A Leste tudo de novo: Ninguém está preparado para isto

2 mar 2022, 18:09
Refugiados da guerra

Os repórteres Filipe Caetano e David Luz partiram para a Ucrânia a 14 de Fevereiro, quando a tensão na região estava a aumentar por causa do acumular de forças militares russas junto à fronteira. Dez dias depois, a invasão começou. Durante todo esse período, mantiveram o seu trabalho percorrendo o país de norte a sul até ao dia em que não foi mais possível continuar. O relato do jornalista Filipe Caetano, editor de Internacional da CNN.

Foi a primeira vez que estive na guerra. Como repórter foi uma experiência diferente de tudo o que tinha feito até hoje. Quando estudava jornalismo tinha o sonho de poder cobrir um conflito, de estar mais perto, de poder relatar as situações mais difíceis na primeira pessoa. Mas ninguém está verdadeiramente preparado para isto. Vários colegas meus já o fizeram muitas vezes e se os respeitava antes, agora respeito-os ainda mais. E nem sequer estou a falar dos relatos de Kapuściński.

Antes da guerra começar escrevi para este mesmo site sobre como é prepararmo-nos para a guerra, mas, repito: ninguém está verdadeiramente preparado para isto. Com o David Luz, tentámos ir o mais longe possível e sempre que as condições de segurança nos permitiam. Neste tipo de terrenos é preciso saber dar os passos corretos, sendo que para isso é essencial ter os contactos certos, encontrar os caminhos para continuar a informar com imparcialidade.

Neste tempo em que estivemos na Ucrânia fomos à fronteira com a Bielorrúsia, à zona de Chernobyl, aos arredores de Kiev (tanto a norte, como a sul), a vários locais de Donbass e a Dnipro. Mas foi quando regressámos à capital que sentimos não ter condições para continuar. Sem pontos de contacto, sem portas abertas, também sem garantias de segurança (não havia coletes anti-bala para todos, nem capacetes), passa a ser impossível exercer a nossa profissão.

Perguntam-me se tive medo. Nunca tive, até ao momento em que não me conseguiram garantir as condições de segurança mínimas e por isso, por muito que quiséssemos ficar, tivemos de sair. Não pelas bombas que caíam, pelos alarmes, pelas idas ao bunker, mas por não poder sequer sair à rua. O jornalista não tem de ser notícia em nenhuma circunstância.

Por isso procurámos continuar a trabalhar para relatar a situação dos refugiados. Depois de termos passado 41 horas de viagem de Kiev até Botosani (Roménia), percebemos que o trajeto é duro e chegando à União Europeia tudo é diferente. Do lado ucraniano só há opressão, nervosismo, ansiedade, enquanto do outro lado da fronteira existe ajuda, empatia e alguma esperança.

Ninguém consegue prever o que vai acontecer à Ucrânia nos próximos dias, meses e anos. Sabemos que, pelo menos a comunidade internacional, e particularmente a União Europeia, terá de apoiar os milhares (ou milhões) de ucranianos que se viram forçados a sair do seu país. Sobretudo mulheres e crianças, porque os homens ficaram para trás a lutar. Os jornalistas, esses, terão de continuar a desempenhar o seu papel de informar… em segurança.

Fotografia de Nuno Luz, repórter da CNN enviado à guerra na Ucrânia
Fotografia de Nuno Luz, repórter da CNN enviado à guerra na Ucrânia
Fotografia de Nuno Luz, repórter da CNN enviado à guerra na Ucrânia
Fotografia de Nuno Luz, repórter da CNN enviado à guerra na Ucrânia
Fotografia de Nuno Luz, repórter da CNN enviado à guerra na Ucrânia
Fotografia de Nuno Luz, repórter da CNN enviado à guerra na Ucrânia

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