Trabalhadores estrangeiros de Odemira pagam 18 mil euros por contrato, diz Ordem dos Advogados

Agência Lusa , PF
17 dez 2021, 15:17
Migrantes no Alentejo

Comissão dos Direitos Humanos da entidade denuncia "valores altíssimos" que algumas empresas cobram pela legalização dos imigrantes

A Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados (CDHOA) denunciou, num relatório divulgado esta sexta-feira, que os angariadores ou intermediários prometem aos trabalhadores estrangeiros em Odemira contratos de trabalho mediante o pagamento de 18 mil euros.

“Os angariadores ou intermediários oferecem ao trabalhador estrangeiro uma promessa de contrato de trabalho, junto de uma empresa de trabalho temporário, mediante a solicitação de 18 mil euros, cuja metade do valor é para o próprio angariador e o remanescente para a empresa de trabalho temporário”, descreve a comissão.

O documento, consultado pela agência Lusa, resulta de averiguações realizadas pela CDHOA, cujos vogais se deslocaram a “Odemira e arredores” para verificar a realidade local, após ter tido conhecimento da “eventual situação precária e de exploração laboral” desses trabalhadores.

Dois membros da CDHOA deslocaram-se, no dia 5 de maio deste ano, ao concelho de Odemira para reuniões com as autoridades locais e visitas a espaços referenciados como “problemáticas em termos de direitos humanos”.

No relatório, divulgado esta sexta-feira na sequência da acusação de sete elementos da GNR por um total de 33 crimes, por humilharem e torturarem imigrantes em Odemira, como denunciou uma investigação CNN Portugal/TVI, os comissários apuraram também que “seria exigida a quantia média de seis mil euros a cada migrante” com vista à sua legalização no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF).

"Boa parte dos salários não chega para pagar" as despesas mensais

Segundo os comissários, “as ‘rendas’ exigidas pelos senhorios” em locais que, “na maioria das vezes, se confundem com ‘alojamentos’ das entidades patronais”, oscilam entre os 600 e os 800 euros.

Mediante o pagamento destes montantes, os trabalhadores teriam “direito à cama, mais o uso comunitário do espaço da cozinha e da casa de banho sem quaisquer condições sanitárias e de salubridade, estando a maioria dos migrantes em situação de sobrelotação”, relatam.

“Boa parte dos salários pagos, que em média rondariam dois salários mínimos nacionais, não chegam para pagar a renda e o ‘reembolso’ da viagem” para Portugal, “restando a esses trabalhadores a quantia mensal líquida de 130 a 150 euros”, lê-se no documento.

Devido a esta situação, os trabalhadores são “obrigados a trabalhar em mais de dois locais para sobreviver e sem qualquer direito ao descanso”, acrescentam.

De acordo com os comissários, muitos desses trabalhadores “submetem-se voluntariamente a tais condições, com a expectativa [de] solicitar a naturalização a fim de obter a nacionalidade portuguesa” para se deslocarem, de forma legal, para outros países da União Europeia.

Na deslocação e visita ao Tribunal de Odemira, os comissários confirmaram que estariam a correr termos, junto dos Serviços do Ministério Público, “pelo menos três inquéritos-crime” relacionados com estes ilícitos.

No relatório, alerta-se ainda para existência de várias empresas que “atuam como intermediárias” e “procedem à legalização de migrantes”, cobrando “valores altíssimos” de cerca de oito mil euros por legalização.

Além de praticarem “atos próprios de advogados”, existem “alguns indícios” de “procuradoria ilícita” em algumas situações e de “aproveitamento destes migrantes, que desconhecem o país e a legislação aplicável aos mesmos”.

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