A Reuters teve acesso a documentos que mostram que a fabricante de armamento russa Kupol pode ter encontrado forma de contornar as sanções europeias
Moscovo tem um novo programa de armas na China cujo propósito é desenvolver e produzir drones de ataque de longo alcance para ser utilizados na guerra da Ucrânia, revela a Reuters. Segundo a agência, que teve acesso a documentos oficiais e cita duas fontes diferentes da agência de inteligência europeia, a fabricante IEMZ Kupol, uma subsidiária da empresa estatal russa de armamento Almaz-Antey, desenvolveu e testou em voo um novo modelo de drone batizado Garpiya-3 (G3) e, para isso, contou com a ajuda de especialistas chineses.
Este novo drone pode viajar cerca de 2 mil quilómetros com uma carga útil de explosivos de 50 quilos, de acordo com os relatórios da Kupol. Os documentos analisados e o relatório enviado pela Kupol ao Ministério da Defesa da Rússia mostram que a empresa foi capaz de produzir drones, incluindo o G3, em grande escala numa fábrica na China. As armas vão ser utilizadas na "operação militar especial" na Ucrânia.
A Reuters noticia ainda que remeteu pedidos de comentário para a fabricante de armamento e para o Kremlin, mas que até ao momento não obteve qualquer tipo de esclarecimento sobre o tema.
Só o Ministério dos Negócios Estrangeiros de Pequim respondeu às questões da agência de notícias, garantido que não tinha conhecimento deste projeto e lembrando que a China tem medidas para a exportação de veículos aéreos não tripulados (UAV, na sigla em inglês) muito apertadas.
Tanto os representantes da administração Biden como do governo da Ucrânia também não responderam às perguntas da Reuters. No entanto, as autoridades norte-americanas tinham admitido preocupações, na semana passada, sobre o que diziam ser o apoio chinês à máquina de guerra da Rússia, sem adiantarem mais detalhes.
As amostras do G3 e de outros modelos fabricados na China foram entregues pela fabricante de armamento ao Kremlin para testes adicionais, que também vão contar com o envolvimento dos especialistas chineses.
À sede da Kupol, na cidade russa de Izhevsk, chegaram sete novos drones militares de fabrico chinês, incluindo dois G3, - de acordo com dois documentos diferentes analisados pela Reuters.
Os documentos em causa são faturas, uma delas na moeda chinesa, que foram enviadas para a Kupol no verão. Os dois recibos não especificam a data de entrega nem quem são os fornecedores chineses.
A Reuters esclarece, no entanto, que em cinco documentos que analisou não existia qualquer referência a localizações destas fábricas chinesas - nem dá para saber se o Ministério da Defesa da Rússia deu luz verde para prosseguir com a produção em série do G3.
David Albright, ex-inspetor de armas da ONU que lidera o grupo de investigação do Instituto de Ciência e Segurança Internacional e que conduziu um extenso trabalho sobre a cooperação chinesa e russa na produção de drones, disse à Reuters que a Kupol tinha uma hipótese de contornar as sanções ocidentais à Rússia - estabelecendo uma unidade de produção na China, onde poderia ter acesso a chips avançados e conhecimento especializado.
Por sua vez, Samuel Bendett, investigador sénior adjunto do Centro para uma Nova Segurança Americana, destaca que Pequim teria motivos para agir com cautela: "O fato de existir oficialmente uma fábrica que constrói UAV para os russos expõe a China a alguns dos efeitos mais severos das sanções ".