucrânia anunciou esta segunda-feira a reconquista de Ivanivka, a cerca de 45 quilómetros de Kherson.

Em Mykolaiv, por exemplo, o Comando Operacional do Sul da Ucrânia anunciou que atingiu três armazéns que continham armamento russo, sendo que helicópteros ucranianos atacaram posições russas na região vizinha de Kherson.

O mesmo aconteceu em Kherson, onde um depósito de armas russo foi atingido por mísseis HIMARS, em Nova Kakhovka, tendo feito ainda 52 mortos entre as tropas russas, segundo o lado ucraniano. Sobre o mesmo ataque, o lado russo deu informações diferentes: apenas sete terão morrido e o ataque também terá atingido civis.

“Já lançámos ataques em quase toda a linha da frente”, afirmou Serhii Khlan, o conselheiro para a administração militar de Kherson, onde o responsável diz que as forças russas estão a reforçar os postos de controlo, nomeadamente com fortificações de cimento, o que “dá pistas de que se estão a preparar para batalhas na rua”. A confirmar-se, significa que a Rússia adotou uma posição defensiva no local.

A intensidade dos combates em Kherson é tal que, no início de julho, já tinham sido identificados 75 fogos que consumiram cerca de 300 mil hectares, grande parte deles de campos de cereais.

Sinais semelhantes verificam-se na região de Zaporizhzhia, nomeadamente em Melitopol, onde os russos bloquearam, pelo segundo dia consecutivo, as saídas da cidade. O autarca da cidade afirma que isso se deveu ao "medo" do contra-ataque ucraniano: "Cobriram-se com milhares de civis como escudos humanos", afirmou Ivan Fedorov, que fala numa "cidade-refém".

O chefe da administração regional de Melitopol apontado pelos russos admitiu a existência de ofensivas ucranianas no local: "Tornaram-se no Estado Islâmico: rebentam pontes, fazem ataques a figuras públicas", disse, naquilo que será uma referência a uma alegada tentativa de assassínio do autarca local nomeado pelos russos, cujo carro explodiu.

No entanto, os responsáveis russos afirmam que isso "não vai mudar nada", afirmando que "o povo de Zaporizhzhia já fez a sua escolha", referindo-se a um referendo em que é esperado que aquela zona venha a votar favoravelmente a inclusão no território da Rússia, algo que também pode vir a acontecer em Kherson, e que é semelhante ao que ocorreu na Crimeia em 2014, quando a Rússia anexou a península.

Para tudo isto, a Ucrânia terá colocado no terreno aquilo a que o ministro da Defesa chamou de “força de um milhão”, um conjunto de 700 mil soldados aos quais se acrescentam 300 mil oficiais de todas as forças policiais do país.

Foco de resistência

As Forças Armadas da Ucrânia afirmam que continuam a reter avanços da Rússia em Kharkiv, onde foi possível evitar ganhos de 20 quilómetros por parte do exército russo.

Ali, dizem as autoridades ucranianas, continuam a ser diários os bombardeamentos contra várias localidades, em particular a cidade, já de si muito destruída, até porque é, desde 24 de fevereiro, um dos principais pontos de combate.

Em Zolochiv, por exemplo, dois homens morreram esta terça-feira num bombardeamento que atingiu uma zona residencial, segundo a administração regional militar de Kharkiv.

“Na região de Kharkiv morreram sete pessoas e 34 ficaram feridas como resultado dos bombardeamentos”, acrescentaram responsáveis daquela zona, citados pela CNN.

Mais abaixo, em Donetsk, a resistência continua em Sloviansk, que, em conjunto com Kramatorsk, é um dos poucos pontos-chave que os ucranianos ainda dominam naquela região do Donbass: “Todas as ações do inimigo nesta direção foram mal-sucedidas”, referiram as Forças Armadas da Ucrânia. Ali joga-se o último bastião do Donbass, até porque o resto de Donetsk e toda a região de Lugansk já caíram para o lado russo.

O objetivo russo passa por cercar aquela zona a partir das três áreas que domina: a este, vindo da Rússia e do território do Donbass mais perto da Rússia; a norte, vindo de Lugansk; e a sul, vindo de Mariupol, na região de Donetsk.

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