Um helicóptero e o alvo de Putin que tem Putin como alvo: esta é a batalha do ano na Ucrânia

2 nov, 16:17
Soldados ucranianos em Pokrovsk (Evgeniy Maloletka/AP)

Ucrânia deixa cair Pokrovsk e arrisca-se a ver cair todo o Donbass. Sabe disso como ninguém e está a fazer todos os possíveis para garantir que tal não acontece

Um helicóptero Black Hawk voa baixinho e larga uma série de soldados num descampado. Com a resistência de Pokrovsk em causa, a Ucrânia destacou para a cidade perdida no meio de Donetsk uma série de homens das forças especiais, na esperança de conseguir conter a pressão russa.

Ali está um dos últimos bastiões de Donetsk, bem como uma plataforma logística essencial para o transporte de todo o tipo de meios.

Caindo Pokrovsk, a Ucrânia fica à mercê da fúria da Rússia, que pode ficar com caminho aberto para avançar para Kramatorsk, Sloviansk e Kostyantynivka, os últimos redutos da região que ainda resiste no Donbass.

Conquistado esse objetivo, a Rússia fica à beira de conseguir domínio integral do Donbass, a região onde combate até já bem antes de 2022 - o Grupo Wagner irrompeu por ali em 2014 para, como dizia, apoiar as forças separatistas de Donetsk e Lugansk.

E mesmo que o Kremlin tenha duplicado o seu objetivo para aquilo que chama “libertação” das regiões de Kherson e Zaporizhzhia, sem dúvida que são as conquistas de Donetsk e Lugansk as grandes bandeiras de Vladimir Putin.

Como tem sido típico de ambos os lados, o que se está a passar em Pokrovsk é uma questão de perspetiva. Para a Rússia há um cerco e uma pressão total sobre a cidade, enquanto a Ucrânia garante que o cenário é bem diferente.

As diferenças de narrativa vão até mesmo ao caso do tal helicóptero. O chefe das Forças Armadas da Ucrânia garantiu este sábado que “não existe cerco ou bloqueio” à cidade, sublinhando que estão a ser feitos “todos os possíveis para manter a logística”.

A situação é difícil, isso já foi admitido, mas Oleksandr Syrkskyi acredita que não só é possível resistir ali, como até aponta à expulsão das forças russas da cidade. Essas mesmas forças, acrescentou, vão caindo perante as unidades de assalto, os operadores de drone e as forças especiais ucranianas.

“O inimigo está a pagar o preço mais alto por tentar cumprir a ordem do ditador do Kremlin de ocupar o Donbass”, reiterou, ainda que sublinhando a necessidade de mais tropas, armas e sistemas para conseguir continuar a repelir o inimigo.

E a referência a Vladimir Putin não vem em vão, muito menos em Pokrovsk, onde um jornalista da Associated Press apanhou um alvo de setas com a cara do presidente da Rússia. Aqui, até em momentos de lazer se pensa no inimigo.

Só que falando do mesmo helicóptero, a Rússia anunciou que foram mortos 11 dos soldados das forças especiais que desembarcaram no tal descampado. O Kremlin desvalorizou, portanto, aquilo que a Ucrânia apresentou quase como uma arma secreta para proteger Pokrovsk, numa operação lançada pelos serviços secretos e que teve a coordenação direta do espião dos espiões, Kyrylo Budanov.

De acordo com o Instituto para o Estudo da Guerra (ISW), um think tank sediado nos Estados Unidos que faz uma análise diária minuciosa do que se passa no terreno, há quatro coisas factuais: as forças russas estão a intensificar uma ofensiva em e em torno de Pokrovsk para conquistar a cidade; as forças ucranianas conduziram uma operação aérea de assalto no oeste de Pokrovsk a 31 de outubro; o combate próximo, terreno urbano e as condições atmosféricas estão a impactar a guerra de drones de ambos os lados e a ter impacto nas táticas de infiltração da Rússia; as forças russas conseguiram avançar recentemente em quatro direções, incluindo Pokrovsk.

Mapa de Pokrovsk
Dados de 20 de outubro de 2025

Notas: "Avaliado" significa que o Instituto para o Estudo da Guerra recebeu informações fiáveis e verificáveis de forma independente que demonstram o controlo ou os avanços russos nessas áreas.
Fontes: Instituto para o Estudo da Guerra com o Projeto de Ameaças Críticas da AEI; LandScan HD para a Ucrânia, Laboratório Nacional de Oak Ridge
Gráficos: Henrik Pettersson, Renée Rigdon, Lou Robinson e Rachel Wilson, CNN

 

Os ataques russos acontecem, segundo o ISW, em vários locais em torno de Pokrovsk, com batalhões de drones e uma brigada de espingardas a tentarem destruir os veículos militares da Ucrânia.

Certo é que imagens geolocalizadas já confirmaram que a Rússia está no centro de Pokrovsk, estimando o ISW que cerca de 60% da cidade já esteja nas mãos de Moscovo, com as forças ucranianas a manterem a posição em importantes pontos de defesa.

Esta é já uma das batalhas mais importantes da guerra, seguramente a mais relevante do último ano, arriscando-se a ficar na história como ficaram Bakhmut ou Avdiivka, centros de toda a ação durante meses que acabaram por cair para a Rússia. Se acontecer o mesmo em Pokrovsk, todo o Donbass estará em risco.

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