Responsáveis dos serviços secretos americanos dizem que Putin reforçará a escalada na Ucrânia sem se preocupar com vítimas civis

CNN , Jeremy Herb e Katie Bo Lillis
13 mar 2022, 13:57
Putin subestimou o efeito galvanizador da sua "guerra de escolha". Foto: Mikhail Klimentyev, Sputnik, Kremlin Pool Photo via AP

Os serviços de informações norte-americanos acreditam que o Presidente russo, Vladimir Putin, vê o conflito na Ucrânia como uma "guerra que não pode perder", sugerindo que é provável que ele aumente a escalada do conflito sem qualquer preocupação com o número de civis mortos, segundo afirmaram esta semana responsáveis dos serviços secretos norte-americanos ao Congresso dos EUA

A diretora dos Serviços Nacionais de Informações, Avril Haines, disse numa audiência do Congresso, na terça-feira, que os serviços de informações dos EUA consideram improvável que Putin seja dissuadido pelos contratempos que os militares russos enfrentaram na Ucrânia, sugerindo que ele está a reforçar a sua campanha para impedir que a Ucrânia se junte à NATO.

O diretor da CIA, William Burns, afirmou que Putin tinha lançado a invasão "determinado a dominar e controlar a Ucrânia", com base num conjunto de suposições: que o conflito seria bem-sucedido, que a Ucrânia era fraca, que os aliados europeus como a França e a Alemanha eram avessos ao risco, que ele tinha preparado a sua economia para ser "à prova de sanções" e que os seus militares eram capazes de uma vitória rápida e decisiva com um custo mínimo.

"Concluiu-se que ele estava errado em todos estes aspetos", disse Burns.

A discussão acerca das motivações que levaram à invasão sangrenta da Ucrânia pela Rússia no mês passado - e as radicais e severas sanções do Ocidente como resposta - ofereceram a avaliação mais pública até o momento da visão dos EUA sobre a guerra infeliz de Putin na Ucrânia. Os serviços de informação - que previram os movimentos de Putin antes da invasão - testemunharam perante a Comissão de Informações da Câmara dos Representantes, na terça-feira, na audiência anual sobre ameaças em todo o mundo.

"Esta é uma questão de profunda convicção pessoal para ele", disse Burns à comissão. "Ele tem vindo a alimentar-se de uma combinação explosiva entre o ressentimento e a ambição, há muitos anos."

O tenente-general Scott Berrier, diretor da Agência de Informações de Defesa, disse que os serviços de informações calcula, com "baixa confiança", que entre dois e quatro mil soldados russos tenham morrido na Ucrânia desde que Moscovo lançou a sua invasão no mês passado.

O anúncio nuclear de Putin era um sinal

O anúncio de Putin, na semana passada, de que ele estaria a elevar o estado de prontidão das suas forças nucleares era "muito incomum", disse Haines aos legisladores na terça-feira. Mas ela disse que seria melhor entendê-lo como uma mensagem, e não como uma ameaça imediata aos Estados Unidos.

"Obviamente, levamos muito a sério quando ele dá este tipo de sinais", disse Haines. "Mas pensamos [que] ele está efetivamente a dar um sinal, que esta é uma tentativa de dissuadir" a NATO de se envolver no conflito na Ucrânia, disse ela.

"Tem sido o principal objetivo dele ao fazê-lo", acrescentou Haines.

Haines também disse que o anúncio da Rússia de que as forças estratégicas do país seriam colocadas em "estado de alerta especial" não se referia a um "termo técnico como o entendemos dentro do seu sistema"

Os serviços de informação dos EUA consideram que a Rússia "não quer um conflito direto com as forças norte-americanas", de acordo com a avaliação anual de ameaças não confidenciais, publicada pelo Gabinete do Diretor dos Serviços de Informações Nacionais, na terça-feira.

A avaliação, que foi preparada em janeiro, antes da invasão da Ucrânia pela Rússia, dizia que Moscovo "procura um acordo com os Estados Unidos quanto à não interferência mútua nos assuntos internos de ambos os países e o reconhecimento dos EUA quanto à alegada esfera de influência da Rússia sobre grande parte da antiga União Soviética".

Moscovo "vê a sua capacidade nuclear como necessária para manter a dissuasão e alcançar os seus objetivos, num potencial conflito contra os Estados Unidos e a NATO, e vê um dissuasor de armas nucleares credível como o derradeiro garante da Federação Russa", de acordo com o relatório.

Haines disse que a Rússia inicialmente subestimou a força da resistência ucraniana

Haines disse que os serviços de informações dos EUA acreditam que as "ameaças nucleares" e a postura pública de Putin fazem parte de um esforço para impedir que os EUA e a NATO se envolvam na guerra e forneçam apoio adicional à Ucrânia.

"Putin provavelmente continua confiante que a Rússia pode derrotar militarmente a Ucrânia e quer evitar que o apoio ocidental faça pender a balança e force um conflito com a NATO", disse Haines.

Segundo afirmou, a Rússia tinha inicialmente subestimado a força da resistência ucraniana, e acrescentou que os derradeiros objetivos militares de Moscovo permanecem desconhecidos.

"O que não está claro nesta fase é se a Rússia continuará a seguir um plano maximalista para capturar toda ou a maior parte da Ucrânia, o que no nosso entender exigiria mais recursos, mesmo quando as Forças Armadas russas começaram a aliviar as regras para alcançar os seus objetivos militares", disse Haines.

As Forças Armadas russas, disse ela, estão a atuar "com total desrespeito pela segurança dos não combatentes, enquanto as unidades russas lançam ataques aéreos e de artilharia em zonas urbanas".

Burns previu que "as próximas semanas serão feias" com "pouca consideração pelas baixas civis", uma vez que é improvável que Moscovo seja capaz de instalar um regime fantoche ou uma liderança pró-russa, face à oposição do povo ucraniano.

"Os ucranianos continuarão a resistir de forma destemida e eficaz", acrescentou.

O deputado democrata Adam Schiff, da Califórnia, e presidente da comissão, disse aos jornalistas após a audiência que Putin "cometeu um grave erro de cálculo".

"Acho que certamente Putin entendeu o quanto arriscou com a Ucrânia", disse Schiff. "Creio que foi uma constatação terrível."

Haines afirmou que uma campanha militar expansionista e prolongada poderia obrigar Putin a reavaliar os seus objetivos, à medida que a oposição à invasão entre os russos continua a aumentar, e as sanções decretadas pelos EUA e pela NATO começam a entrar em vigor.

"A crise económica que a Rússia está a enfrentar também é exacerbada pela oposição política interna à decisão de Putin de invadir", disse Haines. "Mas o que ele pode estar disposto a aceitar como vitória pode mudar ao longo do tempo, dados os custos significativos que está a suportar."

Geneva Sands, Aaron Pellish, Jennifer Hansler e Sean Lyngaas da CNN contribuíram para este artigo.

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