Especialistas anteveem à CNN Portugal aquela que poderá ser "a mais dura das batalhas". Para já avança o recolher obrigatório na cidade, decretado pelos pró-russos
Esta sexta-feira, a guerra na Ucrânia fica marcada pelos avisos que nos chegam da Rússia para um “provável” ataque das forças ucranianas em Kherson, ao ponto de as autoridades pró-russas terem decidido impor um recolher obrigatório de 24 horas naquela região anexada pelo Kremlin. Os especialistas contactados pela CNN Portugal consideram que esta parece mais uma "manobra de deceção" do Kremlin para evitar sofrer "uma terceira humilhação", depois dos fracassos em Kiev e Kharkiv.
“Os indicadores que temos tido apontam todos no sentido de que ali se vai travar uma batalha", começa por dizer o major-general Agostinho Costa, quando questionado pela CNN Portugal sobre se há realmente indícios de que a Ucrânia se prepara para uma ofensiva na região a qualquer momento.
Tanto a Rússia como a Ucrânia têm vindo a alertar, nas últimas semanas, para uma batalha iminente em Kherson, a maior cidade capturada durante a guerra. Em finais de setembro, a Ucrânia disse que as forças russas estariam a preparar-se para “a mais dura das batalhas em Kherson”, enquanto as autoridades pró-russas deram ordens para a retirada da população civil da região perante um suposto ataque ucraniano.
Para o major-general Agostinho Costa, “a probabilidade de um ataque [da Ucrânia] é grande” - “diria de 60% para 40%” -, mas ainda está tudo em aberto. O especialista militar lembra que a Ucrânia “tem vindo a reunir forças” naquela região, pelo que estarão ali cerca de 60 mil combatentes ucranianos. Porém, com a mobilização de 300 mil reservistas decretada por Putin, a região de Kherson terá duplicado as forças destacadas, pelo que estarão agora ali cerca de 40 mil russos.
“A dúvida é se, efetivamente, a Ucrânia morde o isco e se vai avançar para o ataque”, afirma o major-general, acrescentando que a decisão está nas mãos do Estado-Maior das Forças Armadas da Ucrânia, que tem de ponderar se o "potencial relativo de combate ucraniano é suficiente para conquistar Kherson".
Mas esta também pode ser uma "manobra de deceção militar", ressalva, observando que estas encenações são comuns em operações militares, uma vez que "nenhuma das partes quer que o inimigo saiba se vai ou não atacar".
O major-general Vítor Viana também considera que esta é uma "manobra de deceção muito bem urdida por parte do Kremlin e das forças russas", uma vez que já começou há algumas semanas, quando o comandante das forças russas, Sergei Surovikin, admitiu que a situação em Kherson era difícil e propôs então a evacuação da cidade.
Ao mesmo tempo, a Rússia tem desenvolvido "ações contraditórias", diz o major-general Vítor Viana, referindo-se ao reforço das posições defensivas das forças russas a norte de Kherson e ao reforço do número de efetivos para "tentar equilibrar o potencial de combate".
"Isto são indícios de que, face à importância estratégica de Kherson, as forças russas não vão arriscar uma terceira humilhação. A primeira foi em Kiev, a segunda foi em Kharkiv e de facto seria muito mau serem sujeitos a uma terceira humilhação", sublinha o especialista em estratégia militar.
A verdade é que a região de Kherson "está a ser transformada numa fortaleza" e a reconquista ucraniana "não vai ser fácil", prevê o major-general Agostinho Costa, que considera que "a Ucrânia tem mais limitações que a Rússia" do ponto de vista da artilharia, uma vez que está dependente da ajuda ocidental.
Assim, "é difícil equacionar se vai ou não haver uma contraofensiva" por parte da Ucrânia, resume o especialista.
Por sua vez, o major-general Vítor Viana acredita que, se as forças russas forem obrigadas a recuar como consequência de uma ofensiva ucraniana, "vão fazer o que já estão a preparar, que é a fortificação" de Kherson, isto é, vão "tornar a cidade de Kherson um centro de resistência, um combate urbano e, portanto, vão tentar resistir".
Isto porque Kherson "é absolutamente estratégica para a estratégia de ocupação que as forças russas têm vindo a seguir", uma vez que, segundo Vítor Viana, permite concretizar o objetivo da Rússia de contornar Mykolaiv, conquistar Odessa e eventualmente prosseguir para a Transnístria.