Anton não quer pegar em armas, não quer "uma paz russa". Só quer a Ucrânia dele

2 mar 2022, 23:57

Tem 33 anos, é cientista. Pelas 05:00 de 24/02/2022, roubaram-lhe a Ucrânia que ele acredita que pode ter de volta esta quinta-feira - há novo encontro para cessar-fogo

Quando as forças russas invadiram a Ucrânia, logo na madrugada de 24 de fevereiro, Kharkiv foi imediatamente um dos principais alvos. O ruído da guerra fez acordar o cientista Anton Polianskyi. Eram cinco da manhã. Uma semana depois, está abrigado com a namorada e os pais numa garagem transformada em bunker.

Chegámos a ele através de um grupo na rede social Telegram: diz que está disposto a contar a sua história, como é viver numa cidade onde a destruição está em cada rua. Não quer dar a cara, tem medo de ser identificado. E a voz estremece-lhe ao contar o que vê na rua quando sai para comprar comida. “Cadáveres. Sangue. É difícil. Queremos viver em paz. Não queremos uma paz russa. Só queremos estar em paz. Não queremos estar na Rússia ou na Europa. Só queremos paz. Por favor, não bombardeiem a Ucrânia. Há dois anos, não poderia imaginar que alguém bombardeasse o nosso país.”

Kharkiv é, das grandes cidades ucranianas, a que está mais próxima da fronteira russa. E a proximidade geográfica e cultural tem sido usada pelo Kremlin para alimentar a sua narrativa de que a Ucrânia não pode viver separada da Rússia. Recue-se até 2014. Quando as ruas de Kiev eram tomadas por protestos contra o presidente Yanukovych, Kharkiv era vista por Moscovo como um ponto de reviravolta à revolução em curso, de forma a dar o poder ao líder ucraniano diretamente apoiado por Putin. Foi nesta cidade que presidente Yanukovych acabou por se refugiar.

Foi um refúgio distinto daquele em que vivem agora milhares de famílias, como a de Anton Polianskyi. Aos 33 anos, quer que o resto do mundo saiba o que se passa nas ruas que o viram crescer. Um dos últimos ataques, feito por rockets russos, atingiu o coração administrativo da cidade. E nem os prédios residenciais têm escapado à fúria russa. Só nas últimas 24 horas provocaram mais de 20 mortos e 100 feridos. “A cidade está a ser bombardeada agora mesmo. Em todo o lado, na baixa, em todo o lado. Há explosões enormes e outras não tão intensas. São explosões russas.”

Destruição nas ruas de Kharkiv (Pavel Dorogoy/AP Photo)

Kharkiv não é agora a cidade da cultura e da ciência que se afirmou no país. No século XVII, esta cidade do nordeste era vista como um forte, uma barreira, que protegia as fronteiras da Rússia. Mas é precisamente da invasão do país vizinho que a população agora se defende. Prepara-se a defesa com o que há à mão.

Anton Polianskyi tem amigos dispostos a combater. Mas ele não quer pegar numa arma. Recusa-se a ter de o fazer. “Nunca pensei nisso, em matar alguém. Quero viver em paz, numa cidade pacífica. Somos pessoas normais, não temos habilidades para pegar numa arma. Esta quinta-feira, o nosso governo e o governo russo vão falar sobre esta situação. E eu desejo que acabemos em paz.”

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