Participação da China na guerra, ainda que de forma indireta, leva aliados a adotarem um discurso mais agressivo. Lá dentro parece haver unanimidade, mas há pelo menos um Estado-membro que não pensa bem igual
Na cimeira da NATO toda a gente parece saber uma coisa: a Rússia é a grande ameaça à segurança internacional, nomeadamente da Ucrânia e, por extensão, de todos os países da Aliança Atlântica. Seria de esperar, por isso, uma linguagem agressiva e direta contra Moscovo, sobretudo a meio de inúmeras notícias de sabotagem e até de tentativas de homicídios de pessoas de relevo da indústria militar ocidental.
O que não seria de esperar, pelo menos segundo as antevisões, era a visão de um outro bloco: a China. E nem foi en passant: no comunicado publicado ao segundo dia do encontro a NATO deu o mote, apelidando Pequim de “facilitador decisivo” da guerra da Rússia na Ucrânia.
Por isso, mas não só por isso, a China continua a ser uma ameaça sistémica à segurança Euro-Atlântica. “A República Popular da China tornou-se um facilitador decisivo da guerra da Rússia contra a Ucrânia através da chamada parceria ‘sem limites’ e do apoio industrial de defesa. Isto aumenta a ameaça colocada pela Rússia”, pode ler-se no ponto 26 de um longo comunicado assinado pelos 32 Estados-membros, entre os quais está Portugal.
Mas há preocupações também com a própria China e as suas intenções. A NATO vê Pequim a desenvolver as suas capacidades militares – já tem a maior frota naval do mundo – e vê a expansão do arsenal nuclear chinês como uma ameaça clara.
Ucrânia na NATO, sim ou sim
Era uma mensagem que já ecoava nos corredores, até porque várias publicações davam conta da terminologia a utilizar no comunicado. Afinal, a entrada da Ucrânia na NATO é mesmo “irreversível”, naquela que foi a mensagem mais forte dos aliados a Kiev.
Não é uma questão de se, mas de quando, começaram por dizer alguns representantes dos países, para depois serem secundados pelo secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, que teve essa mesma expressão.
Como premissa que a Ucrânia prossegue o “trabalho vital” no sentido das reformas democráticas, económicas e de segurança, a NATO garante que estará numa “posição de estender um convite para adesão à Aliança”. Isto sempre e só quando a guerra com a Rússia terminar, uma vez que os aliados continuam a tentar de tudo para não enviar tropas para o terreno.
A juntar a essa garantia estão questões mais concretas: no próximo ano vão ser transferidos pelo menos 40 mil milhões de euros para Kiev, mas os caças F-16 devem chegar bem antes. A julgar pelas garantias dadas em Washington, breve é já este verão. O presidente ucraniano agradeceu, mas agora espera para confirmar que é mesmo assim, enquanto continua a pressão para ter uma das mais desejadas autorizações: a utilização de armamento de longo alcance em território russo. Esta segunda pretensão será mais difícil, mas Volodymyr Zelensky tentou na mesma, deixando o pedido na conferência de imprensa de despedida.
Divisão no paraíso?
Foram 32 líderes reunidos em Washington, numa cerimónia cheia de pompa e circunstância e na qual Joe Biden foi uma das estrelas. Estiveram lá também representantes de Japão, Coreia do Sul, Austrália e Nova Zelândia, como parceiros, mas houve quem não ficasse tão entusiasmado com as conclusões.
Mantendo uma lógica de algum afastamento ao Ocidente e que é, no mínimo, de neutralidade, a Hungria voltou a tirar o tapete.
O ministro húngaro dos Negócios Estrangeiros reiterou que o país pretende chegar à paz, mas deixou duras críticas à forma como a NATO visou a China neste comunicado.
É que a Hungria não quer que a NATO se torne num bloco “anti-China”, depois do comunicado em que a Aliança Atlântica visou Pequim.
O ministro húngaro dos Negócios Estrangeiros referiu que o país não vai apoiar uma iniciativa do género, lembrando que a NATO se trata de uma organização defensiva.
“A NATO é uma aliança defensiva… não podemos tornar-nos num bloco anti-China”, referiu Peter Szijarto.
Já sobre a admissão da Ucrânia à NATO, o responsável mostrou uma visão diferente: “A entrada da Ucrânia na NATO não vai fortalecer, mas enfraquecer a Aliança, até porque existem visões completamente diferentes”, vincou, falando na criação de um “risco aberto de conflito entre Rússia e NATO”.