Vitória de Donald Trump nas presidenciais norte-americanas tornou o tema ainda mais urgente, estando em cima da mesa um acordo que prevê concessões territoriais à Rússia em troca de garantias de segurança da Ucrânia
Ao fim de quase três anos da invasão russa da Ucrânia, os aliados europeus preparam-se agora para avançar com negociações que podem incluir concessões terrritoriais à Rússia em troca de garantias de segurança para Kiev.
Segundo o Washington Post, que falou com dez diplomatas europeus e da NATO, a vitória de Donald Trump nas presidenciais dos EUA espoletou conversações que até aqui se resumiam a declarações de apoio à Ucrânia, desconsiderando as negociações com a Rússia. É que o republicano prometeu acabar com a guerra em "24 horas", sem adiantar como, mas dando a entender que poderia apoiar um acordo que mantivesse nas mãos da Rússia alguns dos territórios conquistados, congelando as linhas da frente atuais.
Ora, com as forças russas a controlarem cerca de um quinto do país - incluindo a região oriental do Donbass e a península da Crimeia - essa solução significaria que a Ucrânia teria de ceder uma grande parte do seu território.
Na Europa, embora persistam as declarações de apoio duradouro a Kiev, a verdade é que alguns dos aliados estão a ponderar cada vez mais a hipótese de avançar para as negociações e a hipótese de concessões territoriais já não suscita tantas dúvidas como outrora. Segundo o jornal norte-americano, os diplomatas já não olham para as concessões territoriais a Moscovo como "terra em troca de paz", mas sim como "terra em troca da segurança da Ucrânia".
"Creio que toda a gente já chegou mais ou menos a essa conclusão", indica ao Washington Post Gérard Araud, antigo embaixador francês em Washington, acrescentando que os líderes só não o dizem publicamente "porque seria uma forma de dizer que vamos recompensar a agressão" russa.
Neste contexto, acredita-se que "as negociações poderão ocorrer mais cedo" do que inicialmente se esperava e que o acordo em cima da mesa deverá "implicar algumas concessões de ambos os lados", explica Camille Grand, ex-secretário-geral adjunto da NATO.
De acordo com o Washington Post, as discussões para um acordo têm-se centrado num cessar-fogo ao longo de uma linha de demarcação territorial em troca de garantias de segurança ocidentais. Essa concessão seria temporária e sem reconhecimento formal das linhas territoriais tal como estão no atual cenário na linha da frente.
O comandante João Fonseca Ribeiro alerta que "a Europa tem de acordar" e que não pode continuar a deixar a sua segurança e defesa nas mãos dos EUA. "Temos de perceber de uma vez por todas que, com ou sem Trump, o que está aqui em causa é a ajuda que os EUA estão a dar à Europa para garantir a sua própria segurança. A Europa tem de ter outra postura", defende o especialista, em entrevista à CNN Portugal.
Para o comandante, os líderes europeus têm de parar de "usar o argumento de Trump para justificar que a Ucrânia é mais prejudicada" com o atual contexto internacional. "O principal responsável pela insegurança e pelo fracasso na Ucrânia é a Europa", afirma, criticando o facto de os líderes europeus continuarem com "discursos solenes e de solidariedade" a Kiev ao mesmo tempo que fazem "ações mínimas" para garantir a sua defesa.
João Fonseca Ribeiro defende que "a Europa tem de incorporar a Ucrânia numa unidade europeia" assente num "conjunto de valores e princípios totalmente distintos da Rússia, assumindo que só assim o bloco europeu consegue garantir a sua segurança e defesa, sem precisar do apoio dos EUA.