Guerra e crise económica criam mais 4 milhões de crianças pobres

Agência Lusa , AM
17 out 2022, 07:03
Entrega de refeições a alunos carenciados e famílias no concelho de Sintra

Unicef diz que a Federação Russa é responsável por quase três quartos do aumento total do número de crianças a viver na pobreza devido à guerra na Ucrâni

A guerra na Ucrânia e a consequente desaceleração da economia atiraram para a pobreza mais quatro milhões de crianças, só na Europa de leste e Ásia central, anunciou a Unicef num estudo divulgado esta segunda-feira.

O aumento da pobreza infantil na região estudada, que abrangeu 22 países, representa mais 19% de menores a viver abaixo da linha de pobreza depois de quase oito meses de guerra na Ucrânia, adianta o Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a propósito do Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza.

"As crianças são quem suporta o fardo mais pesado da crise económica causada pela guerra na Ucrânia", considera a organização, no estudo hoje publicado.

"Embora as crianças representem 25% da população [dessa região], representam também quase 40% dos 10,4 milhões de pessoas que passaram este ano a viver na pobreza", acrescenta a análise.

Segundo a Unicef, a Federação Russa é responsável por quase três quartos do aumento total do número de crianças a viver na pobreza devido à guerra na Ucrânia e ao crescimento do custo de vida em toda a região.

Nesse país, adianta, vivem atualmente mais 2,8 milhões de crianças em lares com um nível de vida abaixo da linha da pobreza.

A Ucrânia surge a seguir na lista, com mais meio milhão de crianças a viver na pobreza, à frente da Roménia, que tem agora mais 110.000 crianças pobres.

"Além dos horrores óbvios da guerra - as mortes e mutilações de crianças e a necessidade de milhões de pessoas, incluindo menores, fugirem quer de suas casas quer do país -, as consequências económicas da guerra na Ucrânia estão a ter um impacto devastador sobre as crianças de toda a Europa de leste e da Ásia Central", alertou hoje o diretor regional da Unicef para a Europa e Ásia Central, Afshan Khan.

"As crianças de toda a região estão a ser arrastadas pelas terríveis consequências desta guerra. Se não apoiarmos essas crianças e as suas famílias agora, o aumento acentuado da pobreza infantil vai, de certeza, resultar em vidas perdidas, em escolaridade perdida e em futuros perdidos", sublinhou o diretor regional da organização.

A Unicef alertou ainda para a extensão das consequências da pobreza infantil que, referiu, "vão muito além das dificuldades financeiras das famílias".

O aumento da pobreza infantil verificado este ano "pode resultar na morte de mais 4.500 crianças antes do seu primeiro aniversário e num abandono escolar de mais 117.000 crianças somente este ano", conclui o estudo.

Unicef pede que governos não reduzam gastos públicos para enfrentar crise

A Unicef apelou aos governos para que não reduzam os gastos públicos nem adotem medidas de austeridade para impulsionar as suas economias mais rapidamente, alegando que isso diminui os apoios de que muitas famílias dependem para viver.

"Quanto mais pobre é uma família, maior é a proporção do seu rendimento destinada a necessidades como alimentos e combustível. Quando o custo dos bens básicos aumenta, o dinheiro disponível para responder a necessidades como saúde e educação diminui", explica o Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

A crise económica e a subida do custo de vida "significam que as crianças mais pobres têm ainda menos probabilidade de aceder a serviços essenciais e correm mais riscos de violência, de exploração e de abusos", avisa a organização das Nações Unidas.

"Os desafios enfrentados pelas famílias que vivem na pobreza ou à beira da pobreza aprofundam-se quando os governos reduzem o investimento público, aumentam os impostos sobre o consumo ou desenvolvem medidas de austeridade para impulsionar as suas economias mais rapidamente", refere a organização das Nações Unidas.

Esse tipo de medidas "diminui o alcance e a qualidade de serviços de apoio a que as famílias mais carenciadas podem recorrer", acrescenta.

A necessidade de combater o problema deve ter em conta o futuro destas crianças, avisa a Unicef, lembrando que, para muitas pessoas, a pobreza infantil dura a vida inteira.

"Uma em cada três crianças nascidas e criadas na pobreza viverá toda a sua vida adulta na pobreza, levando a um ciclo intergeracional de dificuldades e privações", observa o estudo.

Por isso, a Unicef avança com aquilo que considera serem medidas necessárias para ajudar a reduzir o número de crianças pobres e evitar que mais famílias caiam em dificuldades financeiras.

A agência da ONU propõe "atribuir um subsídio universal às crianças e garantir um rendimento mínimo", assim como "expandir a assistência social a todas as famílias com crianças necessitadas, incluindo refugiados".

Além disso, a Unicef considera também imprescindível "defender o investimento social, especialmente dedicado às crianças e famílias mais vulneráveis", e "apoiar a prestação de serviços de saúde, nutrição e assistência social a mães grávidas, bebés e crianças em idade pré-escolar".

Por fim, a organização defende que sejam adotados "preços regulamentados para alimentos básicos das famílias".

O Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza foi também assinalado pela Unicef Portugal, que avisa que esta é uma realidade que "já está a afetar as crianças e jovens" no país.

"Nunca a urgência de abordar a pobreza infantil foi tão clara" e "a situação pode vir a agravar-se", sublinha a agência em Portugal.

"Com os impactos combinados da crise climática, do aumento dos conflitos, da guerra na Ucrânia e da pandemia da covid-19, assistimos, pela primeira vez em décadas, a aumentos globais da pobreza infantil, incluindo no nosso país, o que torna ainda mais urgente a necessidade dos decisores porem em prática as políticas e programas apropriados para acabar com a pobreza infantil extrema e reduzir para metade a pobreza infantil multidimensional até 2030", conclui a Unicef Portugal.

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